Por um segundo
Os cabelos negros e curtos bagunçados, uma camisola rosa com bolinhas brancas que mais parecia um vestido e um short todo rosa, foi assim que Kessi acordou no que seria, ou pelo menos deveria ser um dia normal.
De seu quarto podia ter acesso direto ao quintal que ela sempre visitava ao acordar, mas hoje ele estava diferente, as flores pareciam menos vivas e as árvores estavam mais sombrias que o normal. Kessi se aproximou de uma das maiores árvores, que lhe chamou a atenção por parecer mais sombria que as outras, ao se aproximar pôde notar a forte aura negra e densa que a cercava, ainda assim a menina tentou tocar uma de suas folhas, mas ao fazê-lo acabou contando de leve a ponta de um dos dedos:
— Ah! Ai... Caramba oque foi isso? – assustada decidiu se afastar e ir atrás de algo para fazer um curativo, rapidamente até a cozinha onde encontrou o kit de primeiros socorros do pai, que usava escondido aliás, afinal se o pai visse a quantidade de vezes que ela se machuca ia ter um infarto. — Isso deve ajudar. Ué mas cadê todo mundo? – Ela se perguntou ao se lembrar que todo dia a essa hora todos em sua casa estão a todo vapor, sua mãe estaria estressada com alguma questão do emprego e com o café que ficou doce demais, ele sempre ficava, o pai estaria cantando algo bem idiota enquanto queimava as torradas e a irmã mais nova o acompanhava na cantoria, aumentando o stress de sua mãe é claro. — Estranho... Vou ver lá fora... Depois que fizer esse curativo é claro!
— Kessi! Mana! Ei – Chamou uma vozinha doce e infantil, sua irmã mais nova a encarava de um canto escondido, Kessi lançou um olhar rápido ao vestido azul meio longo e os cabelos negros presos com um rabo de cavalo no alto que a menina usava, como sempre vaidosa, diferente da mais velha. — É você que está ai?
— Ah! Anne! Vem cá, você viu o pai ou a mãe por ai? – perguntou ajudando a menina a se sentar ao seu lado. — Até agora não vi nenhum dos dois.
— Não, ia te perguntar o mesmo! – Anne respondeu um pouco aflita, o que preocupou mais ainda Kessi.
— Como?
— Não os vi no quarto e pensei que talvez tivessem aqui. – Disse pensativa. — Passei na sala também, mas nada.
— Ata... Eles devem ter saído então... Bem vou ali me trocar, por que não vai pra sala ver um pouco de TV enquanto isso?
— Ok... – A menor disse pulando da cadeira e correndo para a sala de maneira incrivelmente energética.
Kessi então foi pra seu quarto e vestiu uma blusa azul com uns detalhes a aparte acompanhado de uma jaqueta branca uma calça Jeans azul escuro e um tênis Branco com detalhes pretos e foi indo tranquilamente para a sala até ouvir um grito que vinha de lá, um grito que a arrepiou por completo, fazendo a acelerar o passo duas vezes mais:
— Anne! – Ao chegar encontrou a sala toda revirada e bagunçada. — Mas oque? Anne? Cadê você?- Desesperada Kessi foi entrando na sala e empurrando a bagunça para o lado. — Nossa que bagunça você fez! Anne. – Ao se aproximar da janela pôde ver a faixada da casa, um grande muro que cercava toda residência e um grande portão feito de prata, a frente da casa possuía um enorme jardim que se dividia em flores de todas as cores, lindas flores que sempre a acalmavam e a distraia de tal forma que poderia ficar horas e horas as observando e hoje não seria diferente se não tivesse ouvido novamente aquele grito apavorante. — Anne! – Chamou quase que automático, ela saiu em disparada para os quartos dos pais de onde o grito parecia ter vindo.
O quarto também estava todo revirado, mas o meio dele estava vago e manchado de sangue, a irmã no meio chorando toda suja de sangue e a mãe caída e desacordada, também suja de sangue, a menina ia se aproximar e foi impedida pelo pai que a segurou com força e foi a afastando do local.
Anne olhou para trás e sorriu, seus olhos estavam completamente negros e atrás dela muitas sombras pareciam rir.
