O Beijo da Morte

O Beijo da morte

Jorge Linhaça

A linda dama se aproxima pálida, evanescente e silenciosa.

Eu, na cama, sinto seu estranho perfume a me seduzir de uma maneira diferente, inesperada.

Despe-se de seu manto negro e revela um corpo de formas suaves, delicadas, sensuais.

Seus olhos negros são como imas que me atraem para satisfazer todos os seus desejos.

Meu corpo prepara-se para o encontro, uma ânsia me devora a alma, um desejo incontrolável de possui-la e de ser possuído por ela.

Aproxima-se calmamente, como uma amante que sabe o que faz, seduzindo, fazendo da espera um momento de aflição incontida, de expectativa pelos seus beijos, pelos seus carinhos.

Sinto seu toque estranhamente frio em meu corpo, um toque suave que me faz tremer e arrepiar. Toca-me como uma amante delicada, sem pressa, sem presunção.

Aqueles olhos negros penetram nos meus, me levam de volta à minha juventude, percorrem lugares , ocasiões, momentos diversos numa velocidade vertiginosa. Revejo amigos a muito perdidos, revejo amores há muito esquecidos. Alegrias e tristezas num sucessão aleatória, atemporal, descontinuada como Pulp Ficcion.

Passado e presente se alternam, imagens que vem e que vão, mesclando memórias que julgava perdidas.

A dama percorre meu corpo com seu toque de cetim, as pontas dos dedos são como plumas sobre a minha pele, sinto uma sensação estranha, uma leveza que não posso explicar.

Seu rosto agora se aproxima do meu, seus lábios me convidam, pergunto seu nome e ela responde sussurrando algo que não consigo entender.

Aqueles olhos negros, profundos; aquela boca provocante que me atiça os sentidos... Aqueles lábios que se aproximam dos meus para depois de afastarem, como uma promessa que jamais se cumprirá.

Eu paralisado, sem ação, sem ter como toma-la em meus braços e cobrar o beijo prometido.

E nessa tortura, ao mesmo tempo doce e amarga, passam-se os minutos, minutos que parecem uma eternidade. Meu coração dispara dentro do peito, como que recobrando o vigor de minha juventude de esportista.

Finalmente o beijo, um beijo memorável, de literalmente tirar o fôlego, o fôlego da vida.

Abro os olhos e vejo meu corpo na cama, inerte, sem vida enquanto pairo no ar.

A dama de olhos negros toma-me pela mão, e finalmente compreendo sua frase sussurrada:

Meu nome é morte! Está na hora de vires comigo.

“Os olhos dela são negros,

Como a noite sem luar,

Conhece-me os segredos,

Me seduz e tira medos

A morte vem me beijar”