Um agradável dia de sol no metrô

Renato está no Metrô como todos os dias.

Ouve as pessoas dizerem que aquele dia será especial.

É véspera do dia das crianças e muita gente vai emendar o feriado.

Para Renato nada ia mudar na sua rotina, não tem muito interesse em feriados.

Exceto que o Metrô fica menos movimentado.

Todos comentam como o sol está lindo e como o céu está mais limpo.

Renato não é um cara chato, mas nada disso o interessa.

Ele gosta mesmo é de observar as pessoas.

Um tipo de Voyer do metrô.

Gosta também de colecionar rostos, tentando lembrar quem ele vê diariamente nos vagões do Metrô.

Para ele a vida é sempre a mesma.

Inflação, queda do Dólar; nada o incomoda.

Exceto os dias de greve no Metrô, isso ele detesta.

Passa o dia de vagão em vagão, de trem para trem.

Da madrugada até o momento em que o Metrô fecha para o público.

É um desocupado, eu sei.

Aquela garota dormindo. Está bêbada? Ou é drogada?

Aquele senhor irado. O que o fez ficar assim?

A mulher com o bebê, por que chora? Estaria ele doente? Ou com fome?

Renato observa e tece teorias em torno do que pode estar acontecendo com as pessoas.

Ele segue belas mulheres até a saída do Metrô e então volta.

Há uma moça que ele gosta particularmente de seguir. Tem cabelos lisos e finos.

Sua pele, delicada.

Renato tem um enorme desejo de tocá-la, porém só a observa de longe.

A garota sabe que Renato esta lá e apenas o ignora.

Nesse dia de Outubro, véspera de feriado algo acontece.

Renato está em um canto do vagão, observando como sempre quando o metrô pára bruscamente e derruba vários usuários.

A composição fica alguns segundos parada enquanto todos praguejam contra o condutor.

Pouco a pouco as pessoas se calam ao ver a agitação anormal na estação.

Uma mensagem alerta o publico a sair com calma do metrô.

Renato sente um nó no estômago, algo muito grave aconteceu.

Apesar dos seguranças instruírem os usuários a atravessar e pegar outro trem na plataforma ao lado, as pessoas se aglomeram para ver o que aconteceu.

Renato é um deles abrindo espaço entre os curiosos que se acotovelam para ver o macabro espetáculo.

O condutor do metrô chora repetindo sem parar que a culpa não foi dele.

Renato passou de mansinho entre os guardas que isolam o local.

Vê a gigantesca poça de sangue e pedaços de membros sobre os primeiros vagões.

Uma mão sai debaixo do metrô e ele a puxa para cima.

É a bela moça que ele observa diariamente.

- O que você quer?? – pergunta ela ainda sem entender que está morta.

O rosto dela é uma massa de sangue e carne destroçada.

- Vim te ajudar a sair daí de baixo...

Ele a abraçou com o lado não esmagado do próprio corpo.

Renato está morto desde 1972 soterrado nas obras do Metrô de São Paulo.

Arrastando o que resta de suas almas entram na composição que chega à outra plataforma.

Rumo a uma viagem sem fim.

Fim.

Humberto Lima
Enviado por Humberto Lima em 21/05/2007
Código do texto: T495787
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