Gosto da paixão - DTRL 15
Sentado em sua poltrona, o escritor Fabiano Siqueira cochilava.
Na TV, um programa de perguntas e respostas que ele achava estar fora do ar há anos e o resto, era tão tedioso quanto este começo.
Se fosse há sete, oito anos atrás, quem sabe ele estivesse um pouco interessado na programação. Na época em que a TV parecia realmente fazer a diferença nas horas vagas. Mas agora não mais.
Agora era dormir ou escrever.
Só que deixar o televisor ligado, mesmo que para ninguém, ainda era vantagem. Evitava que a casa fosse dominada pelo silêncio, deixava tudo um pouco "vivo".
Só que de repente ele acordou, pelo sopro em seu pescoço, a interferência na TV.
Acordou com seu relógio apitando, bem na hora. A visita vinha chegando.
Levantou e foi até o banheiro. Lavou o rosto, arrumou o cabelo e pronto. Parecia não ter cochilado, estava desperto. Vivo.
A visita daquele dia era Mariana, mulher bonita e inteligente, de apenas vinte e três anos. Haviam marcado uma entrevista, a moça era estudante de jornalismo. Os dois se encontraram na saída do supermercado e a garota lhe parou, disse que era uma grande fã de seu trabalho e que era uma surpresa enorme dar de cara com ele. Fabiano, que não se considerava famoso, ficou surpreso, na verdade, abismado.
O escritor (Autor de livros sobre assassinos e grandes mistérios) conversou um pouco com sua fã, meio que sem jeito, já que não estava muito acostumado com aquilo e no fim das contas se saiu bem, ganhando a oportunidade de ser entrevistado.
Logo ele que imaginava não ter relevância nenhuma na pequena cidade onde morava. Logo ele que só escrevia para ele.
Mariana explicou que estava fazendo um trabalho da Universidade e que seria uma honra entrevistar uma pessoa que ela admirava tanto e que também tinha certeza de que todos de seu curso gostavam. Fabiano não conseguiu negar o pedido (aquilo era surreal!), e assim, tratou de marcar dia e a hora para o encontro. Naquela quarta foi para casa sorrindo.
Foram cinco dias de espera e nesse tempo, Mariana não saiu de sua cabeça. Ele sonhava com ela todas as noites e quando acordado, ficava imaginando como seria a entrevista, como seria ter aquela bela jovem sozinha em sua casa.
Enfim chegou a sexta e Fabiano ficou um pouco preocupado, por isso bebeu algumas doses de um uísque que há tempos fora esquecido. Depois sentou no sofá, ligou a TV (VIDA) e cochilou. Cochilou mas depois acordou.
E as incertezas ainda rondavam sua cabeça. Será que Mariana não acharia estranho o fato dele ter combinado a entrevista as nove horas da noite? Ou o fato dele ter preparado um jantar só para os dois, ou ter arrumado seu quarto, com a intenção de não terminar a noite sozinho?
Fora isso tinha o fato de seu último livro e também o mais vendido (5000 exemplares! Quase que um Best-Seller para um autor como ele), se chamar Encontros Noturnos e ter uma trama um tanto quanto sinistra. O livro contava a estória de um homem louco que saia com várias mulheres, e em casa as torturava e depois assassinava suas vítimas, acabando com todos os vestígios sem deixar rastros. Este psicopata era um escritor e as vitimas favoritas do mesmo, universitárias.
No seu ultimo livro, o monstro que destruía com as mulheres não era pego, Fabiano queria aproveitar o magnífico personagem, fazer outras estórias com ele, deixar um legado.
"De certo a garota não leu o último livro, foi por isso que ela não se preocupou em deixar o encontro para noite." Pensou e depois riu seco, enquanto enxugava o rosto e retornava a sala.
Decidiu que faria de tudo para deixa-la confortável, esse era seu plano. E depois, com a conversa ele conseguiria convencê-la a fazer alguma coisa. Sim, era bem assim. Fabiano doidinho, nervoso, pois aquele era o primeiro encontro seu há anos. Sem contar que estava quase esquecendo do que era ir para a cama com uma mulher.
