A MÃO QUE SEGURA O MUNDO

*****************************************************

APRESENTAÇÃO

Uma catástrofe mundial é o pano de fundo do enredo de “A MÃO DE DEUS”. Um meteoro gigante e de proporções desconhecidas para o planeta está seguindo na direção da Terra. E é na pacata e fictícia cidade de Miracle, nos arredores de Houston, que a trama se desenrola. Na história, um cientista e sua família, assim como outros moradores do lugar são alvos da perseguição de uma fanática religiosa e seus asseclas. Depois de alguns acontecimentos anormais, mas que para a religiosa são um sinal de que enfim o apocalipse chegou e que Deus a designou como a única capaz de salvar os infiéis, nem que tenha que sacrificar os que não acreditam em suas profecias.

*****************************************************

O destino não é nada além dos atos que realizamos em estado prévio da existência.

RALPH WALDO EMERSON

E se o mundo acabasse hoje?

E se todos tivéssemos condenados?

E se tivesse uma chance de sobrevivência?

E se pra sobreviver você tivesse que matar alguém?

E se esse alguém fosse um parente ou um amigo?

E se...

*****************************************************

A mão que segura o mundo

(A sala desarrumada, o meteoro o e o 38.)

Ele retira a cadeira que bloqueia a entrada e gira a maçaneta da porta, e à abre...

ALGUNS MINUTOS ATRÁS...

- Vamos senhor Shear, você consegue - Instrui a senhora Nelman ao pé do ouvido do rapaz, quase como que um sussurro - Puxe o gatilho e está tudo feito.

- Eu não consigo senhora Nelman - Fala Harry, com a arma 38 na mão direita que treme freneticamente.

A sala mais se assemelha com uma panela de pressão prestes à explodir. O clima entre os presentes está cada vez mais acirrado, beirando o desespero e a paranoia. Na realidade, ele sempre esteve assim. O cano da arma está encostado na fronte de Herald Black, que se encontra suando mais do que uma chaleira em ponto de abolição. A voz da senhora Nelman continua a penetrar a mente de Harry como um pensamento caótico e sombrio.

- Apenas puxe o gatilho - A voz que emana da boca dela é quase um sussurro, que é repetido varias vezes na cabeça do jovem, o deixando em um estado quase que de loucura.

A mão de Harry treme cada vez que ele ouve aquela voz mandando-o puxar logo o gatilho daquela arma e acabar logo com tudo. De repente, o som de um tiro.

Houston

DOIS DIAS ATRÁS...

- Droga! Estamos fodidos Harry - fala o cientista Herald Black em um tom de voz grave e urgente, como se estivesse prestes à anunciar o fim do mundo. De certo modo é o que parece - Eu achei que era apenas o grandão, mas aquele filho da puta tem vários filhotinhos vindo com ele. Estamos todos fodidos.

- Me deixe dá uma olhada nisso Herald, às vezes você parece a Lucy - Fala Harry Shear, tirando das mãos do colega o notebook que está transmitindo uma imagem do espaço através de um satélite e focando seus grandes olhos verdes para ver o que tanto deixou o amigo apreensivo. - Puta que pariu Herald, que merda é essa?

- É o apocalipse de Deus meu amigo - Fala Herald meio em tom de piada - Relaxa parceiro, nós trabalhamos para os Estados Unidos. Os "homens" vão já resolver isso.

- Às vezes você é um idiota, sabia? - Diz Harry com voz grave e séria

Um risco de fogo corta o céu de uma extremidade a outra. É a calda de um grande meteoro que está se dirigindo na direção da Terra. Os dois cientistas que trabalham na Nasa, observam a

trajetória da grande bola de fogo e um olha para o outro com um pessimismo latente.

- Quanto tempo? - Pergunta Harry, ríspido e seco.

- Não sei, dias, horas - Fala Herald meio desanimado.

- Dê o alerta Herald, eu estou indo pra casa-

- Você vai me deixar aqui sozinho com esse abacaxi cara?

- Sem drama Herald, já temos coisa mais importante pra nos preocuparmos agora no que com os seus chiliques de menina assustada.

- Chiliques de menina assustada? Volte aqui agora mesmo Harry Shear. Você não vai me deixar aqui falando sozinho.

Harry retira o seu jaleco e o joga sobre uma cadeira e dá às costas para o amigo, sumindo mais rápido do que um foguete; deixando Herald Black falando sozinho.

- É não é que o cara me deixou falando sozinho mesmo.

Através de uma transferência de vídeo,Herald comunica ao primeiro escalão do governo às más notícias.

- Em poucas horas aquele meteoro gigante vai se chocar contra nosso planeta e às consequências ainda são desconhecidas. Pode ir de uma simples mudança no clima do planta até mesmo a extinção total. - O auto escalão ouve à tudo em um silêncio assustador.

