MARTE ESTÁ PRÓXIMO

A mãe deliga a televisão afobada, o filho do meio reclama. Ela abre a geladeira como se abrisse a janela do quarto. A notícia aterradora é uma ameaça à vida no planeta: Marte está mais próximo da Terra. E porque não ouve o que os três filhos dizem, sai para a rua pisando alto, a cabeça nas nuvens. No céu a lua demora. Todos no carro, a mãe dá partida no carro como se na esquina um astronauta avisasse que não há mais tempo. Arranca, o motor abafa os protestos. "As luas de sangue" é sinal do fim dos tempos, Marte está mais próximo da Terra. O filho mais novo tira da lancheira seu lanche, oferece o sorriso mudo e uma maçã. A mãe fecha os vidros, tem olhos de sereia petrificada. Um celular toca, o filho mais velho diz "Alô, não! Estamos na Washington Luís agora (...) Não vimos nada disso, quando aconteceu? (...) O que? Tem certeza? Quantos morreram? (...) E vai acontecer de novo? (...) Mas isso... /

A luz do sol incide fria nas retinas apavoradas da mãe, "Nossa Senhora teria mesmo aparecido em Fátima?" O carro entra na contramão, um caminhão vermelho se aproxima, abre a boca e devora faminto os três filhos. Tudo é sangue, a mãe morre satisfeita por ter visto o fim do mundo de perto.