E olha que ele não era um cara feio, muito menos burro. Mas o que lhe atrapalhava as vezes, era o fato de evitar a socialização. Não gostava de festas e de nenhum tipo de balada, só saia de casa quando necessário, ou seja, pagar as contas e comprar comida, tudo isso ele podia fazer em apenas um lugar, um grande supermercado que tinha perto de sua casa, o "Compre Aki".
A campainha tocou, Fabiano levantou-se e foi até a porta. Antes de abrir sondou pelo olho-mágico. Viu Mariana, em um belo vestido vermelho, não podia ser verdade, não mesmo, que tentação.
Sem entender abriu a porta.
- Boa noite, espero não estar atrasada.
- Não, não está - Disse babando - Entre. - A mulher entrou e Fabiano acompanhou com os olhos. Mariana tinha um corpo maravilhoso.
O homem levou a garota até a sala e pediu que ela sentasse. .
- O que foi? - Perguntou o homem que ainda estava abismado, enquanto Mariana lhe encarava.
- Acho que vamos ter que deixar a entrevista para outra hora.
- Como assim? Você não vai poder ficar? - Fabiano não entendia.
- Não é isso, hoje eu queria que fizéssemos outra coisa... Olha, tome isso.
A mulher entregou a Fabiano uma garrafa de vinho, o homem olhou, era um vinho fino. Compreendeu o que acontecia, mas no fundo sabia que era sorte demais, delírio demais.
- Muito obrigado. - Disse Fabiano.
Nem teve tempo para agradecer. Mariana partiu para cima dele, subiu em seu colo, lhe aplicou um beijo caloroso.
O homem achou que sonhava, só podia ser isso, pois para ele aquilo tudo estava bom demais.
- Sou sua maior fã, sua maior fã mesmo! - Exclamou Mariana enquanto o cobria de beijos.
Então a mulher ficou de pé e pegou a bolsa que havia trazido junto com o vinho, de dentro dela retirou cinco livros. De longe Fabiano reconheceu o material. Sua carreira como escritor estava nas mãos da mulher. Amor Maldito, O Caso Das Flores, Prazer Macabro, Sombras do Desejo e o mais novo, Encontros Noturno.
Mariana estendeu os romances em cima da mesa.
- Como você pode ver, eu tenho todos. - Disse a mulher sorrindo. – Trouxe os aqui, pois queria que você autografasse, seria possível fazer isso por mim. - A moça lhe encarava com uma expressão que deixou Fabiano cheio de desejo.
- Claro que sim, quer que eu faça isso agora? - Perguntou.
- Quero. - Disse a Mariana sorrindo.
O homem pegou uma caneta, e um a um assinou os livros, em todos fez uma dedicatória. Depois que assinou todos, ganhou mais beijos da mulher, os dois deitaram no sofá e Mariana quase tirou sua roupa. Só não passaram de uns amassos, pois a mulher parou novamente, olhou nos fundos dos olhos de Fabiano e repetiu com uma voz doce e suave:
- Sou sua maior fã...
Fabiano não iria aguentar, queria partir para cima dela, acabar com ela, estava carregado de tesão. Mas resolveu se controlar, precisava de calma.
- Eu preparei um jantar, consegue acreditar? - Falou o escritor sorrindo.
- Você é realmente demais. - Sussurrou a serpente.
Os dois foram até a cozinha, Fabiano mostrou tudo que havia feito, os dois sentaram-se e jantaram. Comeram bem, beberam toda a garrafa de vinho. Durante toda a ocasião, Mariana continuava dizendo que era a maior fã de Fabiano.
- Eu não acredito ainda que estou aqui, em um jantar com Fabiano Siqueira, um dos melhores escritores do Brasil.
O homem sabia que ele nunca seria o melhor escritor, mas gostava do fato de ter pessoas que pensavam assim.
- Que isso garota, sou eu quem está adorando tudo isso, eu já lhe falei o quão linda você é. - Conseguiu dizer apenas isso, pois no fundo, tudo era tao bom, que até gerava medo.