Não demora muito para que a notícia se espalhe como pólvora, e leve pânico e desespero ao mundo todo. Harry Shear está dentro de seu carro. Ele está seguindo para casa, ouvindo às últimas notícias pelo rádio e furioso com o filho da puta que espalhou a história. Certo que uma hora ou outra todos ficariam sabendo mesmo, mas não precisava ser dessa forma, pela imprensa sensacionalista. O cientista vai dirigindo sempre olhando para o céu, atento aos sinais do meteoro. Já é fim de tarde, o sol está quase se pondo. Mesmo a olhos nus é possível vê o rastro da grande bola de fogo no céu. Algo estranho está acontecendo e Harry só se dá conta depois que se atenta aos fatos: vários carros estão passando por ele na estrada no sentido contrário. Parecem em fuga - e o mais estranho ou natural , é que todos olham também para o céu; como quem espera o momento certo de algo acontecer. Harry está entrando em sua cidade natal, Miracle, que fica cerca de duas horas de Houston. A cidade é pacata e seus cidadãos levam uma vida simples e sossegada como qualquer pessoa do interior. Mas algo diz que as coisas mudaram drasticamente na calma cidadezinha. Harry lembra que a esposa não gosta muito do lugar, ou nada. Quando casaram há quase 10 anos, Lucy Shear morava em São Francisco, Califórnia, e era a líder de torcida do colégio. Popular entre os amigos, a jovem era muito mimada e nunca se imaginou morando numa cidadezinha embrenhada no meio do mato e cheia de caipiras; mas o amor por Harry Shear a fez repensar suas prioridades. Na verdade foi a gravides acidental de Billy Shear que a levou para Miracle, e por esse e outros motivos ela não consegue sentir um verdadeiro amor de mãe pelo garoto. Mas com o passar do tempo ela acabou se acostumando com a sua nova realidade. Ou pelo menos finge. Harry está passando pela praça da cidade e uma movimentação do outro lado da rua lhe chama à atenção. Muitas pessoas se encontram amontoadas umas sobre às outras atentas às palavras de alguém em cima de um pequeno caixote. Harry se esforça para ver quem discursa para aquela multidão, mas é impossível furar o bloqueio feito por aquele povo que se mostra atento a algo muito importante que está sendo dito ali. Ele dá a volta na praça e finalmente se depara o misterioso palestrante, ou melhor, a misteriosa palestrante: Senhora Abigail Nelman, a cidadã mais religiosa de Miracle. Ele para seu veículo no meio da rua. A senhora Nelman prega aos seu fiéis que o apocalipse de Deus finalmente chegou.

- Irmãos, a palavra do senhor diz assim: E caiu do céu uma grande estrela, ardendo como uma tocha, e caiu na terceira parte dos rios, e nas fontes das águas. Apocalipse 8.10, meus queridos. E diz a profecia do Senhor, que as águas ficarão amargas e muitos morrerão. Os sinais estão ai para quem quiser ver meus irmãos. Se arrependam dos seus pecados antes que a bola de fogo que o Senhor está mandando dos céus os engula e os trague para o inferno - Um momento de silêncio que logo é quebrado com um aceno de dedo e uma afirmação - Ali está um dos responsáveis pela ira do Todo-poderoso sobre nós - A senhora Nelman aponta na direção de Harry Shear parado no meio da rua.

Todos se viram na direção do cientista. Esse fica corado e tenta dá partida no seu carro, que acaba travando.

- Merda, isso tinha que acontecer justo agora - resmunga Harry para si mesmo.

- Porque tenta fugir da verdade senhor Shear? - Fala a senhora Nelman, descendo do seu palanque improvisado e indo na direção do cientista. - Acaso a sua maldita ciência não é a grande responsável pelo o que vai acontecer?

- Agora não senhora Nelman, eu só quero ir pra casa - Retruca Harry meio timidamente. Ele evitar encarar a religiosa e seus fieis, que nesse momento já a seguiram como cães de guarda.

- Vejam irmãos, eles criam armas e bombas para matarem uns aos outros, será que agora eles podem criar algo para escaparem do castigo do Pai?

Um silêncio paira no ar e todos se olham sem respostas para a indagação da religiosa. Finalmente o carro de Harry dá partida e um alivio toma conta do cientista. Vai se ver livre da senhora Nelman e seus fanáticos religiosos e isso é o que importa naquele exato momento.

- Eu adoraria ficar aqui e discutir religião e ciência senhora Nelman, mas minha esposa e meu filho estão me esperando para o jantar - Fala Harry num tom de humor e sarcasmo, antes de sair em disparada com seu carro.

- Vá, filho de Satanás. O Senhor vai dá de beber do cálice da justiça a você e todos que tem participação no mesmo pecado. O Todo-poderoso está enviando fogo do céu para destruir essa cidade, assim como destruiu Sodoma e Gomorra no passado. Porque o Deus que eu sirvo é justo naquilo que faz.

Harry chega ao portão de casa. Já é noite, ele nem se deu conta do tempo que perdeu discutindo com a senhora Nelman na praça. Billy Shear abre a porta e corre na direção do pai eufórico, nem mesmo deixando esse descer do veículo direito. O garoto salta sobre o pai e o abraça.

- Papai - O garoto abraça o pai e lhe dá um carinhoso beijo no rosto - O senhor trouxe algum presente pra mim?

- Trouxe, mas você vai ter que adivinhar garotão.

- Ah, deixa eu vê então... Um jogo novo de batalha medieval?

- Passou longe garoto. Oi amor - Harry dá um selinho na esposa, que está preparando o jantar. Essa talvez seja a coisa que Lucy Shear odeie mais do que morar em Miracle. - Na verdade eu trouxe um jogo de corrida no deserto.