Kessi tentou correr até a irmã mesmo assim, mas o pai era mais forte. — Pai, espera! Pai, a mamãe, pai! – Chorando de medo Kessi só pôde ver quando Anne levantou a faca que estava em suas mãos e golpeou a si própria, “como?”, “Quando?”, as memórias de momentos antes perturbavam Kessi, como aquilo foi acontecer como uma criança de oito anos pode ter feito tudo aquilo? Então o pai subitamente parou de andar e caiu no chão.
— Pai? – A menina se ajoelhou ao lado do homem e nesse momento o terror a consumiu, ele sangrava e seus olhos estavam revirados. — Papai? - As sombras recomeçaram a rir e Kessi sem pensar correu para fora da casa, a preocupação e as lembranças da pequena irmã a atormentavam, “Como? Se ela estava bem agora pouco! Como?”, quando chegou ao portão encontrou Anne chorando e correu até a menor. — Anne? Vem eu estou aqui. – A irmã a encarou, mas seus pequenos olhos foram guiados a algo atrás de Kessi, que engoliu seco ao perceber que alguém estava atrás.
— Ei, vamos cantar uma canção de ninar. – A voz do pai ecoou por sua mente, Kessi se virou desesperada no exato momento em que o pai lhe acertou com a faca.
– Ah! PAI!
— Kessi, Kessi! Tá tudo bem! Calma!
— Em? – Kessi pulou da cama ao ver Anne ao seu lado, rido de sua situação, os cabelos negros e curtos bagunçados, uma camisola rosa com bolinhas brancas que mais parecia um vestido e um short todo rosa. — Mas... Foi... Um sonho?
— Acho que sim né – Anne não se continha de tanta vontade de rir. — Você deve ter tido um pesadelo daqueles em!
— Pois é. – Disse num tom meio vago enquanto se levantava e ia em direção ao quintal, que se encontrava calma e pacifico como sempre, os pássaros cantavam e tudo estava tranquilo. — Acho que foi mesmo.
— Hum... E sobre oque era? Em...
— Nada demais, eu já até esqueci. –Na verdade ela ainda se lembrava, mas não queria saber dele nunca mais e por isso preferiu não tocar no assunto.
— Ah, fala sério! Me conta vai?
— Já disse que não lembro! Agora vai embora, Porque vou me trocar e não quero que você me atrapalhe.
— Tá legal! Já entendi! Tchau também, kes-sii.
Kessi fechou a porta e foi decidir que roupa iria usar, ia pegar as primeiras peças que viu pela frente, uma blusa azul com uns detalhes a aparte acompanhado de uma jaqueta branca uma calça Jeans azul escuro e um tênis Branco com detalhes pretos.
— É... Pensando bem, melhor não. - Passou direto e preferiu usar apenas um vestido branco com uns detalhes verdes. — Assim é bem melhor. – Depois de arrumar o cabelo foi para a cozinha, com o coração um pouco disparado por causa do sonho, oque não durou, pois assim que chegou encontrou a mãe preparando o café da manhã e gritando com alguém no telefone. — Ufa!
— Jeremy pela milésima vez... Ah! Filha... Bom dia!
— Bom dia mãe. – Quase que automaticamente saiu em disparada e deu um grande abraço na mãe, que se surpreendeu, pois não era uma atitude comum da filha e desligou o telefone.
— Kessi tudo bem querida? – A mulher perguntou confusa, o que fez a menina rir.
— Sim mãe... Só pensei por um segundo que... Nada, cadê o povo?
— Bem... Devem estar na sala! Vai lá vê!
— Ok. – Kessi foi para a sala e sua mãe voltou a xingar Jeremy.
Com passos lentos e o coração disparado ela entrou na sala, e encontrou o pai vendo TV com Anne ao seu lado reclamando por ele não querer ver os desenhos e enfatizando o quão chato era o programa que o homem assistia enquanto o pai fazia caretas a cada argumento da menor. “Então foi mesmo um sonho”. Kessi se aliviou ,“Tudo está normal, Tudo no lugar” era tudo o que a menina pensava naquele momento em que se jogou no sofá ao lado do pai e começou a disputar pelo controle da TV.
Mas não podia negar uma coisa, esse foi o sonho mais estranho e real que já teve em sua vida.