A vida como ela é

A vida como ela é

A vida costuma pregar algumas peças conosco. Você pode culpar o diabo, seu deus ou até você mesmo, mas a verdade é que a grande criadora de nossas problemas é a vida. Entendo que existe uma grande números de pessoas que acreditam que a sociedade é a grande causadora de tudo, mas isto é um assunto do qual não vou aprofundar agora. Não tenho tempo para isto. E tenho diversas provas de que a vida está por trás de tudo. Recentemente perdi meu emprego e não tenho muito o que fazer da. Passo o dia na internet tentando achar algo interessante para me entreter. Meus pais dizem que estou ficando louco e que preciso de ajuda o quanto antes. Dizem isto somente pelo fato de eu ter uma paixão pelo macabro e as coisas ocultas existentes em nossa volta. Só que existem certas coisas que não podemos ignorar. Principalmente quando a vida nos mostra as opções, ela costuma ser dura com aqueles que rejeitam suas oportunidades. Você pode me achar um conspiracionista e talvez eu realmente seja, mas como já disse, não há tempo para explicações. Vou rapidamente narrar os fatos que se seguem.

Estava eu procurando algo legal para ler na internet. Gosto de terror e coisas do tipo. Um dos blogs que eu visitava bastante estava cheio de postagens sobre a deep web e esse assunto já estava mais do que saturado. Eles repetiam sempre as mesmas informações, como se todo mundo já não estivesse careca de saber. O problema é que não era somente este blog, mas todos que eu tinha conhecimento! Nada mais novo, apenas histórias sobre os perigos da deep web e também uma praga que vinha infestando o terror na internet há séculos. Chamada creepypastas. Ô negocinho chato, hein! E era cada história sem enredo e sem graça que dava vontade de atirar o computador pela janela.

Durante minha busca no Google, lá pela terceira página, encontrei algo um tanto quanto interessante. Um site em português chamado “A vida como ela é.” Uma indagação surgiu em minha mente. Afinal, pelo link e título, não aparentava tratar-se de algo sobre terror. Por um breve momento pensei em ignorar aquilo, mas como dizia minha avó, a curiosidade matou o gato. Cliquei e um estranho calafrio subiu pelo meu corpo. O site era mal feito, havia um fundo azul claro e uns títulos com caracteres indesejados. As postagens, em sua maioria eram vídeos do Youtube. Cliquei em um deles e começou a rodar imagens de famílias felizes e sorridentes. Como naqueles comerciais de margarina. Depois de passado quase um minuto de duração as imagens tornaram-se obscuras. O cenário agora era as mesmas casas, mas era noite e não havia sinal de nenhum membro das famílias.

Imagens externas. Janelas, portas e portões. Curiosamente todos estavam destrancados ou abertos, como se houvesse um convite para alguém entrar. Enquanto assistia eu tinha certeza de alguém estava observando aquelas pessoas. Era o fotógrafo, mas não um fotógrafo comum. Ele planejava algo. O vídeo ficou por uns 30 segundos fixado na imagem de portas das casas apresentadas anteriormente com uma música de fundo. Aquela música fez meu coração gelar. Achei ter ouvido algo na cozinha, na parte de baixo de casa, mas talvez tenha sido apenas impressão minha. Eu era um cara um tanto quanto medroso.

A imagem mudou e o que vi me deixou completamente aterrorizado. Queria fechar aquilo, desligar o computador, mas eu não conseguia me mover. Meus olhos lacrimejaram e um ar frio tomou conta do meu quarto. As paredes pareciam verdadeiros blocos de gelo. No monitor podia-se ver aquelas mesmas pessoas das imagens anteriores, mas agora as fotos estavam em preto e branco e não eram nada semelhantes a um comercial de margarina. Havia pedaços do intestino de alguém espalhados pela mesa da cozinha, corpos na sala e na escada. O do pai estava com um grande corte na barriga, provavelmente o intestino da mesa da cozinha era seu. O curioso era que todas as imagens tinham um mesmo padrão. Quem fez aquilo era minucioso e detalhista. Eram poucas as diferenças nas imagens, até as casas eram um tanto quanto parecidas.

