O Retorno de Kauane Início
Aquele seria o dia mais feliz da vida de Ronaldo!
A igreja toda enfeitada, lotada de parentes e amigos, naquele sábado lindo
de sol onde ele selaria sua união com Kauane, sua namorada de toda a vida... ela adentrava agora a porta da igreja, uma noiva deslumbrante num vestido de noiva todo bordado, conduzida por seu pai, o véu arrastando pelo chão, uma linda grinalda de flores na cabeça. Como os dois haviam sonhado com aquele momento! E agora se tornaria realidade...
Um doce perfume emanava do buquê de flores naturais que Kauane levava, e entregou a Babi, irmã de Ronaldo. Os dois se ajoelharam no altar. Sorriam um para o outro, fascinados. Ronaldo nunca vira Kauane tão linda, os grandes olhos negros faiscantes, as duas covinhas adoráveis no rosto, os fios de cabelo negro adornando a fronte. Então, no momento em que o padre fez a pergunta que os uniria para sempre:
- Srta. Kauane de Oliveira, aceita receber o sr. Ronaldo Barcelos como seu esposo?
Nesse momento Kauane tombou desmaiada, para o espanto e desespero de todos! Ronaldo, aflito, a carregou para a sacristia, onde tentaram em vão reanimá-la. Então foi levada para o Pronto Socorro, onde após um rápido exame o médico de plantão deu a inacreditável notícia.
- Infelizmente não há mais nada a fazer, ela está morta. Aneurisma cerebral...
- NÃOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
O grito de dor de Ronaldo ecoou por todo o hospital. E assim, um dia que seria de luz e festa transformou-se num sombrio dia de lágrimas e desespero. Autópsia, caixão, velório... a desolada mãe de Kauane disse que ela deveria ser enterrada com seu lindo vestido de noiva, pois escolhera o modelo e o tecido com muito carinho, durante muito tempo.
Ronaldo, em estado de choque, tinha a impressão de que nada daquilo era real. Teve a derradeira visão de Kauane, linda em seu sono eterno, mais bela que nunca,, vestida de noiva, no momento de sair o enterro. Mas não conseguiu beijar seus lábios gelados e pálidos... após o enterro, seus pais e amigos o rodearam, mas ele pediu para ficar sózinho.
- Quero ficar a sós com meus pensamentos. - pediu. - Não se preocupem, não vou fazer nada contra mim mesmo. Somente preciso estar só nesse momento... confiem em mim.
Horas se passaram, e Ronaldo, perambulando em volta do cemitério onde jazia Kauane, perdera a noção de tempo. Anoitecera e ele continuava por ali, ora chorando de cortar o coração, ora rindo histericamente, sem acreditar no que acontecera. Mas, não saía de perto do sombrio cemitério onde dormia sua amada...
Perto dali havia uma pracinha. Ronaldo deixou-se cair em um dos bancos, cedendo ao cansaço, ao jejum e à dor. Sentia-se sujo, roupa grudada de suor, a barba crescida. De olhos fechados, não percebeu que havia mais alguém ali.
- Boa noite! - cumprimentou o homenzinho gordo e simpático, vestido com um terno preto e usando um cravo vermelho na lapela.- Posso ajudá-lo?
Ronaldo pousou seus olhos vermelhos e inchados no desconhecido. Deu uma risada amarga.
- Ajudar? Não, senhor, ninguém nesse mundo pode me ajudar... a não ser que o senhor tivesse o poder de trazer os mortos de volta.
O estranho homenzinho sentou-se ao lado de Ronaldo.
- E se eu lhe disser que posso fazer isso?
Esse velho deve ser louco, pensou Ronaldo.
- Não, rapaz, não sou louco, nem estou mentindo. - disse o outro, como se tivesse lido seus pensamentos. - Eu sei que você perdeu sua mulher para a morte, e o quanto está sofrendo por isso. Se você quiser, eu posso sim trazê-la de volta. Mas ela viverá apenas para você, para os outros, continuará morta...
Ronaldo começava a se interessar por aquela estranha conversa.
- Trazer Kauane de volta? Mas... quem é você? Um bruxo? Um demônio?
O homenzinho riu-se.
- Ora, meu caro, isso não importa... quer ou não sua amada de volta?
- É tudo o que eu quero. - respondeu Ronaldo com convicção. - Para isso, estou disposto até mesmo a vender minha alma...
Os olhos do desconhecido brilharam.
- Feito! Então, só precisamos esperar que o relógio bata três horas da manhã. É o horário mais apropriado para despertar sua amada. - consultou o relógio de pulso. - Falta pouco... onde ela foi enterrada?
- Aqui mesmo, nesse cemitério...
- Então, vamos até lá?
Entraram os dois no cemitério envolto em profunda escuridão, e seguiram pelas alamedas desertas. Kauane fora enterrada num antigo túmulo de família, bem aos fundos.
- É aqui que ela está. - disse Ronaldo, parando diante de um jazigo coberto de coroas ainda frescas. Ao ver a sepultura, começou a chorar.
- Só mais um pouco de paciência, rapaz! - disse o homenzinho. - Antes de fazermos o ritual, preciso lhe explicar algumas coisas.Porque Kauane voltará a viver, mas não exatamente como antes...
CONTINUA