As Crônicas do Fim do Mundo - O fim está próximo
Acho que já enrolei demais.
Está na hora de lhe contar o final. Não sei se você quer saber.
Nem sei se irá ler.
Não gosto de me lembrar desses dias.
Mas já que comecei. Terei que terminar.
Boa leitura!!
Passei a mão na escrita. Realmente era de giz.
Isso significava uma coisa.
Nara passou por aqui.
Abri a porta e uma luz muito forte entrou no pequeno cubo. Cegou-me por alguns instantes. Quando voltei a enxergar. Levei um susto.
Era um parque de diversão.
Crianças correndo.
Mães brigando com seus filhos.
Casais apaixonados.
Homem que vende pipoca.
Homem que vende balão.
Mulher mais ou menos bonita na barraca do beijo.
Fiquei transtornado. Pensei – desde quando o mundo inferior tem um parque de diversões? Nos dias que fiquei aqui nunca encontrei nada além de salas de tortura e prisões – andei pelo parque, porém ninguém me viu.
Não conseguia tocar em ninguém.
Fui avançando pelo parque. Roda gigante estava toda iluminada.
A montanha russa um pouco enferrujada.
Os carrinhos de choque eram todos da mesma cor azulada. Exceto um.
Era branco e preto. Não sei o motivo, mas sabia que deveria entrar nele.
Caminhei até o carrinho. Que por sinal pareceu mais distante do que eu imaginava. A espada e o escudo estavam pesando demais. Estava com medo. Muito medo.
Sentei no carrinho. E ouvi o apito. O brinquedo começou a funcionar.
Várias crianças estavam controlando os carrinhos.
Uma delas chamou minha atenção. Um menino com cabelo por cima dos olhos. Era eu quando tinha cinco anos. Minha respiração começou a ficar acelerada.
Ele estava vindo para cima de mim. Aumentou a velocidade.
Sorriu.
Fechei os olhos.
Abri os olhos.
Tudo estava escuro. Não conseguia enxergar um palmo diante de meus olhos.
Gritei.
Nada de eco.
Senti algo respirando perto do meu corpo. Uma vela se acendeu.
E na pequena claridade da vela apareceu um rosto.
Estava a cinco centímetros do meu.
Fiquei sem nem uma reação.
Era minha mãe.
- Mãe é você? – Ela não respondeu. Ficou olhando atentamente para meus olhos.
Deu um grito muito alto. Fechei os olhos e tampei o ouvido. Achei que iria ficar surdo.
O grito parou.
Abri os olhos.
*Hades estava brincando comigo. Estou no território dele.
Aqui ele faz tudo que quer.
Como poderia vencê-lo?*
Agora sim estava no mundo inferior que conheço. Pedras por todos os lados. Era como se fosse uma caverna enorme. Nunca fez frio e nem calor. Nem dava para sentir o vento. Um grande mar vermelho com criaturas – monstros - inimagináveis. E uma pequena ponte de madeira que atravessa esse rio e iria direto ao trono de Hades. Vi ele ao longe. Com seus cabelos negros e longos. Olhos totalmente pretos. Unhas grandes
E uma capa preta.
Olhei para o lado e quase vomitei. Vi Nara presa na pedra. Estava em forma de cruz. E desacordada.
Uma lágrima escorreu dos meus olhos.
Tentei ficar mais confiante. Mal conseguia sentir minhas pernas.
A espada e o escudo estavam pesando demais. Fui até o inicio da ponte.
Quando me aproximei da entrada da ponte vi um velho na frente. Fiquei olhando para ele por alguns segundos.
- Meu filho. Se você quer passar por essa ponte terá que responder uma pergunta.
Pensei – como assim? Estou em uma aventura de Rpg agora? – olhei com desconfiança.
- Qual o propósito disso senhor? – Ele nem olhou para mim.
- Saber se você está preparado para enfrentar Hades. – senti um arrepio na espinha.
- Mande a pergunta senhor. – tentei parecer ser mais confiante do que realmente estava.
- O homem que me inventou não me quer. O homem que me comprou não vai usar. E o homem que me usa não me vê. O que eu sou? – Oh god. Apenas pensei isso. Minha cabeça parecia que iria explodir. Até notar que eu já tinha visto isso em um livrinho de charadas que minha tia comprava. Obrigado tia.
