O OITAVO FILHO [MATT ESPECIAL DTRL22]

Para este conto me inspirei no clipe de Thriller do Michael, e em duas músicas de System Of a Down que eu amo e fico em tempo de correr bicho quando ouço, que são Chop Suey e BYOB, espero que gostem!

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O 8º Filho

O hotel à beira da Rodovia São Mateus estava curiosamente silencioso.

Tudo bem, eu sei que poucas pessoas deviam frequentá-lo por ser no meio do nada, numa rodovia remota, mas ainda assim o silêncio não pareceu normal.

Havia algo.

O único barulho vinha da cabine do banheiro, onde Benjamim tomava banho, teríamos uma longa noite pela frente. No pequeno espaço do banheiro estava um balcão mediano com uma pia de granito bem velha, um espelho sujo, mas pelo menos a água que fluía da torneira era cristalina.

— Ben, você ainda vai demorar muito aí? Estou começando a ficar com frio, se eu dormir já era... — Falei ainda com a escova na boca.

— Já estou indo. — Ele disse de forma brusca, não soou natural.

Ben alegou a esposa que precisava fazer uma viagem de negócios, ele estava muito ansioso para nos encontrarmos, não era natural que ele estivesse se comportando de forma tão estranha. Ele nunca me tratou mal, nem na condição de meu chefe e ele já estava trancado ali há algum tempo.

— Ben, estou começando a ficar preocupado com você. Está doente ou começou a festa sem mim? — Pergunto novamente.

Ele parece emitir um breve grunhido.

— Estou. Indo. Patrick. — Fala com dificuldade.

Devia estar se masturbando. Relaxei, se ele queria um momento sozinho, eu não podia fazer nada. Me abaixei para lavar o rosto com calma, mas paralisei quando ele gritou de forma gutural, fazendo um grande estrondo como se tivesse quebrando algo.

Todos os meus pelos se arrepiaram, comecei a me erguer lentamente e quando finalmente pude olhar meu reflexo no espelho, atrás de mim a pequena cabine de vidro do banheiro estava quebrada em uma determinada parte, um buraco estilhaçado e lá estavam olhos amarelos com as pupilas contraídas, sua pele não era mais a mesma, estava enegrecida e coberta por tufos de pelos negros, sua boca cheia de presas, ele rosnou quando percebeu que eu continuava ali a encarar.

Rosnou mais alto, como uma besta.

Aquilo se jogou contra a cabine e eu observei por um instante o vidro começando a rachar, meu coração descompassado, meus nervos me pararam, mas o cérebro gritou mais alto que o rosnado me mandando correr dali e ir o mais longe que pudesse.

Quando os estilhaços cantaram ao cair no chão e a besta rugiu, corri desesperado e tranquei a porta ao sair do pequeno cômodo, me dei um momento de alívio, mas antes que eu pudesse soltar um longo suspiro, garras perfuraram a porta na qual eu me encostei e se fincaram meus braços, me arranhando com força quando me desvencilhei.

Corri para fora do quarto, pelo corredor gritei por ajuda, mas o único som que ouvi foi o da porta se quebrando atrás de mim.

Parecia não haver ninguém no hotel, nem mesmo os donos, ninguém na recepção ou em qualquer lugar que seja, não me dei o luxo de ir verificar, suando frio e com braços sangrando corri para a rodovia. Já passava das três horas da manhã e um nevoeiro me impossibilitava de ver mais de um metro à frente, a luz fraca de um poste era a única coisa a me guiar quando corri descalço pelo asfalto gélido e crespo, tropecei e cai de joelhos, os rosnados estavam cada vez mais próximos, olhei para trás, mas não podia ver nada.

Levantei e corri, os passos bestiais estavam cada vez mais próximos, corri o mais depressa que pude, com dor em cada parte do corpo, no frio da madrugada, os joelhos queimando e os pés protestando, um desejo instintivo de não querer morrer.

Um foco de luz chamou minha atenção, ao longe estava uma casa simples, mas uma luz irradiava dela, devia ter alguém que pudesse me ajudar ou ao menos me proteger.

Não enxerguei nenhum caminho aparente, então me lancei mata a dentro, desviando de galhos, espinhos, seguindo a luz, mas ele estava perto, muito perto. Devia ter meu cheiro gravado em sua mente, se é que ele tinha alguma mente.

— Vá embora! — Gritei como uma vítima burra de algum filme idiota.

Um uivo ecoou na noite escura iluminada pela lua cheia, tão alto que causou uma onda de choque, meus nervos à flor da pele, suando muito, olhei para trás em um instante e vi aqueles olhos reluzindo entre árvores, ele estava próximo demais e eu muito fraco, debilitado, mas não desistiria tão facilmente.

Ele rosnou baixo, como se preparasse para dar o bote, mas eu entrei à esquerda e à direita duas vezes para ter alguma chance, tropecei numa raiz e ouvi os passos rápidos se aproximando outra vez, mas me levantei e corri.

A luz estava mais próxima quando ele se lançou sobre mim, mas antes um disparo o acertou no ar, derrubando-o, a criatura ferida sumiu na escuridão. Olhei na direção de onde tiro tinha surgido.

— Você teve sorte. — Uma voz cálida disse, era um rapaz moreno, mas ele não segurava arma nenhuma.

A espingarda velha estava na mão do outro.

— Drew, leve-o para dentro, eu vou caçar! — O homem disse decidido.

O moreno pareceu inseguro.

