A Pinhata

Ali estava a pinhata, pronta para ser quebrada. As crianças corriam em volta, aos brados:

- Bate! Bate logo para as coisas caírem!

Todas rindo, correndo, com os braços erguidos em volta da pinhata.

O pai do aniversariante terminava de venda-lo. Entregou o porrete a ele e girou-o para que se desorientasse e o soltou.

- Mais pra esquerda! - gritou um amigo

- Mais pra direita! - gritou outro

- Vem pra direção da minha voz, vem logo! – gritou uma amiguinha.

- Tá quente! - indicou outro

- Não tá não. Tá frio, sempre tá frio. - protestou um maiorzinho.

- Shhh cale a boca e não estrague a brincadeira. – retrucou a menina

E o menino vinha com seu porrete encrustado de lâminas.

- AÍ, AÍ TÁ A PINHATA. VAI, BATE NELA! – Gritou a menina em êxtase.

O menino respirou fundo, deu impulso nos braços e bateu. Uma chuva rubra salpicou o rosto das crianças que riam felizes, esperançosas.

- Bate com mais força, para as coisas caírem! - disse um amigo sardentinho.

E veio mais uma chuva rubra, muito mais intensa. As crianças riam como se não houvesse amanhã e os pais se deleitavam com a alegria de suas crias.

Outra porretada. E aí as coisas caíram.

As crianças se lançaram para cima das tripas penduradas, puxando por todo lado. Algumas enroscavam em seus pescoços, outras trançavam nos pescoços dos amigos, nos braços. Uma chegou a pular corda com uma parte dos 10 m de intestino que pendiam de dentro do homem. Outras brincavam de cabo de guerra. Algumas colocavam na cabeça, como se fosse uma longa mecha de cabelo.

- Bate mais, Adriano! Bate mais para as outras coisas caírem! - gritou um garoto extasiado.

- Não, não. – respondeu o pai do aniversariante

- AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH POR FAVORZIIIINHO DEIXA A GENTE BRINCAAAAAAAAAR... – disse o coro de crianças

- Não. Já brincaram bastante. Agora vão se divertir com outra coisa. Ano que vem tem mais.

Cabisbaixas as crianças pararam suas brincadeiras e saíram procurando outra coisa a se fazer.

- O bom de ser criança é isso, né? Elas simplesmente brincam e depois largam a sujeira toda pra nós adultos limparmos... É ótimo ver eles se divertindo, não acha? - disse o pai do aniversariante a um convidado adulto que estava próximo enquanto enrolava o intestino pendurado, como se fosse uma mangueira.

- Com certeza. Quer ajuda aí pra se livrar da Pinhata?

- Ah, quero sim.

E assim desceu-se a pinhata arrebentada, com seu destino cumprido