Conversa Inacabada
Duas e meia da madrugada e a luz permanece acesa no quarto de Lucas. Sentado à mesa do Computador, ouvindo Músicas e lendo Contos Noturnos, ele nem percebe o quanto é tarde. “Maldita visão periférica”, pensa ele quando supostamente vê algo escuro no quarto.
As histórias no novo site que encontrou, realmente assustadoras, criam ilusões quando juntas com Nobody’s Home, da eternamente jovem Avril. Pode parecer estranho a ti, incauto leitor, mas Lucas sempre preferiu as músicas tristes, de letra deprimente.
O motivo? Muito cedo para divagar... Ele nunca gostou que contassem seus segredos a estranhos. E ainda nem sabes que os pais deles são divorciados, por exemplo... Se bem que, pensando bem, pode ser que nem eu saiba e esteja a te enganar, caro ledor.
De qualquer forma, o cansaço começou a vencê-lo. E, por isso, resolveu ir à cozinha abastecer as energias com uma colher de açúcar. Açúcar sempre trazia mais energia, e era bom para tirar o gosto ruim da madrugada não dormida.
Um metálico gosto doce encheu-o completamente. Foi bom, pois ajudou nosso pobre herói a engolir melhor a história que lia. Tratava-se de uma história qualquer, onde os problemas absurdos de um determinado indivíduo eram resolvidos por meio de um Pacto.
Nosso aficionado pelo terror nunca acreditou muito nessas histórias que envolviam o demônio. Parecia forçado demais para ele acreditar que o próprio diabo ajudaria pessoas em troca de almas, delas ou de outrem... Sem contar que era fácil demais fazer algo assim nas histórias.
Foi com esses pensamentos em mente que ele, com toda a coragem que alguém de dezesseis anos, a sós em casa e próximo à terceira badalada da manhã, conseguia reunir bradou: “Adoraria conversar um pouco contigo – estacou pois não sabia como chamá-lo – Senhor do Submundo?”
E foi com esse final perguntado que ele voltou para o quarto e colocou os fones, prestes a recomeçar a Playlist e terminar o conto que começara antes da fatídica ida à cozinha. Bem, seguindo o mote do Jack, o Estripador, explicar-te-ei os cinco acontecimentos que culminaram no estudo prematuro da Geologia de Campos Santos por parte de Lucas.
Primeiro nosso amigo quase caiu da cadeira ao pôr os fones. É que havia uma música tocando, e ele não fazia ideia de onde ela havia surgido. E, após uma sequência de toques agudos, seu parco inglês decifrou a seguinte frase: “She was not one of them.”
A segunda surpresa, que deu início à taquicardia no rapaz, foi descobrir qual era a música no Google. Pois sei que te espantarás, caríssimo legente, quando descobrires que a música vinha de um grupo alemão conhecido como Blutengel, e que o nome da mesma era Lucifer.
O próximo sinal, se é que podemos chamá-lo assim, foi uma voz grave e melodiosa perguntando quem o havia chamado vindo detrás de nosso recém-convertido. Espero que não te importes, mas sempre gostei de entradas dramáticas.
Aproximei-me do rapaz estático e pus minha mão de leve sobre seu ombro esquerdo. Pedi o que ele queria, se desejava conversar... Juro-te que não o assustei! Seria incapaz de fazer algo assim, e espero encarecidamente que creias em mim.
Senti que ele pretendia abandonar, possivelmente forçado, as histórias sem terminar de lê-las e incentivei-o ao final, dizendo calmamente que o Negro estava chegando, e ele nunca foi de muitas palavras.
Antes de continuar a narrativa peço-te um favor, caro amigo. Podes responder em voz alta, baixa ou em pensamentos. Não importa. Eu ouvirei. Estou bem atrás de ti. Sou aquele vulto do canto da esquerda. Não o da direita, por favor. Ele não tem um pingo da minha simpatia, se é que me entendes.
E bem, antes que eu me estenda muito, gostarias que me respondesse o seguinte: Por que as pessoas tem medo de mim? Não que eu me importe, mas dificulta meus negócios não conseguir falar com as pessoas...
E levanto essa questão porque apenas a minha simples menção ao Arcanjo Negro bastou para que Lucas fechasse os olhos, fizesse o sinal da cruz e começasse a repetir: “Isso não está acontecendo... Isso não está acontecendo...”
Bom, de qualquer forma, segurei um riso e soltei o ombro dele. O Mensageiro Anímico chegou, e, sabes, não gosto muito dele. Aquela carranca sombria, sempre escondida... Não me parece boa coisa. Nada muito austero pode ser boa coisa.
Deixemo-lo de lado por enquanto e preocupemo-nos com coisas mais importantes. Como possivelmente percebeste, não consegui uma conversa decente com ele e, confesso, é realmente entediante cair na rotina, especialmente quando ela dura a Eternidade!
Logo, amicíssimo leitor, se não tiveres nada para agora, e saibas que eu sei que não tens, chama-me para uma conversa, um diálogo, até mesmo um desabafo. Sabes como me chamar, creio eu, e, ao contrário dEle, que demora a responder, eu sempre estarei disponível para ti.