SEQUESTRO MACABRO
 

Era terça-feira à tarde. Depois de um tempo ele foi até a sala de estar para zapear. Não sabia dizer que programa era aquele. O eloquente apresentador continuava...
"Corta pra mim: filha de empresário sequestrada em estacionamento de Shopping de São Paulo ainda não foi encontrada, mostra o local do carro abandonado, meu filho...cadê a motolink?"
Bruno continuou zapeando e parou em outro programa policial... a mesma notícia:
"Na tela, me ajuda aí, ta virando um caos morar nessa cidade, assim não dá governador, cadê o prefeito?  o cidadão de bem sai de casa e não sabe se volta, os bandidos deitam e rolam, a jovem sequestrada é filha de empresário..."
Bruno ficou vendo o desenrolar da notícia, curioso ele se perguntava: por quê não? Como será sentir essa adrenalina, deve ser gostoso ter essa sensação de poder. Manter a vítima em cativeiro, causar o terror psicológico, a incerteza de sair viva, a angústia, o medo nos olhos, a aflição de não poder fazer nada diante do pavor, sem a possibilidade de fuga. A televisão dando total cobertura e destacando nos noticiários que a moça era filha de empresário...e se ela não fosse a polícia investigaria com a mesma dedicação?
"...O carro blindado foi abandonado na periferia da cidade e não apresenta marcas aparentes de violência, segundo a polícia, há fortes indícios de crime premeditado, ainda não houve contato pedindo o dinheiro do resgate...câmeras do estacionamento serão analisadas..."
Bruno percebeu uma coisa: O policial de terno estava se achando o máximo dando entrevista para a TV, ele era "o mocinho" da história...
 "Nós policiais estamos indignados, usaremos todos os meios para prender esses marginais pelo crime hediondo. Em questão de horas esses bandidos serão presos..."
 
 
Bruno não conseguiu dormir. Pensou em tudo, seria seu primeiro sequestro. Por motivos de segurança faria tudo sozinho, ele não confiava em ninguém. Já tinha em mente quem seria a vítima. Conferiu os detalhes da abordagem e condução discreta para o cativeiro. Elaborou o plano como se fosse um profissional, com muita cautela. Separou as "ferramentas" necessárias para a prática do crime. O ataque seria de surpresa, provocando espanto, assim a refém estaria vulnerável, amedrontada e indefesa com o efeito psicológico do plano diabólico.

Dois dias depois, Bruno realizou o sequestro com sucesso. Pela primeira vez ele sentiu algo novo, era como se ele fosse o senhor da situação. Alertou a vítima sobre a tentativa de chamar a atenção. Se irritou com os movimentos desesperados e a inquietação. Descartou o pedido do dinheiro do resgate para a família. Só pensava na tortura, mutilação e até na degola se a capturada tirasse ele do sério. Três dias se passaram e nada nos noticiários da TV sobre mais esse sequestro. Ele zapeava os programas policiais todas as tardes para manter-se informado.
 
 
Dona Maísa saiu na janela do seu quarto no piso superior pra ver seu filho brincar no quintal. Mas uma coisa a deixava intrigada. Do outro lado da rua aquela casa velha, com aparência de abandonada causava um certo medo. Quase ninguém via o novo morador. O sujeito era sinistro, mantinha portas e janelas fechadas, o  jardim um horror, descuidado e o mato tomando conta ao redor. À noite, ela notava o facho de luz num dos quartos. Mais estranho era o carro importado na garagem; nunca saia de lá. Alguma coisa estava errada. Certo dia, por trás da cortina com o binóculo de brinquedo do filho de sete anos, ela anotou a placa do carro.

Numa madrugada de insônia lá foi dona Maísa até a janela, com a luz do quarto desligada, viu o automóvel entrando todo apagado. O homem abriu o porta-malas tirou o volume pesado ajeitou nos ombros e entrou na casa. O pânico a fez imaginar mil coisas, mas não acordou o marido. Pela manhã ligou para a polícia passando o número da placa do carro.
 
Várias viaturas chegaram ao local com sirenes ligadas, helicópteros sobrevoando as proximidades, policiais desceram com armas em punho. Bruno apavorado correu até o cativeiro, não sabia o que fazer. Ele queria dar um jeito, estava cercado sem rota de fuga e nem bolou a medida estratégica do plano B, foi o seu pior erro, "a casa tinha caído". Dona Maísa olhando de binóculos o movimento na rua viu seu filho preocupado no quintal com algo esquisto na mão, logo descobriu e gritou o nome completo do filho. E quando a mãe chama pelo nome completo "...segura na mão de Deus e vai". Ela correu escadas abaixo com o chinelo na mão, pegou o menino pelo braço e começou a bater por sílabas. Quem nunca apanhou por sílabas da mãe? 
JÁ.NÃO.TE.FA.LEI.PRA.PA.RAR.DE.BRIN.CAR.COM.FOR.MI.GAS? Cada sílaba era uma chinelada na bunda. Engole o choro, engole o choro...
me dá esse vidro BRUNO GUSTAVO DE ANDRADE...O garoto de sete anos segurando o choro e muito assustado entregou o vidro de maionese tampado com a formiga dentro. Maísa destampou o vidro, colocou no chão e a formiga saiu livre em disparada para o jardim. Fim do sequestro.
 
Os policiais invadiram a casa da frente.  O carro importado era produto de roubo. O morador, conhecido traficante foragido foi imobilizado e preso.  A grande quantidade de armas, munições e drogas encontradas no porão no fundo de paredes falsas foram encaminhadas para o DP.
 
O castigo de Bruno:
Uma semana sem  jogar Playstation e sem assistir TV.
No quarto, deitado na cama de castigo Bruno ficou olhando para o teto se lamentando, queria descobrir qual dos amiguinhos imaginários teria avisado "a polícia..."
No alto dos seus pensamentos, bem no canto ele viu uma aranha com a teia armada esperando a presa... e o menino ficou maquinando como seria se uma mosca pousasse na teia ...bolou outro plano.
 
 
 
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Alberto SL
Enviado por Alberto SL em 28/11/2013
Reeditado em 15/05/2014
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