O garoto desce do colo do pai e corre na direção do computador estrear seu novo presente. Harry puxa uma cadeira e se senta com um copo e um litro de água ao lado, e fica observando a mulher cozinhando. Ele adora ficar olhando a esposa preparando a comida da família, mesmo sabendo que ela faz aquilo por obrigação e não por vontade. Um momento de silêncio e finalmente Lucy fala:

- É verdade aquele negócio do tal meteoro que tanto falam na tevê?

- É sim, amor. E por conta disso eu quase fui linchado pela doida da senhora Nelman e seus cães de guarda. Alguém precisa dá um jeito naquela mulher.

- O único que poderia era o marido dela, mas ele mais parece um cachorrinho na coleira, pobre senhor Nelman.

Logo o casal está no quarto. A Noite está fria e uma brisa gelada paira pela cidade. O céu está envolvido por nuvens negras e às estrelas se esconderam hoje. Mas é possível ver um vermelho por entre às nuvens. Os olhos dos cidadãos de Miracle estão voltados para o alto, eles olham fascinados o grande meteoro passeando pelo céu, indo na direção deles.

Harry Shear está na janela do quarto, ele também contempla as nuvens e aquele que se esconde por entre elas.

- O que você tanto olha nessa janela Harry? - Pergunta Lucy, deitada na cama folheando uma revista - Harry, eu estou falando com você. Você está me ouvindo amor? Terra chamando Harry Shear de algum lugar do espaço.

- Ah, desculpe querida. É que eu estava envol - Harry não completa a frase, a esposa o interrompe pela, metade.

- Envolvido pelo clima de “fim do mundo”?

- Não. Na verdade... Por quê você acha que é o fim do mundo, Lucy - O cientista muda de assunto como quem muda de roupa rapidamente.

- Eu não sei, deve ser porque todos estão falando. Deve ser por isso, querido.

- Lucy, é apenas um meteoro, não tem nada de fim do mundo ou essas outras baboseiras que a senhora Nelman anda falando por ai... Oi, querido, aconteceu alguma coisa?

Billy Shear está parado na porta do quarto dos pais. Ele está com seu pijama e segura um boneco do “Superman”em uma das mãos.

- Eu estou com medo de dormir sozinho pai. - Diz Billy, com voz calma e falha.

- Volte para seu quarto Billy - Fala Lucy, ríspida e seria , não fazendo questão de esconder sua antipatia pelo filho.

- Lucy, por favor - A repreende o marido, sabendo que a esposa não morre de amores pelo próprio filho - Venha querido, deite aqui com o papai e a mamãe.

Billy corre para junto os pais e se joga no meio de ambos. Lucy dá as costas para os dois chateada com a situação. Harry apenas abraça o filho

Quando a mão pesa

(O banho de sangue)

O alarme soa insistentemente. Harry abre os olhos e fecha-os novamente. Outra vez o som chato e incomodo. O cientista abre os olhos outra vez e se põe de pé. Ainda meio sonolento, o desejo do mesmo é de voltar para sua cama quente ao lado da família. Harry ouve um muitas vozes ao mesmo tempo, como se o som de muitas águas. Ele se encaminha até a janela do quarto, de onde olha para o meio da rua. Lá fora, uma multidão reunida sob o comando da fanática Abigail Nelman olham para o céu tomados de terror. Harry olha rapidamente para o despertador que soa novamente o alarme. É 7:30 da manhã. Mas cadê o sol? Cadê o dia? Tudo é trevas. Na rua, Abigail Nelaman trata logo se encenar seu papel de “mensageira de Deus” muito bem, envolvendo à todos num clima de mistério e medo.

- Estão vendo irmãos? Ainda resta duvidas em seus corações de que o Pai está vindo punir os pecadores desse mundo sujo e perdido? - A pergunta ficou sem resposta. A senhora Nelman desempenhou muito bem o seu número de pregadora do apocalipse. Todos os ali presentes agora estavam envolvidos pelo pavor e o medo do desconhecido. - O Senhor diz: E o quarto anjo tocou a sua trombeta, e foi ferida a terceira parte do sol, e a terceira parte da lua, e a terceira parte das estrelas; para que a terceira parte deles se escurecesse. Apocalipse 8.12.

- Pare com isso senhora Nelman. Está deixando essa gente assustada - A voz vem Harry Shear, que pega no braço da religiosa e a puxa do meio da multidão assombrada, em um tom de voz grave e serio.

- Me solte filho de Belzebu - Brada a fanática, dando solavancos e se soltando das mãos do cientista - É para eles temerem mesmo a ira do Senhor. Acaso perdeu o temor por Deus homenzinho?

- Pare com isso, Abigail, vamos pra casa, por favor - A voz de Charles Nelman atrás da esposa mas se assemelha com o gemido de um menino amedrontado.

- Não fale comigo adultero. Ou pensa que não sei do seu caso com aquela vagabunda da lanchonete? - A voz de Abigail se torna mais alta e descontrolada - O Senhor vai mim dá a vingança em minhas mãos, Charles. E eu punirei com fúria todos os pecadores dessa cidade, começando por você e aquela prostituta.

De repente, pingos de água começam a cair do céu.

- Olha ai o seu “sinal do apocalipse”, senhora Nelman, nuvens de chuva - Fala Harry, em um tom de piada e sarcasmo - É apenas chuva pessoal, voltem todos para suas casas. Não é o fim do mundo. Não hoje.