- Você é. O caixão.
Silêncio por alguns instantes.
- Muito bem meu filho. Pode passar. – o velho homem saiu da frente e entrei na ponte.
A cada passo. Um arrepio novo.
Hades não tirava os olhos de mim.
E também não falava nada.
Ele podia muito bem quebrar a ponte aquela hora.
Mas não o fez por que era muito orgulhoso.
Depois de passar pela metade da ponte. Não conseguia mais olhar para frente.
Não conseguia ver Hades me encarando.
Comecei a olhar para baixo. Também não era nada agradável.
Uma queda de mais de vinte metros. Com monstros famintos.
Era isso ou encarar os olhos pavorosos de Hades.
Pensei – queda e monstros, por favor.
Quando faltavam apenas alguns metros para o final da ponte. Raios e trovões começaram a ecoar. Não sei da onde vinham.
Apenas barulhos. Monstros começaram a gritar lá embaixo.
Presumi que Hades estava tentando me deixar psicologicamente abalado. E o pior.
Ele conseguiu.
Estava a dois passos de sair da ponte quando olhei para frente. Hades está me encarando no final da ponte.
Estávamos muito perto. Seus olhos totalmente negros olharam diretamente para mim. Por um momento achei que ele estaria lendo minha alma. Se isso fosse realmente possível.
- Olhe só o que sua traição causou a sua cidade – então com um estalo de dedo surgiu fogo de sua mão. Mas dentro do fogo dava para ver uma imagem.
A minha cidade estava toda destruída. A imagem se movimentou.
Era ao vivo.
Quase não consegui olhar.
Casas destruídas. Carros pegando fogo.
Gente correndo.
Mortos se levantando.
O céu negro.
Uma lágrima escorreu dos meus olhos. Minha fúria cresceu.
A espada e o escudo ficaram um pouco mais leves.
- Por que você fez isso Hades? – Falei com muita raiva. Ele apenas riu.
- Você me traiu. Fez tudo isso por amor. Você realmente acredita no amor Will? – Quem era ele pra falar de amor?
- Você é o Deus do mundo inferior. Hades. O que saberia sobre amor?
- Sei muito mais sobre isso do que você. Jovem menino. – eu realmente estava tendo uma conversa sobre amor com o Deus do mundo inferior. Para mim tudo isso estava sendo uma piada.
- O que você pode saber sobre amor? Se a única coisa que faz é torturar os homens? – Ele apenas riu.
- Você realmente acha que não sei nada sobre amor? Então por que não pergunte a sua mãe? – então com outro estalo de dedo outro fogo apareceu. Esse era maior. A imagem era outra. Minha mãe presa em uma barra de madeira e com chamas em seus pés.
-Mãe! – Gritei, mas foi apenas o que conseguir fazer. Hades com outro estalo cessou o fogo – O que você fez com a minha mãe?
- A pergunta certa seria. O que ela fez comigo. MEU FILHO – Hades fez questão de gritar essas duas últimas palavras. Eu apenas arregalei os olhos e não consegui falar mais nada. - Ou você acha que os deuses não vão para a terra e se apaixonam? Casam-se? Eu e sua mãe tivemos um lindo caso de amor. Até ela engravidar de você e me largar para ficar com um mortal qualquer.
Minha raiva aumentou. Como ele poderia falar um negócio desses só para me abalar? Era óbvio que era mentira.
Já estava ardendo de raiva.
A espada e o escudo ficaram mais leves.
Apertei o punho da espada e apontei para Hades.
- Te desafio para um duelo. Se eu ganhar você liberta minha mãe e Nara. Se eu perder. Você pode usar a alma de nós três para virarmos seus escravos. – A raiva era tanta que nem me dei conta do que estava falando. Só agora relembrando isso tudo que noto como fui imprudente.
- Você acha que pode salvar todo mundo se me derrotar? Já começou Will. Você quebrou a barreira do mundo inferior com a Terra. Não adianta mais fazer nada.
O FIM ESTÁ PRÓXIMO.
A última frase ele berrou tão alto que a ponte balançou.
Cai.
Enquanto estava caindo no rio dos monstros só conseguia pensar em uma coisa.
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Nos olhos castanhos de Nara.