Recordações Escuras

Tenho a sensação sublime de paz, harmonia, levitação. Sinto um calor agradável no meu rosto, junto com o distinto odor de enxofre. Abro os olhos e tudo se vai com fugacidade. O breu consome meu quarto, o único tom que se difere é o despertador digital ao meu lado que indica o horário 2:49. Fecho meus olhos numa tentativa fútil de voltar a dormir para ter aquela sensação novamente.

Sinto uma pressão no canto do colchão como se alguém tivesse sentado, abro meus olhos em pânico porém nada se alterou...Além de uma sutil luminosidade que transparece pela batente da porta. Me levanto e tateio com o pé na procura do meu chinelo e após calça-lo vou em direção a ela.

No corredor descubro que a lâmpada está acessa, apago-a, porém durante meu caminho de volta a cama noto que minha garganta implora por água e então me dirijo para a cozinha. Abro a torneira e nenhum líquido surge. Ouço um estrondo aparentemente vindo da sala. Imediatamente abro a gaveta de facas e pego a maior que encontrei, enquanto meu coração ruge em pânico caminho para a sala e me deparo com meus retratos no chão, estilhaçados. Uma foto me chama atenção. Olho-a. Nela pareço bastante feliz, vestindo smoking com os braços entrelaçados em um brinde com...Não...Ela...Sinto uma presença atras de mim, olho para trás e me deparo com um horripilante ser humanoide de longos e afiados caninos, pele de aparência podre e cabelos negros sem vida que chegam até sua curva costas.

Ele apenas me observa, e sinto naquele olhar, por alguns instantes, a mesma sensação que tive antes de acordar. Novamente e também subitamente tudo se vai e aquele horripilante ser meio corre e meio tropeça em minha direção enquanto solta um ruido ensurdecedor de fúria e dor. Em questão de milésimo me encontro no chão entrelaçado com "ele" em uma incessante luta pela vida. Sangue que sai de cortes longos feitos pela garra daquele ser monstruoso domina minha face, e o sabor metálico preenche minha boca. Em uma confusão de fios negros consigo avistar seu abdome e com uma força e fúria espantosa o apunha-lo. Uma sensação esmagadora de vazio me preenche , lágrimas limpam o sangue do meu rosto, caio sentando no chão. Meu olhar se dirige a pessoa caída sentada que me observa sem vida com grandes olhos arregalados enquanto segura a faca em seu peito. Aqueles olhos... Ela...Não! A recordação daquela madrugada horrenda me atinge e uma dor insuportável transparece em meu peito.

-NÃO!De novo NÃO!

Deitado encolhido no chão soluço histericamente naquele vazio, branco e almofadado quarto.

Samara Oliveira Motta
Enviado por Samara Oliveira Motta em 07/04/2015
Reeditado em 15/04/2015
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