A Ninhada

A luz ofuscante da sala de parto refletia-se nas paredes brancas. Após outra contração violenta, Maria de Fátima deixou escapar um grito e desabou, exausta, sobre a mesa. Ah, aquele suplício não tinha mais fim... ela já perdera a conta do tempo que se prolongava aquele martírio. Ser mãe era algo que nunca lhe passara pela cabeça... até que engravidara.

O mais angustiante, o pior de tudo é que Maria de Fátima não sabia como engravidara, jamais estivera com homem algum, era virgem. Era uma jovem bonita, mas de temperamento retraído, que sempre vivera isolada numa propriedade rural com seus pais, tratando de bichos e plantas, sonhando um dia ir para a cidade e prestar vestibular para Veterinária... Maria de Fátima sempre tivera por todas as espécies de animais um amor especial. Retorceu-se noutra contração alucinante. A compassiva Irmã de Caridade, que era a parteira do pequeno hospital, enxugou com uma toalha sua fronte orvalhada de suor.

Os cabelos ruivos da moça estavam grudados de suor. As contrações eram cada vez mais frequentes, agora falta pouco, minha filha, consolou-a a boa religiosa. Que ironia, pensou Maria de Fátima em meio ao seu tormento. Uma mulher que escolhera nunca ter filhos passava a vida colocando no mundo os filhos dos outros...

A jovem parturiente sempre fora arredia aos seres humanos, repelindo possíveis namorados que se atraíam por sua beleza. Sua gravidez fora um completo choque para seus pais, e mais ainda para ela, era virgem. NÃO SE LEMBRAVA DE NADA. Teria sido estuprada e com o trauma bloqueado as lembranças? Era a única explicação...

Nova contração, a Irmã procurava entrever a cabeça do bebê entre suas pernas abertas. Maria de Fátima tentou puxar o ar para dentro dos pulmões. Em seu dia a dia na fazenda, seu maior amigo e companheiro era Rex, o grande pastor alemão que criara e a seguia por toda a parte, pelos campos, nos banhos de cachoeira, e que à noite dormia em seu quarto, no tapete ao lado da cama. Rex... então, como se a lembrança dele lhe desse forças para terminar com aquela agonia, Maria de Fátima respirou fundo e fez um movimento forte de expulsão.

Então foi que aconteceu uma coisa insólita... a freira recuou horrorizada, fazendo o sinal da cruz. Maria de Fátima inclinou-se tentando ver seu filho que finalmente nascera, ouvir seu choro. Mas, o que ouviu foram débeis ganidos... e uma bonita ninhada de seis cãezinhos pastor alemão capa preta, sobre o lençol ensanguentado.

FIM

NOTA: História contada por uma pessoa de meu conhecimento, embora se saiba que tal fecundação é impossível.

Maryrosetudor
Enviado por Maryrosetudor em 10/02/2014
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