E todos se dispersam tão rapidamente como formiguinhas de açúcar, fugindo da tempestade. Abigail Nelman fica parada no mesmo lugar, imóvel, envolvida por uma raiva interior por ter sido desmoralizada diante de seus fieis por “um filho de Satanás”, como elas mesma gosta de se referir a Harry Shear.

- Filha, vá para casa com seu marido - Agora a voz vem de Neston Rillys, o pastor da congregação onde Abigail Nelman congrega.

- Faça o que o pastor Rillys está mandando Abi...

- Não me chame de Abi, "serpente do paraíso". E você, seu velho... - A religiosa agora se volta na direção do velho pastor Rillys, com seu olhar chamuscando de ódio - Pensa que eu não sei que você é um deles? Um "filho das trevas" disfarçado de "piedoso"?

- Abigail... - O pobre pastor Rilly não tem tempo de falar mais nada , nesse momento a senhora Nelman dá às costas para ele e o marido; e se vai, sozinha pela chuva, só Deus sabe para onde.

- Desculpe pastor Rillys, a Abi não está muito bem esses dias...

- Sabe qual é o seu problema Charles? Abigail Nelman, esse é o seu problema.

O pastor Neston Rillys se vai também, e Charles Nelman fica parado no meio da rua sozinho com a chuva.

A noite chega logo a Miracle, mas não se nota a diferença. Afinal de contas, o dia foi tão negra quanto à própria noite está sendo. Harry liga o chuveiro e se lança em baixo da água morna. O cientista está de olhos fechados e não percebe a mudança no tom de cor da água. De repente, um grito desesperado, e Harry se desperta. Seu corpo está todo salpicado de vermelho e o mesmo se lança para trás, assustado com a visão. Lucy adentra o quarto histérica, e seus olhos estão arregalados de horror. A sua voz é tremula e ela quase não consegue completar a frase.

- A águ... água... a água virou... virou sangue... Sangue Harry.

Quase não tem tempo de Harry se aproximar da esposa para ajuda-la, quando é surpreendido pela histeria nas ruas da cidade. Gritos de fanatismo misturado com gritos de desespero, se faz ouvir como uma melodia das portas do inferno se abrindo. É impossível distinguir os gritos. Harry e a mulher correm até a janela do quarto e o que eles veem é Miracle regredindo ao tempo da barbárie. Abigail Nelman e seus fanáticos religiosos com todo tipo de armas em punho, tentando levar a “salvação” que tanto pregam à força aqueles que não a querem.

- E Deus disse que iria transformar às águas em sangue, mas ninguém acreditou - A voz de Abigail Nelman é estridente e altiva, como a voz de um comandante no fronte.

- Meu Deus! - A voz de Harry é um misto de perplexidade e medo. Essa gente enlouqueceu.

Abigail Nelman vem à frente, liderando seus asseclas como um general em uma batalha. Ela se julga “a mão de Deus”na Terra, e seus seguidores” os cavaleiros do apocalipse”. A mulher lança sorte sobre a vida de todos, e vai escolhendo aqueles que vivem ou morrem, como se ela fosse o próprio Deus. Seus olhos logo se voltam para a residência de Harry e Lucy Shear, e com um simples aceno de dedo, ela sela o destino de mais dois.

- É lá irmãos, que o verdadeiro mal se esconde - Sua voz é ríspida e fria.

- Eles estão vindo pra cá, Lucy - Fala Harry, puxando da frente da janela - Cadê o Billy? Nós temos que sair daqui, Lucy. Antes que... - A frase é cortada brutalmente pela metade. Os gritos de Billy Shear se misturam com às batidas violentas na porta de baixo, deixando o coração de Harry espremido de pavor.

Não demora muito para que a senhora Nelman e seus cães de guarda avancem pelo primeiro obstáculo.

- Ande Billy, corra - Grita Harry, arrastando a mulher e o filho pelos braços - Rápido, temos que dá o fora daqui agora.

Harry e a família descem um lance de escadas aos trampos e barrancos. Na frente deles um homem de meia idade, alto e forte com uma faca nas mãos os aguarda. Rápido e preciso, o cientista acerta um jarro de flores que servia de decoração, mas que ele achava cafona, na cabeça do intruso, o deixando caído desacordado no chão. Os três correm na direção da cozinha ,mas param e recuam. A mesma já tem donos. Harry bloqueia a porta da cozinha que leva até a sala. Eles voltam para trás. A porta da frente está quase sendo tomada de assalto. Harry para com a família próximo da escada que leva ao segundo andar. O cientista pega a faca do homem caído ao chão e dá a mesma ao filho.

- Billy, me ouça com atenção, eu vou ser rápido meu filho. Harry vai soltando às palavras quase que instantaneamente - Entre no armário e fique lá dentro quietinho. Não abra a porta, e se alguém tentar entrar, use isso - Apontando para a faca nas mãos do garoto - Eu te amo Billy.

- Mamãe também te ama, Billy - Diz Lucy Shear, dando um beijo no filho, quase como se estive-se se despedido dele. Essa teria sido a única vez que a mãe teve um gesto de carinho verdadeiro com o filho. Mesmo que o medo e o desespero tenham contribuído para isso.

