O Doce E Macabro Segredo de Anna- A Valsa
Era um amplo salão iluminados pelos candelabros de cristal, onde a luz de centenas de velas se refletia nas jóias e tiaras das damas. Elas observavam os cavalheiros discretamente com seus binóculos. No ar misturava-se o perfume doce das fragrâncias importadas, das flores nos vasos e o som da orquestra fazia os pares deslizarem pelo chão de mármore polido pelas mãos das escravas.
Anna desceu da carruagem e subiu as amplas escadarias, erguendo as amplas saias de seu vestido carmesim. Entrou no salão de cabeça erguida e sorriso no rosto, orgulhosa de sua beleza, o lindo diadema de rubis verdadeiros cintilando em sua fronte. Sabia que a presença dela ali, a mais famosa cortesã da cidade, era uma afronta às senhoras honestas que tinham comparecido ao baile. Mas essa era sua doce e gentil vingança, ser adorada e desejada por aqueles mesmos homens que ali estavam, sisudos e impecáveis ao lado de suas esposas...
Porém Anna fora ao baile apenas para encontrar seu novo affair, um lindo rapaz chamado Inácio, que conhecera dias antes numa festa. Só se pensar nele seu coração batia mais forte. Quem sabe não conhecera o homem da sua vida? Logo encontrou duas amigas, duas outras cortesãs chamadas Isabela e Laura, e as três foram ocupar o camarote reservado, onde as esperavam frutas e champagne gelado.
- Onde ele está? - perguntou uma delas com malícia a Anna. - estamos curiosas para conhecer esse que tanto mexeu com seu coração, Anna!
Anna bebeu um gole de champagne e as encarou de lado.
- Ele é apenas meu. - respondeu com azedume. Percorreu a vista pelo salão com o auxílio do binóculo e logo o avistou no salão, o que fez seu rosto se transfigurar. - Lá está ele1
Inácio também a vira, e acenou. Isabela e Laura balançaram a cabeça, abanando-se com seus leques.
- Anna, agora entendemos o motivo de seu ciúme... ele é muito, muito bonito!
Anna desceu ao encontro de seu amado. Inácio a aguardava junto às escadarias e beijou-lhe galantemente a mão coberta por uma luva de renda preta. Seus olhos deslizaram pelo corpo da jovem, admirando-a.
- Está uma verdadeira deusa essa noite. - disse sorrindo. Ele também estava lindo, usando um fraque negro e com um cravo vermelho na lapela. - Terei a honra de convidá-la para uma valsa?
- A honra é toda minha, cavalheiro. - respondeu Anna de modo sedutor, e eles começaram a rodopiar pelo salão com uma leveza e precisão admiráveis. Os olhos negros de Inácio... seu sorriso de dentes muito alvos... Anna nos braços dele... aquela boca... Anna, estou esperando por você... disse a voz dele em seu ouvido... Anna...
Anna acordou sobressaltada em sua cama e acendeu a luz de cabeceira. Consultou as horas. Quase três da madrugada. Depois espreguiçou-se nos lençóis, deliciada... era ele, o moço do cemitério... mas e ela... seria ela numa outra vida?
Uma semana decorrera desde que estivera no cemitério, e não deixara de pensar em Inácio um só dia. Aquilo acontecera mesmo ou fora sua imaginação? No dia seguinte, depois da aula, Anna decidiu que voltaria ao cemitério. Pegou um táxi e desceu lá na frente. Ligou para a mãe, dizendo que iria se atrasar um pouco. Passou pelo portão de ferro rangente... já era quase noite outra vez... andou pelas alamedas desertas, as folhas secas rangendo sob seus pés. Será que ele existia mesmo?
- Inácio! - chamou. - Inácio, você está aí? Apareça! Sou eu, a Anna!
Apenas o silêncio como resposta... então Anna de repente vê uma coisa balançando, era o balão preto de Halloween que era a Inácio... estava preso a uma cruz de ferro, e na lápide se lia, em letras desgastadas pelo tempo ; " AQUI JAZ INÁCIO SILVEIRA PRATA NASCIDO EM 1839 E FALECIDO EM 1860. ORAI POR ELE."
Então Anna viu a foto de Inácio, muito amarela e desgastada, no túmulo...