PARADOXO
PARADOXO
Criado Por.: Vinicius N. N.
Ela passeava pela rua graciosamente, com um vestido vermelho, envolto numa esbelta manta de brilhos cinzentos, que acentuava seus traços corporais, tornando-a formidável. Sua pele singela e delicada, tonalizava-se com as luzes incandescentes dos postes naquela noite e salientava seus lindos cachos loiros, ressaltando assim a cor esverdeada de seus olhos. As sobrancelhas finas, mas bem decoradas, completavam perfeitamente o semblante de seu rosto, somado aos seus lábios grossos e carnudos.
Jasmim, segurava um bebe, fruto de suas noites como cortesã, ele só tinha duas semanas de vida, e de certo modo, ela não poderia cuidar da criança. Portanto, em prosa deste destino ilusório, reprimiu sentimentos de remorso e ia de encontro com um orfanato no centro da cidade. A culpa, não poderia ser tão fulminante como naquele momento, ponderado com lampejos de tristeza.
Ruando uma calçada calma, num andejar constante, Jasmim deparou-se junto a um beco, tão escuro e pérfido, como a noite que a rodeia. Gatos meando, pingos de água caiam no chão e sons estranhos ressoavam por aquele lugar. Entretanto, ela se dispôs a entrar nele, mesmo já pressupondo o pior. O beco, servia como único atalho para o orfanato.
Logo ao entrar, notou com uma virada de olhos rápidos, que alguém a seguirá. À vista disso, tão certa do que devia fazer, Jasmim correu, e no primeiro segundo que remeteu seus pés para tal ação impensada, ouviu um grande estrondo oscilar pelo ar. A bala perfurou sua espinha, atravessou o pulmão e saiu pelo abdômen, atingindo o joelho direito do bebe. Jasmim caiu de joelhos no chão, debruçada em um latão de lixo que havia em seu lado. O sangue que escorria por seu corpo e se desmaecia na água, formava uma poça enorme, seus olhos vidrados no chão, se perdiam em meio aos seus últimos suspiros.
O infante que estava envolto nos braços desfalecidos de Jasmim, chorava incessantemente de dor, seu pequeno joelho, desaguava espirros de sangue na face da mãe, que ainda conseguiu falar:
- Desculpe.
Então, toda a vida, foi-lhe desarraigada. O homem, que segurava um revólver em suas mãos, prontificou-o no coldre e estugou-se até Jasmim. Ele trajava um sobretudo negro, seus cabelos que pouco podiam-se ver por causa de seu chapéu, pareciam ser ruivos, tão vivos como o sangue. Em suas mãos encontravam-se luvas, das quais estavam gravados os seguintes caracteres: – V. N. N. Com uma feição desprovida de sentimentos, ele tomou a criança dos braços da mãe e o levou.
Uma mulher que presenciou tudo do outro lado da rua, pegou o telefone e indubitavelmente, ligou para a polícia. O homem misterioso, não precisou dar mais de três passos e agarrou o braço da senhora, que começou a gritar e pedir socorro desesperadamente. Porém, o beco era fechado e sem residências, ninguém poderia ouvi-la. Num vulto rápido e mortal, o homem tirou um facão do cinto e golpeou o braço dela, arrancando-o facilmente. O telefone caiu no chão, contudo já haviam atendido a ligação. Vendo o celular jogado, ele levantou o pé e o pisou fortemente, destruindo-o.
A senhora que sentia uma dor excruciante, foi abençoada com um golpe fatal no crânio, dando a ela a paz desejada.
Algumas quadras dali, o homem foi avistado por uma viatura, o que resultou numa perseguição. O policial Neto, e seu estagiário Rodriguez, buscavam um modo de encurrala-lo, até que o carro que eles dirigiam acabou batendo numa árvore. Neto conseguiu sair da viatura em segurança, com apenas umas escoriações leves, mas, Rodriguez ficou preso no banco, pois o cinto de segurança, estava emperrado. Neto tentou salvar seu amigo, mas foi almejado pela explosão do veículo, o que matou Rodriguez carbonizado.
Domado por uma fúria sem limites, Neto começou a correr atrás do homem procurado e quando finalmente estavam perto um do outro, um tiroteio ocorreu. Balas voaram para todos os lados, como um estouro de boiada. Um tiro acertou de raspão a coxa do homem misterioso, e outro transpassou o braço de Neto. Ele soltou o bebe no chão, naquela calçada cimentada. Dado que sentia um forte dor na perna.
