Não Deixe o Bebê Com Fome!
 
           
As difíceis atribulações da vida me levaram a fugir da Metrópole indo buscar refúgio no remoto interior onde residia minha única irmã. Fiz dívidas de jogo e inimigos mortais, vindo a ser providencial ¨sumir¨ do alcance de qualquer GPS. Não sabia eu de uma lei escrita nas estrelas que determina a qualquer um que a fuga ao destino é impossível, mas era um ignorante nesses temas.

A pequena Vila em que ela vivia era tão remota que lembrava uma das antigas cidades do Tempo do Ouro incrustada em uma montanha de acesso perigoso. Senti-me de volta no tempo sabendo, depois que cheguei em um velho e apertado micro-ônibus, soube que nem celular pegava e o telefone fixo era raríssimo, restando alguns poucos privilegiados que acessavam via satélite o mundo exterior. Vi poucos automóveis sendo qualquer sinal de modernidade encarado como um tipo de sacrilégio por parte dos moradores.

A população do lugarejo vivia como se o mundo lá fora não existisse. Minha meio-irmã, por parte de mãe, relutou e praticamente tive que forçar minha estada. Aliviou-se um pouco ao oferecer-me para cuidar do seu bebê. Sempre muito nervosa, vestindo trajes de camponesa, cuidando de uma espécie de sítio que se pendurava no morro de modo incrivelmente íngreme, fui adaptando àquela vida afastada de tudo o que conhecia.

- Nunca deixe o bebê ter fome, dizia-me com sua voz rouca e irritada, ou pagará muito caro por isso!

Achava um exagero, mas como era um hóspede, aceitei-lhe a esquisitice.

Depois de 2 semanas, passei a estranhar meu sobrinho. Era um bebê lindíssimo, terno e meigo devendo ter cerca de 6 meses. O interessante é que ele não crescia. Mantinha-se sempre o mesmo e, foi em uma tarde, que certifiquei-me do assombro em que me metera.
Minha irmã iria ao centro da vila e, reiteradamente, avisou-me para alimentar o bebê a cada 30 minutos.
            - Trinta?
            - Exatamente. Sem tirar nem por! Posso contar com você?

Sem saber do que se tratava, deixou-me com aquela criatura de uma beleza incrível. Dei-lhe a primeira papinha e, a seguir, acabei cochilando na cama. Despertei em um pulo só, com meu sobrinho, sei lá como, tendo saído do berço e fincado em mim dentes que eu nem sabia que tinha. Encolhi-me no fundo do quarto gritando e, estupefato, pude ver meu pequeno sobrinho em pé, com as perninhas tortas encarando-me. Tinha um olhar terrível e sua fisionomia deformara-se. A boca se tornara comprida exibindo terríveis dentes. Feito uma fera, sem que tivesse tempo, avançou na minha direção mordendo com voracidade.

Atordoado, bati-lhe com toda a força, mas quanto mais o fazia, mais ele se enfurecia. Consegui sair do quarto ensanguentado trancando-o dentro. Ao me virar, cambaleando e quase desmaiando pela fraqueza, vi que minha irmã me olhava sorrindo maliciosamente. Sua boca também se deformara, parecendo-se mais com o aspecto de um focinho canino.
            - Não devia ter voltado pra casa irmãozinho, foi o que ela disse antes de, com uma força terrível, lançar-me contra a parede com uma única mão. A seguir, abriu a porta do quarto deixando o bebê sair. Ambos me olharam lambendo aqueles horríveis beiços ao que ela disse:
            - Veja meu Bebê que o Titio vai virar jantar...

Nisso, ambos vieram violentos contra meu corpo que se desmanchava diante daquelas vorazes dentadas certificando-me que ninguém, nunca, escapa ao seu destino...