Meia noite
Medo. Era esta a expressão que se encontrava estampada nos rostos de cada um de nós. Éramos três amigos, reunidos na sala empoeirada daquela casa velha e escura, quase caindo aos pedaços. A tempestade lá fora castigava as janelas e as paredes com uma força estrondosa, e os raios assustadores acrescentavam àquele recinto um ar bruxuleante. Encontrávamo-nos situados ao redor de uma lareira quase extinta, todos muito quietos, apenas esperando.
Horas se passavam sem que nenhum de nós se atrevesse a sair do lugar. O silêncio opressor teve fim quando o gongo do antigo relógio, preso a parede mais próxima, ecoou por toda a casa, pegando-nos desprevenidos e arrancando pequenos gritos de nossas gargantas secas. Era meia noite.
De repente a porta de entrada se abriu em um rompante, provocando um estrondo quando se chocou contra a parede, que nos fez saltar de nossos lugares. Por ela passou um belo rapaz de porte atlético, cabelos louros impecáveis e sorriso matreiro. Ele se aproximou de nós com desenvoltura, se estabelecendo em um dos sofás com movimentos fluidos. Foi então que ele notou nossas expressões aterrorizadas e perguntou o motivo. Ficamos a nos entreolhar por alguns minutos, sem saber o que responder. Por fim Ricardo, o mais velho e corajoso dentre nós, se adiantou e perguntou se ele, Raphael, acreditava em fantasmas. O aludido soltou uma gargalhada e perguntou que besteira era aquela. Sara se prontificou a corrigi-lo, dizendo-lhe que não era bobagem.
Ainda rindo, Raphael indagou o porquê daquela discursão repentina. Juntando toda a pouca coragem que ainda nos restava, eu, Sara e Ricardo pedimos para Raphael nos seguir. Caminhamos por algum tempo em meio à tempestade, a caminhada lenta por conta das roupas molhadas e dos corpos rijos pelo frio e pelo medo. Apenas Raphael parecia estar a vontade, assobiando uma cantiga antiga. Por fim avistamos o monte de terra que era nosso destino final. Com lágrimas nos olhos, indiquei com meus dedos trêmulos uma pedra que havia sido fixada na base do monte. Era a lápide de um túmulo onde se lia: “Aqui jaz Raphael Dias. Amigo fiel e corajoso. Que ele descanse em paz.”