HEMOFAGIA ( 1 )

HEMOFAGIA

Jorge Linhaça

Madeleine era uma bela senhora de aproximadamente seus trinta anos de idade. Cabelos negros e pele clara, lábios carnudos e sedutores e um olhar profundo capaz de se entranhar nas profundezas da alma de quem ousasse encarar seus olhos cor de mel.

Vestia-se de forma a delinear as curvas de seu corpo e enfatizar os encantos de suas formas perfeitas.

Não havia muito tempo que se mudara para aquela pequena cidade e raramente era vista a circular pelas ruas.

Instalara-se em um grande e antigo casarão colonial que permanecera fechada por décadas ali nos arredores da cidade.

A mudança fora feita por uma empresa contratada, que cuidara inclusive da decoração interna e do paisagismo, de modo que Madeleine não fora vista senão depois de já estar devidamente instalada. Chegara discretamente, em uma noite de agosto.

Claro que isso, aliado à curiosidade dos nativos, passou a dar origem aos mais diversos comentários e teorias a seu respeito.

Havia quem garantisse que ela era uma viúva rica que, abalada com a perda de seu amado, havia buscado refúgio longe da grande cidade.

As versões sobre a morte de seu suposto marido iam desde um trágico acidente até o assassinato, consequência de um sequestro relâmpago.

Não faltava quem imaginasse que ela própria havia envenenado o marido, supostamente anos mais velho, para apropriar-se de sua fortuna.

A verdade é que Madeleine era absolutamente avessa a comentar sobre sua vida pregressa, nas raras vezes em que saia de casa, fazia-o no início da noite e apenas o tempo suficiente para fazer as suas compras.

Os próprios vizinhos raramente a viam e os diálogos com ela não passavam de um cumprimento casual e alguma observação sobre o clima.

Os homens da cidade cobiçavam a sua beleza diferente, não havia um só deles que não parasse para admirá-la quando cruzavam o seu caminho.

Claro que as mulheres da cidade percebiam isso e, como sempre acontece nessas ocasiões, sentiam-se ameaçadas pela misteriosa concorrente.

Os boatos sobre a nova habitante da cidade foram ficando cada vez mais maldosos. Não faltou quem imaginasse que ela era uma prostituta de luxo que havia amealhado fortuna fazendo programas com ricos empresários, políticos e artistas.

A própria maneira de vestir-se, algo próximo do gótico, criara nas beatas locais o hábito de fazerem o sinal de cruz cada vez que a viam.