— Matt, não acho que você devia sair sozinho à procura daquilo, é perigoso nessa escuridão, ele pode te pegar...

— Não Drew, eu não sou tão burro. Eu vou encontrá-lo, apenas leve o garoto para a casa, vão para o porão e não saiam de lá até eu voltar com a pele daquele animal. — Ordenou o tal Matt.

Me desesperei, por mais que fosse um monstro... dentro dele estava Ben, não podia permitir que o matassem.

— Não, por favor! É o meu parceiro...

— Desculpe Patrick, não é mais ele. É uma fera. — O moreno disse, me assustando.

— Como sabe meu nome? — Pergunto tremendo.

— Ele sabe de tudo, acredite nele. Agora entrem, eu tenho um predador para caçar e eles não perdem tempo. — Matt disse.

Ele correu para as árvores e o moreno Drew, que parecia ser assistente dele me guiou até o casebre iluminado. Trancou a porta, ironicamente, pois duvido que a porta fosse um empecilho para o monstro, e me levou para o alçapão. O porão era escuro, mas parecia seguro, ele fechou o alçapão por dentro e acendeu uma vela que iluminou nossos rostos. Parecia tão assustado quanto eu.

— Lamento não lhe passar segurança, mas é que não tem como saber se ele voltará...

— Como você sabe o que estou pensando?

— Eu apenas sei.

O barulho de novos disparos ecoou em algum lugar ao longe, era difícil de saber com exatidão de que direção tinha vindo quando se estava debaixo de um porão, mas logo um barulho maior nos assustou.

— Ele está aqui. — Drew falou.

— Fique quieto! — Pedi.

— Não adianta, ele também sabe que estamos aqui. Seu cheiro de não-batizado pode ser sentido a quilômetros de distância. — Drew explicou, me deixando ainda mais assustado.

O rosnado baixo e contínuo se seguiu por minutos que pareceram eternos, nos afastamos o máximo que podemos do alçapão e apagamos a vela, mas sabíamos que não adiantaria nada. Assim que ele percebe nossa localização, estaríamos ferrados.

De baixo para cima, podíamos ver seus passos entre as frestas do antigo piso de madeira que rangia a cada pisada. O medo escorria pelos meus dedos, não conseguia segurá-lo.

Ouvimos um grunhido baixo, seguido por um rugido estridente, ele começou a se lançar contra o alçapão, arranhando-o com suas garras, dando vários golpes, até que um pedaço da madeira antiga cedeu e pudemos vê-lo. Ele nos olhou pelo pequeno espaço, aqueles grandes olhos amarelos que evidenciavam seu desespero por nossa carne, então recomeçou seu ato de se livrar dos pedaços de madeira que ainda restavam.

— Essa é a parte em que você fala que vai ficar tudo bem? — Pergunto me sentindo ainda mais idiota.

— Adoraria dizer isso, mas parece que Matt está muito longe para nos ajudar...

Mais madeiras se quebrando.

— Estamos ferrados. — Concluí com a voz trêmula.

Drew me puxou para o canto do porão, o mais longe que podíamos ficar da fera. Infelizmente, faltavam apenas alguns pedaços, até que ele se livrasse completamente e avançasse em nós.

— Que droga! Não tem nada aqui que possamos usar como armas. — Ele diz, vasculhando o chão gelado e as paredes.

— Talvez se a gente se fingir de morto, ele vá embora... — Digo, mas sinto o olhar repreensivo de Drew em mim.

Tento me levantar, para ficar preparado para a morte, mas bato a cabeça em algo duro, que cai no chão fazendo barulho.

— Isso! É um castiçal de prata, pode nos ajudar se acertarmos com força nos olhos dele...

Num momento de desespero, pego o castiçal e corro na direção do alçapão, ou o que resta dele, a fera já está com metade do corpo dentro, ainda tentando se livrar da madeira, ele rosna com tanta ferocidade que largo o castiçal no chão e volto para me recostar à parede.

— Você é um grandíssimo idiota. — Drew diz.

Ouvimos um som de “crack” e a fera caiu com pedaços de madeira no chão, trazendo um pouco de luz, ele se ergueu de forma teatral, rugindo, rosnando, com as presas à mostra, senti a morte de perto, mas um tiro veio de algum lugar lá em cima e ele se curvou e se contorceu até cair no chão.

Matt pulou do buraco onde havia o alçapão e caiu de pé no porão, fumaça saindo do cano de sua arma, ele o assoprou e sorriu ironicamente.

— Quando estou numa caça, eu nunca perco. — Ele diz e pisca para nós.

A fera regrediu, pelos sumindo, unhas retornando ao tamanho normal, presas caindo, era o meu Ben novamente, só um pouco mais frágil.

— Eu era o oitavo filho, tenho irmãs... — Murmurou.

Seus olhos não eram mais amarelos, voltaram ao azul turquesa de sempre, ele sorriu para mim com lágrimas nos olhos e encarou o nada, levando consigo um pedaço de mim, mas deixando sua marca em meu corpo.

Fim.

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Como você pôde perceber, o tema escolhido foi "Criaturas Fantásticas do Nosso Folclore", embora Lobisomem seja um personagem da cultura mundial, temos a nossa versão.

(Esse conta como um episódio especial da sexta temporada da série MATT: O CAÇADOR DE LENDAS, obrigado a todos!)

E N Andrade
Enviado por E N Andrade em 23/05/2015
Reeditado em 22/06/2015
Código do texto: T5251919
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