Agora eu ouvia passos na escada. Dei um pulo da cadeira e comecei a tremer. Olhava diretamente para a porta do meu quarto e jurava que havia a visto naquelas imagens. Seja o que for que estava perseguindo aquelas famílias, tinha vindo me buscar também. Talvez estivesse me observando há semanas e só agora resolveu atacar. O pensamento disso me fez chorar como uma criança assustada. E porra, eu realmente estava assustado! Era a minha vida que estava em jogo, afinal. Lembrei de ter visto uns barulhos no quintal durante a semana passada. Geralmente iniciava-se por volta das 21hrs. Eu fiquei muito assustado depois que meus amigos que dividiam o aluguel comigo haviam se mudado. Era como se eles tivessem saído e uma estranha presença tomou seus lugares. E agora essa presença estava prestes a me pegar.

Os passos estavam cada vez mais perto. Corri para o vão que existia entre o roupeiro e a parede. Estava escuro e lá ninguém iria me enxergar. Agora eu soluçava e sentia minhas mãos tremerem muito. O que quer que estivesse do outro lado daquela porta era humano, disso eu tinha certeza. Se fosse uma criatura sobrenatural já teria me buscado há muito tempo. Um forte estrondo atingiu a porta. Apertei forte meus olhos. Vozes desconexas gritavam do outro lado, não conseguia entender o que diziam. A porta se abriu com um estrondo e minha reação foi partir para o ataque, corri em direção ao monstro e de repente tudo se tornou escuro.

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Após ver os horrores que havíamos encontrado no porão, corremos para o quarto do monstro que estava lá em cima. Uma pessoa que teve a capacidade de desmembrar os seus colegas podia muito bem ter preparado uma armadilha para nós. Seguíamos lentamente pela casa. Lembro de ter recebido uma ligação anônima na delegacia. Era uma senhora que deveria ter uns 65 anos de idade. Dizia ter ouvidos gritos durante a madrugada na semana passada. Fora acordada por eles. Depois sentiu um cheiro estranho vindo da casa ao lado. Não bastava o horror que estávamos enfrentando com um serial killer na cidade e agora tínhamos um adolescente maluco.

Com a cabeça nas nuvens acabei por derrubar uma panela que estava em cima da mesa da cozinha. Fui repreendido por olhares ferozes de meus colegas. Seguimos pela escada até alcançarmos o andar superior. Uma luz fraca vinha de baixo da porta do quarto no final do corredor. Tudo indicava que ali estava o assassino. Gritamos umas cinco vezes para que ele se entregasse, prometendo não haver violência. Não obtivemos resposta. Então chutamos a porta até abrir e em menos de um segundo vi uma sombra do que um dia fora um jovem saudável jogar-se contra mim. Não hesitei e disparei quatro tiros. Todos entre seu peitoral e sua barriga. Ele caiu de joelhos e, chorando, me olhou no fundo dos olhos. O que ele disse nunca mais irá sair de minha cabeça. “A vida fode com todos nós. Olha o que ela fez comigo!” Logo depois soubemos que ele tinha problemas mentais, mas isso não conseguiu tirar esta frase de minha cabeça.

- Santo Deus! Borges, veja isto. - meu parceiro havia me chamado. Estava de frente para o monitor do computador do louco. O que vi era aterrorizante. Ele estava sorridente, uma expressão de completa felicidade ao lado dos corpos mutilados das famílias assassinadas recentemente na cidade. Havíamos matado dois coelhos com uma cajadada só. Chamamos o IML e ficamos mais algumas horas naquela casa que havia sido palco para um verdadeiro filme de terror.

Horas depois, estava tomando banho em casa e tentando tirar aquilo de minha cabeça. Não tinha jeito, as imagens não sairiam tão cedo. Ouvi uma discussão que parecia vir da sala. Desliguei o chuveiro e me enrolei a toalha na cintura. Ao chegar no cômodo meu estômago se revirou.

- O que você fez? - minha mulher estava completamente ensanguentada e com uma faca de cortar carne nas mãos. No chão, os corpos dos nossos dois filhos tornaram-se irreconhecíveis. Agora eu já a segurava pelos ombros e sacudia seu corpo.

- Por que fez isso? - gritava entre lágrimas.

- É a vida. Ela fode com todos nós. Olha o que ela fez comigo! - não reparei no momento, mas seu notebook encontrava-se aberta em um site chamado “A vida como ela é.”

Walter Frank
Enviado por Walter Frank em 19/02/2014
Reeditado em 12/07/2018
Código do texto: T4697253
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