As Crônicas do Fim do Mundo - O Cemitério, O Anel da Vida e o Amor.
Há alguns dias eu tive que fazer uma escolha que não só mudaria meu destino. Como mudaria o destino de toda a humanidade. Meus dias na terra acabaram e teria que devolver o anel da vida – não importa o que aconteça, você sempre irá viver enquanto estiver usando o anel - para o túmulo onde o mesmo deveria estar enterrado. Se não fizesse isso? Os mortos retornariam a vida e “viveriam” no mesmo plano que os vivos. Isso tornaria o mundo um caos. A decisão parecia fácil não é? Devolve logo o anel e deixa os vivos em paz. Mas não era tão fácil assim. Tinha Nara, meu amor, meu sonho. Minha paixão. Nos dias que retornei a vida encontrei um amor que nunca tinha encontrado. Não daquelas paixões de alguns dias, e sim um amor puro e raro de se encontrar. Eu não queria deixá-la, mas também não queria deixar que o mundo entrasse em caos. Quer saber o que fiz? Vou contar para você, mas lembre-se que não me arrependo de nada.
Acordei-me de um pequeno sono, dormi acho que umas duas horas. Olhei para a janela e vi um dia muito lindo. O céu estava azulado com algumas nuvens tão brancas quanto à neve. O calendário, atrás da porta do meu quarto, marcava Doze de Outubro. O dia que faleci. O dia que retornei a vida, que conheci Nara. O dia que deveria devolver o anel. Tudo isso nos últimos três anos. Lembro-me bem ainda de cada uma delas. Há um ano quando retornei a vida minha missão era simples. Hades, Deus do mundo dos mortos, me pediu para voltar à vida e impedir que alguns vivos cometessem suicídios. Completei minha missão. Agora apenas deveria colocar o anel da vida em seu devido lugar. Apenas. Mas Nara, meu sonho, meu amor. Vivemos dias tristes e alegres. Sorrisos e Lágrimas. Dividimos tudo, não tinha como ficar sem isso. Foi uma das piores escolhas que eu já tive que fazer.
Desci as escadas da minha casa e preparei um achocolatado. E pela primeira vez não consegui tomar tudo. Minha cabeça estava um turbilhão, nem respondi as sms de Nara. Afinal uma despedida seria a última coisa que eu queria. Liguei a T.V e comecei a assistir um filme chamado “A Escolha da Vida”. Pensei – que irônico – e não conseguia prestar atenção no filme. Olhei para o dedo e lá estava o anel. Resolvi sair de casa antes que Nara me procurasse ali.
Cheguei ao cemitério e fui até o túmulo onde deveria ser enterrado o anel. No fundo do cemitério. Encostei o anel na lápide e o caixão surgiu da terra. Abri e encontrei o esqueleto e logo olhei para os dedos. Ainda tinha dois anéis sobrando, significava que tinha mais dois mortos por ai além de mim. Comecei a pensar em Nara e lágrimas começaram a cair. Sem pensar muito – pois se pensasse iria desistir – tirei o anel e coloquei no esqueleto. Estava feito. Já comecei sentir meu corpo perder forças. Olhei para a estrada e vi Nara indo em direção a minha casa. Corri atrás dela. Corri. Meu corpo estava sumindo.
- Nara. Nara. Nara. – gritei desesperado, a toquei, mas minha mão a atravessou. Olhei seus olhos castanhos, seus cabelos negros com tons de roxo. Sua pele lisa. Seus lábios pequenos e doces. Juntei o que sobrou da minha energia e corri até o cemitério. Fui até a lápide e comecei a desenterrar com as minhas mãos. Minhas forças estavam indo até que senti a tampa do caixão. Abri e olhei os anéis. Chorei e sabia que estava fazendo besteira. Mas até onde devemos ir em nome do amor? Peguei dois anéis, um eu coloquei no meu dedo e outro guardei no bolso. Fui até minha casa.
Cheguei lá e Nara estava batendo na porta. Quando ela olhou pra trás ficou surpresa.
- Will, onde você estava – Sorri para ela – Estava resolvendo uns problemas.
- Estava preocu... – Não a deixei completar a frase. Levantei a mão com um gesto para ela ficar em silêncio e me ajoelhei. Procurei o anel no meu bolso. Peguei.
- Nara. Quer namorar comigo?
Enquanto os olhos dela brilhavam. O céu tinha ficado negro. O vento estava forte. Os túmulos estavam rachando. E os mortos estavam se levantando. As pessoas estavam correndo. O caos estava chegando. Mas nada disso importava, pois eu estava ao lado de Nara.