Neto, não podia deixar o bebe lá sangrando, pois certamente ele morreria, portanto, o pegou deliberadamente e levou para uma igreja não tão longe dali, onde encontrou o Padre Nascimento, que ajudou a socorrer a criança.
A igreja estava vazia, faltavam dois minutos para a meia noite, Neto não conseguia chamar reforço, já que seu comunicador estava quebrado. Enquanto socorriam a criança, algo inesperado acontece, as luzes se apagam, uma penumbra desnorteante de terror surge em meio ao clima tenso. O padre vai até o altar e pega uma vela, com o intuito de diminuir a escuridão, contudo, na mesma hora em que se vira para acende-la, surge um homem que esfaqueia seu coração, nem mesmo seus olhos podiam ter visto quem era. Ele puxa o corpo do padre para baixo da mesa e o cobre com um pano de cetim branco, que segundos depois se suja com seu sangue.
Neto está na outra sala, esperando o padre, com os curativos e as velas. O frio, é mais forte do que sua coragem, e quando ele ouve sons insólitos atrás da porta, ele a abre. O homem pula sobre ele, e o golpeia no rosto com vários socos, Neto consegue se recompor e joga ele na escadaria. Ainda assim, ele tira abruptamente um facão da cintura e corta a panturrilha de Neto, que acaba caindo no chão. O homem pega o bebe e ateia fogo na igreja, bem perto de um botijão de gás.
- Para, Vinicius! Vamos falar com o padre sim!
- Olha lá, tá pegando fogo a igreja!
Do lado de fora, o sujeito execrável ouve a conversa de duas crianças, que pretendem entrar na igreja, mas ficam assustadas ao ver fogo pela janela.
Elas abrem a porta e são surpreendidas pelo homem misterioso, que sem ligar para elas, sai correndo. As crianças ouvem um pedido de socorro proveniente de Neto, que ainda continuava vivo, e acabam entrando na igreja. Porém, nesta mesma hora o botijão explode, e eles morrem.
O psicopata que foge com o bebe, nota que a criança já não está mais viva, e presenciar aquilo acaba o comovendo de alguma forma, ele começa a chorar. Suas lágrimas escorrem por seu rosto e caem sobre o infante, e isso acaba o desmotivando. O homem pega o chapéu que cobre seu rosto, e o joga no chão, vê um banco de praça a poucos metros dali e se senta nele.
Logo um outro homem chega e se senta ao seu lado, começa a encara-lo durante uns instantes e depois diz:
- Não importa mais, a criança já está morta... Daqui a pouco nós pararemos de existir...
O homem com uma roupa muito estranha e exótica, olhou para o psicopata de modo infeliz.
- Não adiantou em nada mesmo... Criamos um paradoxo, que resultou na nossa morte.
Os dois se encaram, ambos detinham das mesmas feições, e não só isso, eles eram idênticos, os mesmos cabelos, os mesmos olhos, a mesma cicatriz no queixo. O homem estranho, olhou para suas mãos e notou que estava desaparecendo vagarosamente, o mesmo acontecia com o assassino ao seu lado e a criança.
- O que está acontecendo?
- Você matou, nosso eu recém-nascido, agora não podemos existir.
- Como assim? Quem é você?
Ele apontou o dedo para o psicopata e disse;
- Eu sou você! Vinicius do Nascimento Neto.
O assassino olhou arregaladamente para ele, como se o espanto fosse apenas meramente um sentimento de susto. E finalmente eles desapareceram.
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Em toda loucura existe um traço de lucidez, e é esse o tema central da história. Um homem que mata uma mãe, para pegar seu bebe, e logo depois e perseguido por um policial que morre dentro de uma igreja com um padre, e então ele nota que o bebe está morto e senta num banco, onde encontra Vinicius do Nascimento Neto, um homem vindo do futuro. Sua existência no passado gerou uma perturbação no tempo, sendo assim, passado, presente e futuro se convergiram e o catalisador disto, foram os diversos Vinicius que chegaram com esta ação. O Vinicius bebe que nascerá a pouco tempo, o psicopata, o policial de vinte dois anos, o padre de setenta e seis anos, o garoto de treze e o homem do futuro, que se decepcionou ao ver o que fez.
“Aquele que perde é sempre o que fecha os olhos para o óbvio”
De Vinicius N. N.