Noivado no Cemitério
Ricardo era um rapaz de origem humilde, que ajudava seu pai numa venda que tinham à beira da estrada, lá pela época da Segunda Guerra Mundial, no século passado. Mas era bonito, boa pinta, como se dizia na época, e atraiu a atenção de Cecília, a moça mais rica da cidade, filha do prefeito. Os dois se encontravam às escondidas, e Cecília dizia sempre que o amava e iria largar tudo, família, nome, sua honra, para ficar com ele. Ricardo a amava muito e queria a todo custo fugir para se casar com ela, mesmo sabendo de todas as dificuldades que teriam de enfrentar.
Com muito sacrifício ele juntou uma certa quantia e conseguiu comprar um anel simples, de ouro, com uma pequena safira azul. Ele pretendia entregá-lo a Cecília naquela noite e selar o noivado dos dois. Durante muito tempo esperou no local ermo onde costumavam se ver, e nem sinal da moça. Intrigado, e sem ter quem mandasse um bilhete, Ricardo resolveu ir sorrateiramente até o palacete onde cecília morava, tentar vê-la e saber o que estava acontecendo.
Chegando lá, se deparou com uma grande festa, salões iluminados repletos de convidados, e soube que naquele dia se realizara o casamento de Cecília com um um primo rico da capital. a moça brincara com ele o tempo todo! Humilhado, e tomado do mais negro desespero, Ricardo saiu correndo pela noite, sem rumo, e acabou entrando no cemitério. Ia chorando, correndo, até que atingiu os fundos da necrópole, e se ajoelhou por entre umas árvores antigas, que sussurravam ao vento... olhando em volta, viu os jazigos enegrecidos pelo tempo e percebeu que estava no assim chamado Cemitério dos Alemães, pois ali eram sepultadas as famílias de origem germânica do local.
Chorava muito, pensava em suicídio, em ir embora para sempre daquele lugar... por que Cecília o enganara daquela maneira? Então fora um mero capricho da moça rica? Nesse momento, o luar saiu de trás das nuvens e iluminou uma sepultura próxima. Um retrato antigo e amarelado chamou a atenção de Ricardo. Era uma moça muito jovem, de traços delicados, o cabelo preso em duas tranças louras no alto da cabeça. Um nome e duas datas. Leopoldine Weiss, 1878-1900.
De repente Ricardo lembrou do anel que tinha no bolso da camisa. Num gesto de desilusão e amarga tristeza, jogou-o sobre o túmulo de Leopoldine, dizendo em voz alta:
- Toma, seja você a minha noiva! Eu tomo a todas as almas aqui presentes como testemunhas de que te escolho por minha esposa, você que devia ser boa e pura, não uma cobra como aquela outra!
E assim dizendo, o rapaz saiu correndo do cemitério e voltou para casa, cheio de amargura e dor. Durante alguns dias pensou em morrer; mas com o tempo foi se conformando. Cecília fora morar com o marido na capital e ele não a veria mais.
Certo dia lembrou-se do anel que deixara no cemitério, e voltou lá para pegá-lo. Lá chegando, nada encontrou. Lembrou do que dissera a Leopoldine aquela noite, olhou demoradamente a foto, e era mais bonita do que ele se lembrava. Decerto alguém roubou o anel, pensou Ricardo, balançando a cabeça e indo embora.
Naquela noite, em seu quarto, Ricardo foi acordado por uma voz feminina, que o chamava. No primeiro momento pensou que fosse sua mãe. Mas não, a voz parecia vir do lado de fora da casa, era doce como o som de uma cascata, murmurante...
- Ricardo... Ricardo...
- Quem é? - ele perguntou em voz alta, levantando-se.
- É Leopoldine... sua noiva... - respondeu a voz de mulher. - chegou o dia do nosso casamento...
Ricardo começou a tremer e suar frio. Seu terror chegou ao máximo quando ele viu uma mão delicada e vaporosa de mulher, com o anel de safira no dedo anular, atravessar a parede... seus olhos escureceram... e ele caiu fulminado no chão.
FIM