Billy entra no armário. Em seguida, Harry bloqueia a entrada com uma cadeira. A porta que dá acesso a cozinha é tomada de assalto, assim, como a porta da rua. O casal é cercado.

- Deus me enviou para puni-los senhor Shear - A voz de Abigail Nelman não expressa emoção. É assustadoramente fria. É gelada.

... E tudo acaba hoje

Miracle se encontra tomada pelo silêncio da morte. Às ruas estão mortas. O sangue banha às estradas. Corpos de todas às formas e tamanhos, com ferimentos de todo tipo enfeitam o lugar; como se fizessem parte da decoração da cidade. O céu é um imenso lençol negro, frio e mortal. Uma neblina angustiante paira no ar, dando a impressão de que a cidade foi mergulhada num inferno de esquecimento e desolação. Às casas estão desertas, saqueadas, abandonadas para sempre. Miracle exibe agora o ar da morte.

Um veículo solitário vem seguindo pela estrada, quebrando o frio de uma extremidade a outra da pista, indo em direção à Miracle. O mesmo tem que parar na entrada da cidade. Herald Black bate no volante do carro e solta um palavrão. Ele desce do veículo.

- Que merda é essa? - Pergunta o cientista para si mesmo, olhando para uma barricada feita na estrada com latas de lixo e restos de matérias de construção - Harry, meu amigo, o que é que tá acontecendo nessa droga de cidade?

O cientista tranca seu carro e com certa dificuldade, ele consegue saltar o bloqueio improvisado. Harry e a esposa estão no sofá da sala amarrados. Abigail Nelman aponta uma arma na direção do casal.

- Paradinha ai sua” vadia religiosa maluca”- A voz forte e com tom de autoridade é do xerife da cidade, Tony Eggans - Se afaste dos dois agora mesmo, senhora Nelman. Abaixe a arma e ponha às mãos na cabeça. Isso vale para todos os cretinos que andam com essa “vaca”.

Tony Eggans está acompanhado de dois policiais, e se comparado ao pessoal de Abigail, eles estão em desvantagem. Mas em compensação, possuem melhor poderio de fogo.

- Graças a Deus que o senhor apareceu, xerife - A voz de Harry é de alivio e felicidade.

- A senhora está presa, senhora Nelman, e o seu bando também - A frase é interrompida.

- Qual é o crime? Fazer a vontade de Deus? - O tom é de desafio. Mesmo a um passo de ir parar na prisão, a mulher ainda não se deu por vencida.

- Não coloque Deus no meio disso, Abigail. A senhora e seus seguidores estão presos por assassinato, e eu acho que não vou precisar fazer muito esforço para acusa-los, afinal de contas, vocês exterminaram metade da cidade.

- Deus, xerife, foi Deus quem os matou com o cálice da sua irá.

- Não foi Deus, foi a senhora e seus” cachorrinhos fanáticos” que mataram aquela gente lá fora. Assim como você matou seu marido, a garota da lanchonete e pastor Rillys.

- Juntou todas as peças do "quebra-cabeça", xerife. Parabéns...

- Obrigado, senhora Nelman. E não vamos esquecer também da parte em que a senhora e seu bando mutilaram os corpos dos três e os jogaram dentro do reservatório de água da cidade. O sangue dos três se misturou a água; a água de Miracle virou sangue e ai você tinha cumprida a sua” profecia do apocalipse”, sua maluca. Dai não foi difícil envolver o resto da cidade da histeria coletiva de que o mundo ia acabar. Fim do mistério, senhora Nelman.

Abigail Nelman não fala nada. Ela é obrigada a reconhecer sua derrota e de que Deus não operou profecia alguma na cidade.

- Eu só não entendi uma coisa Abigail. Fala o xerife - Por quê?

- Eu apenas queria levar a salvação à eles... Eles não puderam compreender que eu só busquei o bem deles.

- Não se pode obrigar ninguém a querer a salvação, senhora Nelman. E era isso o que você estava fazendo. E francamente, a senhora querer o bem de alguém?

- Eu tenho sentimentos xerife Eggans. Eu só... eu... eu "sou a mão de Deus"- Um brado estridente e um tiro penetra o peito do xerife, o jogando no chão; antes mesmo que ele tivesse a chance de perceber o que o tinha atingido.

Abigail Nelman já não era mais aquela alma doce e caridosa que tentou parecer quando se mostrou rendida. Seu olhar agora era de total frieza revelada. Já não precisava mais esconder de ninguém quem era de verdade, e desempenhar o papel de uma religiosa contida era algo que não estava nos seus planos.

Os dois ajudantes de Tony Eggans não tem tempo de reagirem ao que vem sobre eles, mesmo antes do tiro fatal que matou o xerife; eles já estavam praticamente subjugados aos asseclas daquela mulher insana, que se julgava "Deus" sobre a Terra.

- Vocês podem compreenderem agora, senhor e senhora Shear? Essa é a vontade de Deus - Com essa frase, a mulher que se intitulou "justiceira divina" dá um último tiro na cabeça de Tony Eggans, espalhando massa encefálica por todos os lados.

Harry e a esposa estão em choque. Seus olhos estão fixos no corpo do xerife desfalecido no chão. Suas bocas estão coladas de tanto terror e perplexidade, e eles não conseguem expressarem reação alguma à tudo o que acontece a sua volta. A última esperança de suas vidas se desfez diante de seus olhos como fumaça.

