Eu sei quem veio no meu enterro (Parte 2)

Já estava quase anoitecendo quando Raul acompanhado de Rosbife chegou ao cemitério em busca do coveiro para extrair algumas informações.

- Olá, seu coveiro. Desculpe o incômodo a esta hora, mais eu e meu amigo aqui estamos fazendo um trabalho escolar, cujo tema nada mais é que: "Qual a condição que encontra os túmulos da sua cidade" - Rosbife ameaçou soltar uma gargalhada, mais antes foi interrompido com um tapa nas costas por Raul, que o abraçou pra disfarçar a situação -. E pra isso – continuou -, precisamos saber qual a próxima cova a ser 'inaugurada', já que a professora quer que façamos um teste pra saber daqui a cinco anos qual o estado que o túmulo vai se encontrar. Não é mesmo Eduardo? - perguntou Raul com olhar fixo lançando para Rosbife como quem quisesse dizer: “Você tá fodido se estragar nosso plano”.

- É, é isso mesmo seu coveiro - respondeu Rosbife se segurando para não rir.

O coveiro era um sujeito um tanto quanto estranho, tinha um olho menor que o outro a lá Tom Yorke vocalista do Radiohead, uma cicatriz que escorria do olho direito até a superfície do lábio esquerdo, aparentemente causado por uma faca. E simplesmente com uma cara desconfiada disse apenas:

- Ali está - e apontou para as duas covas que acabara de construir.

Quando caminhavam até as covas, Rosbife soltou a risada que tanto queria sair da sua barriga saliente.

- Essa foi demais, como ele pôde ter caído nessa. Confesso que você é mesmo um cara muito prático.

- Isso se chama improviso meu caro. E tudo estaria por agua abaixo a baixo se você risse na frente dele. Mas mesmo assim, obrigado pelo prático. – se convenceu um e o outro deu de ombros.

Já diante das covas Raul percebe que o projeto sinistro dele começava ganhar força quando nota duas árvores perto da cova que seria sepultado.

- Veja Ros, perfeito. Vamos, pegue as câmeras.

Eles então verificam se não tem ninguém, e vendo que o coveiro sumiu do ponto de vista deles, ambos sobem as arvores e amarraram as micros câmeras no sentido da cova e descem. Rosbife testa as imagens e no monitor fica tudo perfeito.

- Primeiro passo foi dado, agora vamos encontrar o remédio cardíaco - agitou-se Raul.

Anoitecia quando voltavam entre os túmulos, e certo medo começou a brotar nos meninos. Raul e Rosbife ainda estavam muito longe do portão do cemitério quando viram uma luz bem à frente que conforme se aproximavam mais forte a luz ficava.

- O que será isso Ros?

- Deve ser o coveiro ou o guarda com a lanterna - Duda disfarçava o medo.

- Não cara, a esta hora o coveiro está em sua casa assistindo Zé do caixão, e neste cemitério não existe guarda lembra? – Raul advertiu.

- Tem razão - concordou Rosbife. - Veja que a luz vai ficando maior e mais forte conforme chegamos perto do...

- Necrotério - ambos falaram em coro olhando um para o outro!

- É claro! A luz vem exatamente de lá, como podemos ter esquecido? – Raul ficou inconformado.

- Mas porque alguém deixaria a luz do necrotério acessa agora?

- O necrotério não tem hora para abrir, já que não existe hora para morrer. Só pode ser a autopsia de algum morto.

- Mo mo morto - gaguejou de medo Rosbife.

- Isso mesmo! Venha – o travesso puxou o medroso, - vamos fazer uma visitinha ao meu futuro vizinho e ver o procedimento que eu vou receber quando meu corpo estiver na mesa.

- Calma aí, ficou louco? – Duda se soltou.

- Você decide – continuou Raul -, ou me acompanha ou vai embora sozinho na escuridão entre os infinitos túmulos a chegar ao portão do cemitério – tentou fazer a cabeça.

- Ok, sua chantagem barata me convenceu. Vamos logo, antes que eu mude de ideia. – decidiu o gordinho e Raul assentiu malicioso com a cabeça.

A porta do necrotério estava encostada e os meninos que tentava orgulhosamente esconder o medo um para o outro não perderam tempo e entraram antes que fosse tarde.

- Qual a probabilidade de dois garotos de quatorze anos conseguirem entrar em um necrotério de noite onde não se encontra ninguém além de um cadáver? – perguntou Rosbife curioso.

- Hum, digamos que uma em um milhão – Raul respondeu incerto.

Antes de verem o corpo que estava coberto com um pano branco, os meninos atrevidos procuraram primeiro pela ficha mortuária para saber qual a causa da morte do sujeito. A ficha mais recente era de um senhor, José Bonifácio, com seus 65 anos havia sofrido um infarto.

-Que Deus o tenha! – sensibilizou Rosbife enquanto Raul manteve o silencio.

-Já que estamos aqui vamos dar uma bisbilhotada no corpo e caímos fora.

-Tudo bem, afinal o morto não deve estar tão mal assim já que não foi nenhum acidente externo. Não é mesmo? – observou Rosbife meio hesitante.

-É sim – Raul respondeu duvidoso.

Entretanto quando caminhavam com certo receio até a mesa onde permanecia o cadáver, os meninos sem hesitar puxaram com tudo o lençol sem imaginar ou sem ter lido na ficha que o falecido era doador de órgãos, de tal modo que os fez se depararam com um corpo visceralmente aberto, com coração, pulmões, rins, intestinos, estômago totalmente expostos. A autópsia não tinha sido concluída.

-Oh! Que horror – se repugnou Rosbife saindo dali.

-Realmente isso é muito nojento – concordou Raul cobrindo de volta o corpo e acompanhando Eduardo.

-Acho que nós nunca devíamos ter vindo aqui – resmungou Rosbife. – Podia ter ido embora quando tive a chance. Antes encarar um cemitério sozinho de noite do que um corpo e suas entranhas horrivelmente nojentas.

-Já chega Duda. Foi mal, me desculpa por isso tá. Agora vamos sair desse cemitério que amanha o dia promete.

-Ufa, achei que ainda queria correr atrás do remédio cardíaco.

-Não, não, hoje foi um dia e tanto – Raul abraçou Rosbife e ambos saíram até o portão do cemitério tão exausto que nem o medo fez mais questão de aparecer.

-Não vejo a hora de chegar em casa tomar um banho e descansar, mas sem antes desfrutar uma bela panela de macarronada com queijo e um litro de refrigerante.

-Porque todo gordinho só pensa em comer – zombou Raul.

-Melhor pensar em algo saudável do que em ideias bizarras – devolveu Rosbife.

-Ei Ros, pelo amor de Deus, quando eu “morrer” depois de amanha lembre-se: EU NÃO SOU DOADOR DE ÓRGÃOS – os dois começaram dar risadas saindo finalmente do cemitério.

Continua...Abç

Dan Will
Enviado por Dan Will em 09/03/2014
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