Maria Eugênia- Primeira Parte
Jorge, um advogado em início de carreira, alugara aquela bela e ampla casa por um ótimo preço. Era um sobrado encantador, ensolarado, com garagem para dois carros, jardim, piscina e um grande quintal onde árvores frutíferas davam sombra. Helena sua esposa também estava encantada. Aquele seria o lugar ideal para Marina, a filha de 6 anos do casal. Lá ela teria espaço de sobra para brincar e ter uma infância saudável.
Na verdade, a família ficava pouco em casa. Jorge trabalhava o dia inteiro no escritório que dividia com um colega, Helena era professora e dava aulas em dois colégios, e Marina, após sair da escola ia para a casa da avó, até que os pais fossem buscá-la. Ela estava na primeira série, e aprendia a ler rapidamente.Por volta das oito da noite, em geral, a família chegava em casa, e então Helena dava início a uma outra jornada de trabalho doméstico, fazendo o jantar, pondo roupas para lavar na máquina e depois estendendo-as. Era por causa dessa rotina corrida que o casal estava adiando a vinda do segundo filho, embora o desejassem.
Era somente nos finais de semana, ou por acaso em algum feriado que a família podia desfrutar de sua nova casa. Fazia calor e a pequena Marina se divertia muito na piscina, correndo pelo pátio e subindo nas árvores. Seus pais queriam que ela tivesse uma infância de verdade, como fora a deles, e não a perdesse diante da tela de um computador.
No segundo final de semana após a mudança, Jorge iniciava o fogo na churrasqueira quando ouviu exclamações de alegria de Marina. Logo a menina surgiu com um gato nos braços.
- Pai, olha só o que eu achei! - disse ela toda feliz.
Jorge aproximou-se e examinou o felino. Na verdade era uma fêmea, como atestava o nome gravado na coleira que ela tinha no pescoço. Maria Eugênia.
- É uma gata, Marina, explicou. - Aqui está escrito o nome dela. É Maria Eugênia. Onde você a encontrou?
- Ali, - respondeu a menina apontando para os fundos do pátio. - Posso ficar com ela, pai? Por favor, por favor!
- Filha, ele deve ter dono. - disse o pai. - Deve pertencer a algum dos vizinhos.
- Ah, deixa, pai! Olha só como ela gosta de mim...
Marina pusera a gata no chão e ela se enroscava em suas pernas ronronando.
Helena apareceu nesse momento, de maiô e canga.
- Que gato é esse? - perguntou.
- É uma gata - disse Jorge. -Maria Eugênia. Marina quer ficar com ela, mas é óbvio que tem dono...
- Ah mãe, deixa eu ficar com ela, deixa! - implorou a pequena.
- Então vamos fazer o seguinte - tornou Jorge. - Ela pode ficar, mas se o dono aparecer, temos de devolver, ok? Combinado? Não se esqueça disso, filha.
- Obrigada pai, te amo! - disse Marina, e foi sentar debaixo das árvores levando sua nova amiguinha.
Helena fez um gesto de dúvida.
- Isso não vai dar certo. - falou. - Marina vai se apegar a ela e depois, se tiver de entregar vai ser um drama.
Jorge sorriu.
- Se isso acontecer, a gente adora outra. - concluiu.
O churrasco ficou delicioso, e Maria Eugênia ganhou um pedaço, que saboreou com voracidade. Era uma gata sem raça definida, mas grande e muito bonita. Tinha o pelo sedoso, malhado de branco, preto e amarelo, olhos cor de âmbar, e era muito mansa e carinhosa. Mais tarde, Jorge saiu para comprar um pacote de ração, e à noite improvisou uma cama para a gata na garagem.
Como os dias passavam e ninguém apareceu para reclamá-la, Maria Eugênia foi ficando. Ganhou uma linda caminha cor de rosa, em forma de coração, que Marina escolheu para ela no pet shop. O veterinário que a examinou disse que a gata tinha cerca de 5 anos de idade, era saudável e nunca dera cria. Ela se revelou muito meiga e apegada a Marina, e logo passou a dormir no quarto da garota.
Certa noite, Marina acordou e viu que a gata não estava em sua linda caminha. Levantou-se, procurou, ela não estava no quarto. Então Marina a ouviu miar no corredor. Abriu a porta. Maria Eugênia estava na escada, e seus olhos brilhavam como dois cristais na penumbra.
- Maria Eugênia, vem dormir! - disse a menina.
A gata miou outra vez e começou a descer as escadas. Encarava Marina, como se quisesse que ela a seguisse.Marina desceu as escadas chamando sempre pela gata. Jorge e Helena estavam mergulhados num sono profundo e não acordaram. Maria Eugênia atravessou a sala correndo e parou diante da porta, miando sempre e olhando para Marina. A pequena, com dificuldade, conseguiu abrir as fechaduras, e a gata mergulhou na noite, sempre seguida pela menina.
O vento da madrugada estava frio e Marina, apenas de camisola e descalça, abraçou o próprio corpinho com os braços. Maria Eugênia se dirigia para os fundos da casa. Havia luar, mas entre nuvens, e chegando nos fundos do quintal, em meio às árvores agitadas, Marina viu que havia alguém lá. Um menino mais ou menos da sua idade, muito pálido e chorando, ajoelhado sobre um montinho de terra.
- Quem é você? - ela perguntou ao menino.- Porque você está chorando?
- Eu sou o Lucas. - ele respondeu com voz trêmula. Estou chorando porque a minha gata morreu e eu sinto muita falta dela. Vim trazer flores pra ela.
- E como é o nome dela? - tornou a pequena?
- Maria Eugênia!
CONTINUA