- Não esperem clemência do Pai hoje.

Um peso e duas medidas

(Decisões e surpresas)

- Eu vou subir, preciso orar para que o Senhor me fortaleça em sua graça, e que ele venha ter misericórdia de suas almas pecadoras. Por que eu não terei - O tom na voz de Abigail Nelman agora é de deboche - Eu vou usar o quarto do casal, acho que não vão se incomodar, não é mesmo? - De repente, ela para na metade do trajeto, como se tivesse lembrado subitamente de algo muito importante - O garoto. Onde está o seu filho, senhor Shear?

- Não toque no meu filho sua desgraçada, ou eu juro que me solto daqui; e nem que seja a última coisa que eu faça na minha vida, eu pulo no seu pescoço e troço ele, e nem Deus vai poder salva-la sua maldita.

- Não me ameace. Encontrem o garoto, e o coloquem junto dos pais. Afinal de contas, a família tem que ficar unida, não é mesmo?

Logo, cada canto da casa começa a ser revistado a procura de Billy Shear. Harry e Lucy estão aflitos, eles temem pela segurança do filho tanto quanto pelas suas próprias. Billy consegue ouvir os passos daqueles que o procuram através da escuridão do seu esconderijo secreto. De repente, uma sombra passa por baixo da porta do armário, onde o garoto está escondido. Ela para na entrada. O coração do pequeno Billy dispara violentamente. Sua respiração se agita loucamente, e ele se encolhe em um canto escuro.

Um homem jovem e magro está do lado de fora. Ele retira a cadeira que bloqueia a porta e se prepara para abri-la. De repente, um barulho e ele para bruscamente. Harry deixou cair um jarro de propósito. O casal assiste à tudo com o coração tão apertado quando o do próprio Billy escondido na escuridão bolorenta do seu esconderijo secreto, que agora já não parece mais tão secreto assim. Harry Shear começa a gritar histericamente, chamando à atenção do homem parado de pé a porta do armário. Esse olha para o cientista, e os manda ficar quieto. Num lance rápido e preciso, ele abre a porta e o sangue que corre pelos corpos de Harry e Lucy congela em suas veias.

Mas para a espanto e surpresa dos pais de Billy, o garoto não está dentro do esconderijo. Os dois não entendem o que aconteceu, e nem onde o filho está. Mas ficam uma sensação de alivio toma conta dos dois, por Billy não ter sido apanhado. O homem jovem e magro volta a bloquear a porta com a cadeira, numa atitude bizarra que chama à atenção de Harry e Lucy. Quando percebe que o perigo já passou, Billy desce de um esconderijo secreto que fica no foro da casa. Um esconderijo dentro de outro esconderijo. A faca continua na mão do garoto.

- Nunca mais faça isso, Harry. Você quase nos matou - Lucy repreende o marido pelo o que ele fez para chamar à atenção do homem que procurava por Billy.

Harry apenas olha para a esposa, tentando reconhecer aquela ao seu lado. Lucy Shear se mostrara uma pessoa insensível e indiferente ao sofrimento do marido e do próprio filho.

Herald Black apressa o passo. Sua respiração é ofegante e sua pulsação acelerada. A cada passo avançado dentro da cidade, um, dois, três corpos ou mais se transfiguram na frente do cientista. Os seus olhos são tomados de terror à cada corpo desfalecido encontrado. De repente, Herald avista a casa de Herry, e uma onde de alegria e preocupação toma conta de seu interior, o mergulhando outra vez no pavor. Quanto mais se aproxima da residência dos Shear, tudo vai se tornando mais estranho e macabro. O lugar está calmo demais - Silencioso demais - Parado demais - Morto demais, literalmente.

De repente, Herald Black é surpreendido com um soco forte no rosto, desferido por uma arma grande e pesada que ele nem tem tempo de identificar. Ele apaga. Os olhos de Herald vão se abrindo lentamente, contemplando uma claridade incomoda a sua frente. E a medida que ele vai recuperando a sua consciência, o mesmo vai tomando conhecimento do perigo em que se meteu. Ele está amarrado ao lado de Harry e Lucy.

- A "Bela Adormecida" enfim acordou do seu sono encantado - Zomba do mesmo Abigail Nelman, parada a sua frente - Se eu estivesse no seu lugar, eu iria preferir continuar dormindo.

Um arrepio profundo percorre todo o corpo de Herald Black com aquelas palavras. Seu sangue literalmente gela em suas veias. O recém-chegado é posto de pé por ordem de uma enlouquecida religiosa. Harry também é colocado de pé e tem suas mãos desamarradas. Em seguida , Abigail põe um revólver 38 nas mãos de Harry Shear, que olha para tudo aquilo perplexo, sem entender absolutamente nada.

- O que a senhora está fazendo? Enlouqueceu?

- Fique contente, senhor Shear. O Pai teve clemência hoje...

- Clemência?! - Mais confusão toma conta da cabeça de Harry.

- Deus está lhe dando uma chance de recomeçar sua vida com a sua família, senhor Shear. Basta fazer um sacrifício.

- Sacrifício?

- Esse homem é um pecador sem família - Abigail está apontando para Herald - Sem apego algum com nada. Ele não tem laços com coisa alguma, senhor Shear. Já o senhor tem. Tem a sua família. Sua esposa e seu filho.

