Pé na lata

Domingo à noite. Fazia muito frio.

Depois de várias doses de “submarino” no Bar do Alemão, resolveu partir. Pagou a conta e, encolhido sob o casaco, saiu a passos trôpegos pelo Largo da Ordem, onde as poucas prostitutas que resistiam ao frio que fazia naquela noite em Curitiba, esperavam por clientes que as levassem para um local qualquer e aconchegante.

Ele simplesmente olhou-as. Seguiu, tentando cantarolar uma antiga canção (Sunday Bloody Sunday) da banda U2.

Dobrou uma ruela deserta naquele momento, quase que cambaleando, e avistou uma lata no meio do caminho. Deu-lhe um ponta pé. A lata bateu na parede de uma antiga construção e ecoou. Pulou, como se comemorasse um gol.

Silêncio.

Teve a sensação de estar sendo observado. Olhou em volta e nada viu.

Deu mais dois passos. Sentiu novamente aquela sensação.

Suspirou fundo, pois já tinha ouvido boatos sobre o tal “Vampiro de Curitiba”. Teve medo.

O álcool da bebida parecia ter evaporado de seu organismo naquele momento. Ficou estático.

De repente algo acertou-lhe o peito. Caiu.

Tentou olhar em volta. Ninguém. Ouviu alguns murmúrios e risadas.

Preso. Não conseguia se mover.

Sentiu seu braço direito sendo arrancado sem nada poder fazer. Ouviu então um forte barulho.

Acordou.

Tinha apenas cochilado na mesa do bar.

Levantou-se, pagou a conta e saiu a caminhar no ar gélido que fazia naquela noite.

Algumas prostitutas o convidaram a se divertir. Ignorou-as.

Sem perceber, dobrou uma rua deserta. Mais três passos e parou. Avistou a lata no caminho.

Apenas um sonho! - pensou.

Chutou-a e comemorou o gol.

Silêncio.

Nada viu. Mas ainda teve medo.

Caiu.

Algo tinha o acertado no peito.

A criatura faminta arrancava agora seus braços, vísceras, e dilacerava sua face.

Não pode mais gritar.

Conseguiu ainda ver a criatura.

Sorriu, pensando na tal lenda do vampiro.

Morreu. Passara por algo pior e inimaginável, e não poderia contar a mais ninguém.

wagner andreatta