O Hipnotizador

Ela estava ali, deitada num confortável divã, num também confortável consultório que cheirava a incenso, de um famoso e requisitado psicólogo e místico. Tudo em volta lembrava as ciências antigas. Havia cristais e pedras de energia, e cabalas penduradas como quadros nas paredes, e também manuscritos antigos de um povo já há muito esquecido. Curiosos equipamentos de alquimia, e estranhos experimentos em vidros de rótulos obscuros enchiam uma velha prateleira com os seus segredos. Uma biblioteca completa de livros de psicologia e ocultismo carregava o sofá e o belo tapete persa, com as suas grossas capas de couro envelhecido. Ela esperou então, até o doutor se apresentar diante da pesada porta que acabava de se abrir.

Era um velho simpático, de óculos por sobre os cabelos grisalhos, estatura baixa e um sorriso constante a tiracolo. Era a primeira sessão de hipnose dela. Já havia dias que tentava, através das consultas, e em vão, acabar com o seu medo doentio de aranhas. Como não conseguia, o velho doutor sugerira a hipnose. A intenção era regredi-la até a infância - ou mais além - para descobrir as causas da fobia, e deste modo, tentar curá-la.

Tão logo começa a hipnose, e ela se vê transportada para o parapeito de uma janela, possivelmente em Florença, nos idos dos anos de 1378. A sua alma, semi liberta, fê-la logo compreender que se tratava de uma encarnação anterior sua, quando se chamava Fabrisia, e vivia na idade média. Mal se deu conta disso, e alguns homens horríveis arrombaram a sua porta, pegando-a a força, e a arrastando para fora, sob os gritos de êxtase e aplausos de toda a gente que estava lá fora. Ela havia sido acusada de adultério, e a pena por todos era conhecida... Talvez, tivesse sido melhor ela ter sido acusada de bruxaria...

A levaram até o antigo e malcheiroso cemitério da cidade, onde seria enterrada viva para pagar por tão grave crime e afronta!

Mesmo se debatendo e resistindo horrores, amarraram-lhes as pernas, na altura dos tornozelos. Amarraram também os seus braços para trás, e introduziram um pedaço de ferro em sua boca, do palato até a língua, impedindo-a de fechá-la. Arrancaram o seu vestido, e a deitaram nua num rústico caixão de madeira! Tábua após tábua, pregaram a tampa, dos pés à cabeça, sem nenhuma pressa, para que ela acompanhasse todo o processo de enclaustramento. Até que a última tabuinha fosse pregada e sobrasse apenas uma lúgubre réstia de luz a banhar um de seus olhos terrificados.

Ela queria chorar, mas não podia! Ela queria espernear, mas não podia! Ela necessitava gritar, mas não podia... Só podia acompanhar o lento movimento da urna funerária a descer o buraco fétido, enquanto esbarrava nas paredes.

As pancadas secas da terra batendo na tampa do seu caixão, produziam ruídos surdos e agonizantes, enquanto tapavam a última fresta de luz e esperança que iluminava a sua face.

Silêncio absoluto...

Calor!

Suor infernal a escorre-lhe pelas pernas....

Uma terrível sensação de claustro, de um aperto sem fim... Um medo tão grande, que a impedia de desmaiar...

E enquanto tentava se animar, achando que a morte chegaria rápida, um ser repugnante, de muitas pernas e pêlos, veio escalando o seu corpo, devagar e solenemente, como se todo o tempo do mundo pertencesse àquela criatura.

Este ser explorou todo o seu corpo, até atingir o seu rosto, e ficar bastante claro, que se tratava de uma aranha! E quando a coisa parecia não poder ficar pior, outras vieram! E eram muitas - e depois disso, não poderei narrar mais nada do que aconteceu ali dentro daquele caixão - por que eu mesmo já estou assombrado aqui, e não faria bem à minha já fraca sanidade mental.

Ela acordou apavorada, gritando, como se tivesse dentro do peito, quatro, e não dois pulmões! Ela de debatia e chorava, e chamava pelo nome do doutor... Mas agora aliviada, recordando-se de que tudo não tinha passado de uma regressão, de uma lembrança, de um sonho terrivelmente ruim...

Mas, mesmo já desperta percebeu-se contida em seus movimentos... Estava cercada por todos os lados por uma maldita caixa de madeira - e não importava o quanto gritasse e chorasse, apenas conseguia sentir o cheiro das flores que a cercavam, e do ruído das 24 pequenas patas que se aproximavam de sua face rosada.

London
Enviado por London em 03/02/2015
Código do texto: T5124556
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