- Eu não estou entendo onde a senhora está querendo chegar, senhora Nelman.

- Simples. Mate o seu amigo e salve a sua vida e à da sua família.

As palavras de Abigail Nelman foram como um soco no estômago de Harry. Seu ar ficou comprimido e sua visão embaçada. Ele não podia acreditar no que estava ouvindo. Aquela mulher louca e desequilibrada estava pedindo que ele matasse seu melhor amigo? Ela havia perdido totalmente o respeito pelas coisas. Como uma pessoa dessas poderia fazer o que fazia e ainda assim se considerar" filha de Deus? Era muito para a cabeça de Harry suportar.

- Não. Eu não posso fazer isso - Harry se volta rapidamente para à direção de Abigail Nelman, com a arma apontada para ela. Se alguém merecia morrer ali, esse alguém era ela. Aquela mulher maluca e insana.

- Abaixe sua arma, senhor Shear. Não quer que sua esposa se machuque, não é mesmo?

Um dos asseclas da religiosa mantém Lucy sob a mira de uma arma.

- Vamos, senhor Shear, a vida do seu amigo pela vida da sua esposa. O que é mais importante: seu amigo ou a mãe do seu filho? Ele vai ficar tão decepcionado com o senhor se algo acontecer a mãe dele. O que o pobre garoto vai dizer...

- Pare, pare com isso, senhora Nelman. Harry leva a mão a sua cabeça e se põe de joelhos. Ele começa a chorar, divido entre o que fazer. Entre o que é"certo" e o que é o "certo" a ser feito.

- O tempo está passando, senhor Shear. Eu acho que Deus não tem toda essa paciência para esperar o senhor se decidir.

- Vamor, amor. Faça logo o que ela está pedindo. Pense em nós. Pense no Billy - A voz de Lucy é uma facada direto no coração do marido. Harry a encara. Aquela é mesmo a sua mulher falando aquelas palavras? Pedindo para que ele mate o seu melhor amigo para salvar a vida deles? - Atira logo.

Quando foi que Lucy Shear se transformou naquele monstro insensível e sem coração e o marido não viu? Ou ela sempre foi assim, e Harry é que nunca tinha percebido o verdadeiro caráter da esposa? Qual era agora a diferença entre Lucy Shear e Abigail Nelman? Existia diferença? Harry agora se encontra ainda mais perdido em seus próprios pensamentos confusos e a todo momento bombardeado com a pressão feita por uma fanática religiosa que pensa que é Deus e por sua esposa, que se revelou igual ou tão pior quando a própria Abigail Nelman.

Querendo ou não, Harry tem uma decisão difícil em suas mãos. E é preciso tomar logo parte em uma das duas. A vida do seu melhor amigo pela de sua família. Ele se põe de pé outra vez e olha para Lucy e depois para Herald. Harry aponta a arma na direção do melhor amigo, e uma lágrima solitária rola em seu rosto. Suas mãos estão tremulas. O seu coração está sangrando por dentro. Herald fecha os olhos, encharcados de lágrimas.

Um carro do FBI se aproxima da barricada levantada na entrada de Miracle. Os dois agentes que se encontram dentro do veículo descem do mesmo. Eles encontram o carro de Herald Black abandonado. A ausência de um motorista chama à atenção deles, e o bloqueio levantado na entrada da cidade também. A medida que vão avançando nas ruas da cidade, a visão da chacina vai se tornando algo mais desesperador para os dois agentes, e confirmam às denuncias do xerife Eggans feita a eles mais cedo. É como se eles estivessem dentro de um filme surreal. Os dois ouvem vozes vindo de uma das casas, mas por enquanto é impossível saber de qual. Logo, eles se encontram diante da casa de Harry e Lucy Shear, e notam que as vozes estão vindo de lá de dentro.

Os dois sacam suas armas e ficam em estado de alerta.

- Vamos senhor Shear, você consegue - Instrui a senhora Nelman ao pé do ouvido do rapaz, quase como que um sussurro - Puxe o gatilho e está tudo feito.

- Eu não consigo senhora Nelman - Fala Harry, com a arma 38 na mão direita que treme freneticamente.

A sala mais se assemelha com uma panela de pressão prestes à explodir. O clima entre os presentes está cada vez mais acirrado, beirando o desespero e a paranoia. Na realidade, ele sempre esteve assim. O cano da arma está encostado na fronte de Herald Black, que se encontra suando mais do que uma chaleira em ponto de abolição. A voz da senhora Nelman continua à penetrar a mente de Harry como um pensamento caótico e sombrio.

- Apenas puxe o gatilho - A voz que emana da boca dela é quase um sussurro, que é repetido varias vezes na cabeça do jovem; o deixando em um estado quase que de loucura.

A mão de Harry treme cada vez que ele ouve aquela voz mandando-o puxar logo o gatilho daquela arma e acabar logo com tudo.

- A senhora conhece Deus, senhora Nelman? - Pergunta Harry Shear, naturalmente e de costas para a religiosa insana.

- O quê perguntou senhor Shear? - A pergunta de Harry soa meio estranho para Abigail Nelman, que fica olhando perplexa para aquele homem de costas para ela com uma arma apontada para a cabeça do seu melhor amigo.

- Eu perguntei se a senhora conhece Deus, senhora Nelman? A senhora conhece?

