Movido a Vapor
Era o ano de 1741, Watson Geoffrey era um jovem genial, idealista e rebelde. Romântico incorrigível, professor da mais conceituada universidade do país, socialista utópico, Byroniano, e otimista por natureza.
Nunca se conformara com as condições de trabalho na velha Inglaterra, com a exploração dos mais fracos e com a ganância dos estúpidos. Aos seus olhos pesava ter de assistir ao sofrimento dos seus confrades nas indústrias recém criadas, onde eram explorados até a morte, homens jovens e velhos, mulheres e crianças.
Como bom gênio que era, teve uma brilhante inspiração, no dia em que a sua velha chaleira de café explodiu na sua cara, levando dali o seu velho cachimbo full bent, jamais encontrado de novo, e deixando uma horrorosa cicatriz como compensação. Ali, naquele dia, concebeu a ideia de tornar mais fácil a vida dos trabalhadores execrados das fábricas. Automatizaria todos os processos e encurtaria as distâncias, usando aquela força que se rebelara contra ele revelando todo o seu poder: O vapor! ... E, antes mesmo de ter sido imaginada a primeira locomotiva a vapor rudimentar, Watson Geoffrey já tinha criado um robô movido a vapor!
Tá certo que era movido a lenha, e o forno para a combustão era mais embaixo, bem ali onde deveria estar o bumbum da máquina! O que deu a ela o interessante e ingrato apelido de rabo quente! Mas tinha uma inteligência artificial admirável... e já auxiliava ao seu amo em todos os afazeres, domésticos e profissionais. Conversavam sobre filosofia, política, religião, metafísica e todos os intrincados meandros que a cultura humana fora capaz de criar no ramo do conhecimento acumulado. Mas, mesmo com toda a intelectualidade de rabo quente, emanada dos complexos mecanismos elétricos que carregava no alto da cabeça, que anteviram a chegada dos processadores mais modernos 300 anos antes, e ainda assim, muito mais poderosos, o robô não ficava livre das óbvias piadinhas.
Rabo quente era uma máquina fabulosa, e o mundo ficara aturdido à sua presença. Mas, por mais que homens comuns, doutores e magos ficassem mudos com a sua presença, era Watson que recebia todos os louros.
Doutor Watson era bajulado e premiado semanalmente. Palestrava nas melhores instituições, ganhava todas as donzelas e dominava todos os setores do conhecimento então nascente.
E rabo quente só levando lenhada! - Literalmente.
Um dia, Dr. Watson fora convidado a palestrar na jovem universidade de Princeton. Os melhores cérebros do mundo estariam lá. Conquanto, ele desapareceu por uma semana. Até que receberam uma carta sua, confirmando a presença.
Marcada foi então a esperada palestra. Chegara o grande dia! Milhares de pessoas aguardavam a grandiosa exposição de conhecimentos.
Eis que aparece, para o espanto de todos, Rabo quente.
Mas, o que os deixaram mesmo atônitos, fora que o velho robô aparecera travestido com a pele do bom doutor, que ele próprio esfolara. E com o cérebro de Watson pregado por sobre a sua cabeça metálica! O doutor fora mesmo brilhante, a tal ponto, que a sua criação cultivou os conhecidos sentimentos humanos que atravessaram as eras: a inveja, o ciúme e a ira. Ele o havia matado já há duas semanas...