Terminaram de comer e voltaram para sala, lá pouco ficaram. Mariana pediu que ele lesse um dos trechos de seu último livro, um capítulo que ela adorava. Era uma cena onde o assassino descrevia como havia cortado os pedaços de sua última vitima. O louco cortava a mulher em várias partes, mas guardava seus olhos, pois achava que nunca havia visto olhos tão belos quanto o daquela mulher, segundo o monstro, a vítima tinha olhos de esmeraldas.
Fabiano terminou a leitura.
- Amo isso, é tão forte, tão doentio, mas ao mesmo tempo puro, sincero. - Disse Mariana.
O escritor apenas lhe encarou e ai resolveu tomar uma atitude. Pegou a mulher pelos braços e a levou para cara. Caíram juntos no colchão e assim Fabiano teve sua mais ardente noite de amor, foi incrível, tudo foi maravilhoso.
Quando terminaram já era alta madrugada, o homem olhou para Mariana deitada ao seu lado. Exausta, de olhos fechados parecia um anjo, puro e inocente.
Pensou em como aquela situação que em que se encontrava daria uma boa estória para seu próximo livro.
Encarou Mariana e teve diversos pensamentos perversos... Sim, em sua cabeça ele tinha uma ótima estória de tortura e morte. Mas tudo isso apenas em sua cabeça. Lá Mariana gritava, gemia, enquanto tinha todos seus órgãos retirados, enquanto a cama era lavada de sangue.
Deitou ao lado da bela mulher e fechou os olhos para dormir, também estava exausto. Mas antes de fazer isso, foi ate a sala e desligou a TV.
Ai dormiu, dormiu e sonhou os sonhos da perversidade.
Mas Fabiano não viu Mariana levantando. Não viu a moça sair da cama e caminhar até a cozinha.
Só foi acordado com o primeiro golpe que levou, mas não pode fazer nada, fui tudo tão rápido. Seus olhos abriram e logo se fecharam. A última cena que contemplou foi a mulher em cima dele, com a faca na mão, subindo e descendo, cravando várias vezes em seu peito.
O primeiro golpe acertará exatamente no coração de Fabiano e depois da sexta facada, o autor estava morto.
Com o homem sem vida, Mariana começou seu trabalho, estava realizando seu sonho.
Deixou todos os pedaços espalhados pelo quarto, não queria botar um fim naquilo tudo, queria mesmo é que desse a maior polemica. Já imaginava a matéria no dia seguinte:
"Famoso escritor de livros sobre serial-killer é encontrado despedaçado em sua própria cama. Cena digna de um de seus livros de Terror"
Daria a maior audiência, Mariana iria imortalizar o nome Fabiano Siqueira.
Concluiu o serviço, foi até o banheiro, tomou um banho, se livrando de todo aquele sangue. Depois retirou da bolsa uma pequena caixa e lá guardou dois embrulhos.
Entrou em seu carro e seguiu para longe dali. A anos estava no rastro de seu ídolo. Havia cruzado o país e a meses planejava a visita ao escritor.
Dias depois daquela aventura, quando finalmente chegara em casa e quando a historia de Fabiano Siqueira já era conhecida por todo Brasil, Mariana entrou no seu quarto e acendeu a luz.
Nas paredes contemplou todos os recortes e fotos que tinha de seu escritor favorito. Sentou-se na cama e retirou os livros da bolsa, leu mais uma vez cada dedicatória. Sentiu o maior prazer com aquilo tudo.
Sussurrava para os livros, para o nome estampado na capa destes:
- Sou sua maior fã.
Guardou os livros em sua estante e depois procurou pela caixa que havia comprado, era um pequenino baú, ela havia o deixado no alto de uma das prateleiras. Retirou outros dois objetos da bolsa e colocou o primeiro embrulho na pequena caixa.
O par de olhos, olhos de Fabiano. Que para ela eram verdes como esmeraldas.
- Meus! Só meus, pra sempre! - Falou a moça enquanto acariciava os dois olhos ainda sangrentos.
Fechou a caixa e guardou. Sabia que ninguém se interessaria pelo seu pequeno tesouro.
Sentou-se na cama satisfeita com a vida. Honrada, pois sabia que era uma verdadeira fã.
Abriu o outro embrulho e com uma fome fora do normal, comeu o coração de seu ídolo. O órgão tinha um gosto curioso, Mariana não sabia descrever, mas era paixão.