A VOLTA DO MUTILA MIJÃO

A VOLTA DO MUTILA MIJÃO

Jorge Linhaça

Ele espreita em cada esquina, buscando a vingança para o seu calvário.

Entre as ladeiras e pelas avenidas, mistura-se aos desavisados foliões que não acreditam em sua existência. Aguarda pelo momento certo, pela ocasião mais propícia para efetuar o seu ataque, evitando que outros venham a ter o mesmo destino que ele.

Foi num carnaval como este que sua vida começou a esvair-se de seu corpo por conta dos mijões mal-educados que infestam os festejos carnavalescos, fazendo das ruas em muros os seu banheiros públicos, pouco se importando com a falta de higiene e a possiblidade de espalhar doenças.

O Mutila mijão é atraído pelo cheiro fétido da urina, pelo aroma da amônia que se espalha no ar, que fareja como um cão de caça treinado.

Vítima que foi desse hábito hediondo, sofrendo por semanas as consequências de uma infecção que se alastrou por seu corpo, causada pela mistura de mil mijos, de mil foliões bêbados encharcados de suor e cerveja, veio a óbito cerca de uma semana depois de um carnaval.

Sua alma, carregada pelo desejo de vingança, não encontrou descanso no mundo do além e hoje ele retorna, materializado apenas na época das festas de rua, para executar a sua revanche contra quem ouse desafiar a sua existência.

Seu corpo delgado, quase esquelético e pálido como uma vela , mistura-se à multidão, coberto com uma mortalha, como fosse ele um elemento esquecido dos antigos carnavais.

Ali, misturado em meio aos blocos ou aos pipocas que seguem os trios-elétricos, o outrora folião procura pela vítima da vez, seja homem ou mulher.

Não demora muito para que sua presença seja atraída por um grupo que se dirige a um canto qualquer para despejar ali o excesso de suas bexigas.

Os pobres coitados não tem nenhuma chance, como um Wolverine tupiniquim, as unhas do mutila mijão se estendem na forma de garras mais afiadas que navalhas e, em movimentos certeiros e velozes, decepam os pênis de suas vítimas, misturando sangue e urina em um riacho rubro que escorre pelas ruas.

As vítimas se contorcem de dor e de horror ao verem seus membros amputados misturarem-se ao riacho já descrito. Há quem procure resgatar, apesar da dor atroz, o símbolo de sua masculinidade, agora extirpado de sue corpo.

E lá se vai o mutila mijão mais uma vez atraído por aquela força invisível para outro ponto onde algumas mulheres executam o mesmo ato de aliviar-se na via pública, as garras do Mutila Mijão retalham suas vulvas encharcadas formando disformes massas de carne ensanguentadas entre as pernas das porcas foliãs.

E assim prossegue a saga de nosso anti-herói, mutilando, extirpando, decepando membros e genitálias durante todo o reinado de Momo.

Acautelem-se, pois, aqueles que desprezam os banheiros químicos pela preguiça de caminharem até eles, acautelem-se aqueles que acham que a rua é banheiro e que nada pode interromper a sua folia, pois o Mutila mijão espreita e fareja, e pode ser que o próximo seja você.