A Caixa.

Recorte diário oficial 25/10/2006

Museu paulista da universidade de são Paulo (museu Ipiranga) convoca o Sr. Alex Almeida da Silva, Ctps 84236/015-66 Sp a comparecer em 24 horas na sede do museu sob pena de configuração de abandono de emprego.

A CAIXA

Alex suava frio, detestava passar por aquela porta.

Trabalhava no museu do Ipiranga a mais ou menos sete anos.

A ronda da noite havia sido tranqüila até semanas atrás, quando tinham trazido a caixa.

Ela havia sido encontrada em São Paulo, dentro de uma cripta no mosteiro de São Bento no centro velho.

Datava de aproximadamente 1650.

Toda vez que passava sozinho na frente sala de Cotidiano e Sociedade onde ela estava guardada, ouvia ruídos estranhos.

Nos primeiros dias chegou a levar sua noiva Olga para ver se ela escutava alguma coisa.

Nada.

Era só estar sozinho e aquela lamúria suplicante, como um gato querendo sair de casa, começava.

Aquele som o arrepiava.

Era mórbido, sinistro; ainda mais por Alex saber que fazia mais de trezentos e cinqüenta anos que aquela caixa não era aberta.

Ele não estava louco, fez exames de ouvido, psicológicos e tudo o mais.

Estava na mais perfeita forma.

Não sabia se deveria abrir a caixa ou não.

Lembrou-se do que seu pai dizia:

“Enfrente seus medos”.

No dia vinte de outubro depois que todos foram embora do museu, o jovem ligou para sua noiva.

Pediu que ela fosse lhe encontrar.

Pretendia leva-la ao cinema e talvez jantar fora logo que seu turno acabasse.

Era a última ronda de seu turno e logo deixaria aquele museu, que ficava cada dia mais apavorante em sua opinião.

Ao passar pela sala onde ficava encerrada a caixa escutou um barulho.

Suando frio foi chegando cada vez mais perto e logo jogou o facho de sua lanterna.

Nada.

Tudo silencioso como deveria estar àquela hora.

Começou a se afastar quando ouviu de novo.

Voltou rapidamente e quanto mais se aproximava mais alto ficava aquele som de algo arranhando a caixa.

Quando entrou na sala parecia que algo ia arrebentar a caixa de dentro para fora.

Tremendo Alex tocou a caixa.

No mesmo instante o ruído parou.

O segurança se arrepiou todo e pensou em deixar tudo como estava.

Respirou fundo e lembrou-se de seu pai. Um homem que não tinha medo de nada.

Destrancou a caixa e com o cassetete na mão abriu.

Estava completamente vazia.

Alex baixou a cabeça, a testa porejando.

Quando a levantou novamente notou que a sala estava escura.

Escura demais.

Fechou a caixa com cuidado e tentou ligar sua lanterna.

Não conseguiu.

Subitamente algo se enrolou em uma de suas pernas.

Algo viscoso e úmido como um ofídio.

Assustado ele acertou a coisa com seu cassetete.

Aquilo fosse o que fosse o soltou, mas o jovem ouviu um barulho de algo se arrastando vindo de várias direções.

A perna começou a arder no local onde fora tocada pelo ser abjeto.

Virou-se para fugir e só então notou que não estava mais no museu.

A escuridão era tão intensa que Alex não podia ver nada além de uma porta.

Uma porta estranha.

Alta e dourada parecia suspensa no ar poucos pés acima do chão.

Teve medo de abri-la, porém o medo das coisas que aproximavam arrastando-se não lhe deixava uma segunda opção.

A perna continuou ardendo e foi com uma facilidade suspeita que o segurança abriu a porta.

Para seu espanto tudo continuava escuro, a única diferença era uma outra porta dourada visível a um quilômetro de distância.

Sem saber em que pensar o que acontecia com ele, começou a correr.

Sua cabeça doía e a perna latejava, Alex percebeu que o ponto onde a coisa se enrolara começara a inchar.

Ao chegar à outra porta sentiu algo rachar dentro de si.

Devia ser a esperança, pois outra porta apareceu na escuridão.

Mas tão longe, tão longe que parecia um risco luminoso à quilômetros de distância.

Alex começou a andar o mais rápido que podia a perna ferida lhe causava câimbras dolorosas.

- Ah Meu Deus! – gritou ele.

Após mais de uma hora andando e arrastando a perna dura como um pedaço de pau chegou à porta.

Foi na hora certa.

A horda de seres rastejantes o perseguia de perto agora.

Com o corpo todo suado, Alex agarrou a maçaneta.

Como um chicote algo se agarrou em volta de seu peito.

O jovem se precipitou abrindo a porta com uma força derivada do desespero, mais por instinto, pois não nutria esperança alguma de sair daquele inferno tenebroso.

Caiu no chão do museu.

Ele ficou espantado porque não acreditava que sairia daquela cilada mortal.

Olhando apavorado para trás, ainda viu um tentáculo carnoso e escuro evaporar no ar.

Tirou a farda e a camisa rapidamente evitando que a gosma impregnasse sua pele.

Olhou para a perna.

No local onde fora atacado o tecido da calça sumiu; a carne da perna estava dura e amarelada.

Foi nesse instante que teve um sobressalto.

Ouviu claramente a voz de Olga. Na sala de Cotidiano e Sociedade.

- O que está fazendo nessa caixa querido? Que brincadeira é essa? – perguntou ela.

Com a perna doendo horrivelmente Alex levantou-se.

Atravessou o corredor tomado por um terror cego.

Abriu a porta que acabara de se fechar.

- Olga! Não abra a caixa! – berrou.

Ela estava com a tampa aberta e olhou para trás, sorrindo ao vê-lo.

- Ah! Você está aí não é?

A tampa se soltou de suas mãos e no instante seguinte ela desvaneceu no ar.

Alex viu sua noiva, o amor de sua vida sumir diante de seus olhos.

Mancou até onde estava a caixa, possesso, sua vontade era destruí-la.

Súbito ouviu a voz da moça que saia lá de dentro:

- Alex? Que brincadeira é essa?

O jovem segurança suspirou, sabia que não conseguiria sobreviver à outra jornada como aquela.

Sabia também que sozinha Olga não teria chance alguma.

Com uma lágrima nos olhos abriu a tampa.

E a escuridão se fez.

Fim

Humberto Lima
Enviado por Humberto Lima em 20/05/2007
Código do texto: T494566
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