- Mas que pergunta mais sem sentido nessa hora, senhor Shear. Francamente.

- Se a senhora não conhece, vai conhecer hoje.

Em um ato rápido e que Abigail Nelman não havia pressentindo ou calculado, Harry Shear se volta outra vez para ela e lhe crava um tiro certeiro no meio de sua testa. Ela cai morta. O cientista aponta a arma em seguida para a própria cabeça e dispara. Do lado de fora, os dois agentes do FBI acreditam que estejam sendo vítimas de um ataque, e lançam fogo na direção da casa. De repente, um silêncio ainda mais mortal e assustador toma conta de tudo.

O socorro vem pela manhã

O cheiro de sangue e morte podia ser sentido da entrada da casa. A residência do casal Shear era a última da rua. A visão que os dois policiais do FBI presenciaram ao passarem pela porta da sala de Harry e Lucy Shear foi assombrosa: 16 corpos jaziam no chão do lugar, incluindo os do casal. Um dos policiais,de corpo franzino e pele clara, se lança ao chão com uma mão na boca. Uma ânsia de vomito lhe consome e ele é obrigado a colocar para fora tudo o que consumiu durante todo o dia. Seus olhos estão lacrimejados, sua respiração é ofegante e sua transpiração é demasiadamente exagerada. O seu parceiro, um policial de corpo mais saliente e pele escura, se mostra indiferente à tudo o que acontece ao seu redor. De repente, um barulho no interior da casa chama à atenção dos dois homens da lei.

- Que barulho foi esse? - Pergunta o primeiro policial, o magro de pele clara jogado ao chão, que a essa altura já tinha perdido toda a vontade de vomitar tamanho era seu medo.

- Eu não sei cara, mas fica alerta - Responde o policial de corpo saliente e pele escura, não escondendo também seu medo.

Suas armas já estão em punho, e pode se perceber as mãos de ambos os agentes tremendo levemente. O barulho continua, é como se alguma coisa ou alguém esmurrasse uma porta. Ele é abafado e distante, como se fosse vindo do segundo andar, de algum porão ou coisa do tipo. Os dois homens policiam os próprios passos, temendo que o ruído produzido dentro da casa venha do responsável pela chacina, e eles venham aumentar as estatísticas ali na sala.

Vasculhando minuciosamente o lugar, eles param na frente de um armário que fica em baixo da escada que leva ao segundo andar. Uma cadeira bloqueia a porta do local. E é de lá que o barulho vem. Um dos policiais, o magro de pele clara aponta a arma na direção da porta.

- Pronto, pode abrir. Mas com calma - Fala o agente, com os olhos fixos na porta.

O outro agente se aproxima da porta, meio receoso; ele retira a cadeira que bloqueia a entrada e gira a maçaneta da porta e à abre.

Billy Shear está em um canto, encolhido de terror e com a cabeça sobre os joelhos. A faca continua em sua mão.

- Calma garoto, está tudo bem agora - Fala o agente magro e de pele clara - Me dá essa faca, não precisa ter mais medo.

- Meu pai disse...

- Está tudo bem agora, não precisa mais dela. Eu vou cuidar de você agora - O agente lança uma mão na direção de Billy. O garoto joga a faca no chão e segura na mão do policial - Como é o seu nome?

- É Billy. Billy Shear.

- Ok! Billy. O meu é Johnathan.

- É o nome do meu professor de Matemática.

- Que bom então, eu só não sou bom em contas - Um riso entre os dois.

- Cadê meu pai e minha mãe? Eles estão bem?

- Claro. Eles estão, sim.

- É mentira. Eu ouvi os tiros.

- Billy...

- Não precisa mentir. Eu já tenho 9 anos, e meu pai disse que eu já sou um "homem".

- Ok! Então agora você vai fazer uma coisa de "homem" pra mim, certo? Eu vou tirar você daqui, e eu preciso que você feche os olhos, combinado?

Billy acena com a cabeça positivamente e fecha os olhos. Johnathan vai conduzindo o garoto pelo cenário de horror até à saída.

- Já pode abrir os olhos, Billy.

O garoto abre os olhos. O dia já está claro. As ruas estão enfeitada de sacos plásticos pretos. A policiais em todas as direções. A imprensa também está por todos os lados, cobrindo cada ponto do massacre, como urubus em volta da carniça. Billy olha para o céu. Ele está cheio de estrelas cadentes vermelhas como fogo.

- O mundo ainda vai acabar? - Pergunta o garoto.

- Como?! - A pergunta soa meio estranha para o garoto.

- O meteoro.

- Ah, entendi agora. Não, Billy, o mundo não vai acabar. Eles conseguiram destruir o meteoro. Pode ficar tranquilo, você ainda vai casar, ter filhos e netos. E eu também - O policial dá um sorriso meio tímido para o garoto - Billy, eu vou levar você agora comigo, vamos ligar para algum parente seu, ok?

- Posso ficar na casa da tia Sarah? Eu gosto dela.

- Dá tia Sarah? Claro, pode.

O agente conduz o garoto até o banco de trás da viatura. Em seguida, o carro deixa lentamente a cidade para trás.

FIM

*****************************************************

Johnathan King
Enviado por Johnathan King em 24/04/2015
Reeditado em 29/12/2020
Código do texto: T5218204
Classificação de conteúdo: seguro