Criaturas da Noite- parte 4

Criaturas da Noite – 4

Jorge Linhaça

João saiu do trabalho, passou em casa, tomou um banho, perfumou-se e saiu em busca de alguma aventura. Escolheu um point que lhe indicaram, montou em sua moto e acelerou em direção ao seu destino.

Há muito havia adquirido o hábito de andar armado, temeroso da violência que assolava a cidade. Havia adquirido sua moto há pouco tempo, comprada em várias prestações com as quais iria conviver por um bom par de anos.

Era hora de finalmente comemorar, de preferência na companhia de uma bela mulher que lhe cruzasse o caminho esta noite. Sexta-feira era dia de caça e ele estava saindo para caçar.

Ao longo do caminho fantasiava planos, imaginava como seria sua parceira, como a abordaria, para onde iriam terminar a noitada e como ela seria terminada.

Mas o destino tinha outros planos para ele.

Chegou, ao tal lugar, todo perfumado, bem vestido e sua moto reluzindo de nova. Chamou a atenção logo em sua chegada, os olhos de alguns se voltaram para ele, atraídos pelo ronco da moto.

Adentrou o recinto e acomodou-se em uma mesa de onde podia observar todo o ambiente. Uma bela morena se olhos claros, pele sedosa e corpo e corpo e corpo exuberante logo atraiu seus olhares.

Estava sentada com algumas amigas, bebericando uma cerveja enquanto olhava disfarçadamente para o nosso personagem. A troca de olhares se tornou mais frequente e logo a abordagem teve seu lugar.

Aproximou-se da mesa das meninas após haver instruído o garçom a servir mais uma rodada às garotas, com a instrução de que este o identificasse como o benfeitor.

A morena ergueu o copo saudando-o e essa foi a senha para o próximo movimento. Pediu para sentar-se com elas e foi atendido.

Apresentaram-se e o clima com a morena parecia ir esquentando, sorrisos trocados, linguagem corporal, tudo indicava o interesse mútuo e que a noite prometia agasalhar o novo casal sob o seu manto.

A decepção veio a seguir. Após um telefonema qualquer, as moças se mostraram aflitas e despediram-se em bloco, deixando-o a ver navios, emputecido da vida.

Perdeu logo o humor e decidiu que era melhor procurar algum outro lugar para fazer uma nova tentativa.

- Lá fora, o mal espreitava seus movimentos, sob os olhos do , criminoso que o escolhera como sua fonte de renda da noite.

Subiu em sua moto, acionou-a e partiu, perdido em seus pensamentos, com a adrenalina aflorada após o insucesso com a morena escultural.

De início não deu atenção a uma outra moto que o seguia, achou que era apenas uma coincidência, depois de desviar da rua principal começou a ficar alerta com o seu aparente perseguidor. Tratou de deixar a arma à mão, pois, já havia tido seu prejuízo da noite.

A moto emparelhou e o cara anunciou o assalto, ele acelerou já com a arma em riste e começou a troca de tiros. As motos mal tocavam o chão ziguezagueando pelas ruas, os tiros perdiam-se atingindo o que quer que fosse pelo caminho. Sentiu sua perna receber um impacto, continuou atirando e logo viu o seu inimigo no chão. Parou a moto adiante, retornou, viu que o sujeito ainda respirava e tentava mover-se, sua raiva era tão grande, frustrado em seus planos, vitimizado pela violência da cidade que não teve dúvidas, chegou perto, fez a mira e estourou os miolos do safado, que espalharam-se pelo asfalto...

Ao longe ouvia sirenes, tratou de apanhar a modo e sair dali. Foi quando percebeu a perna sangrando, havia sido baleado mas no calor da descarga de adrenalina nem havia se dado conta até então.

Deu umas voltas para se calmar e depois seguiu para o hospital mais próximo. Aguardou o atendimento enquanto via entrar outro baleado, vitima de balas perdidas de um tiroteio ali perto.

O cara estava mal, entubado, sendo atendido para não morrer. A mulher estava com ele, chorava copiosamente e rezava sem cessar.

A alma de João pareceu encolher-se, sentiu-se, agora, além de vítima um algoz. O terror de imaginar que aquele homem desconhecido pudesse ter sido atingido por seus disparos em sua fuga alucinada era algo congelante, paralisante. Já não imaginava mais a morena, já não importava mais a moto novinha. Seu coração, apertado no peito, e a sua mente a parecer gritar: Assassino...Assassino...não lhe davam trégua. Não se lembrava mais de a quanto tempo não rezava, mas começou a implorar a Deus pela vida do desconhecido.

Não teve coragem para mais nada, não conseguiu sequer se apresentar para a esposa do pobre diabo que lutava entre a vida e a morte. Assim que foi medicado, tratou de ir embora, rezando e suplicando a Deus que o aliviasse do fardo de ser cumplice em tirar a vida de outro ser humano.

A morte rondava seus passos, mas ainda não era sua hora.