LENDA URBANA- A MALDIÇÃO DO PAI DE SANTO
Quando o Clidão morreu, um corvo pousou na cumeeira da casa dele e ficou lá até que o corpo foi transladado para o cemitério. Não faltou quem dissesse que a agourenta ave era uma sentinela do capeta, que estava guardando a alma do miserável, para evitar que alguém a roubasse. Outros disseram que o corvo empoleirara ali atraído pelo cheiro do cadáver. Pois o Clidão era, já em vida, diziam, mais podre do que uma carcaça no lixo.
De fato, o cara era mesmo uma tranqueira de marca maior. Dizem até que batia na mãe quando ela não tinha mistura para por na marmita dele. Bater na mãe por falta de mistura é um dos pecados preferidos do diabo, dizem. É pecado que Deus não perdoa e não tem advogado, por melhor que seja, que consiga redução de pena no inferno para o cara que faz um negócio desses. Lá no Piauí, dizem, tinha um cara assim. Ele era um cabra ruim que batia na mãe, e um dia, de ruindade, acabou matando a pobre velha. Antes de morrer ela amaldiçoou o filho ingrato, rogando uma terrível praga nele. Que ele, depois de morto, ia ficar com uma cabeça enorme, do tamanho de uma cuia, dessas que as mulheres do sertão usam para fazer farinha. E além disso, não ia ter descanso e haveria de ficar vagando no Rio Parnaíba até que sete virgens fizessem amor com ele. Daí as moças das redondezas, principalmente se virgens, evitavam lavar roupas no Rio Parnaíba, por que tinham medo que o Cabeça de Cuia as pegasse. Os barqueiros também tinham medo de navegar naquele trecho do rio, porque diziam que o Cabeça de Cuia costumava afundar suas canoas.
Bem, não sei se foi inspirado nessa lenda ou não, mas o fato é que o Clidão tinha o apelido de Cabeção. Ele tinha, na verdade, uma baita cabeça, e com um cérebro maldito por dentro.
O Clidão ficou famoso, não tanto por bater na mãe, e pelas brigas a canivete e navalha que ele promovia no bairro, mas principalmente por ter matado a Helena, uma prostituta que vivia com ele, com dezessete facadas. A coitada ficou que nem um porco sovado, retalhada como uma posta de carne preparada para um churrasco.
O crime foi cometido por ciúmes. O Clidão tirara Helena da vida e fora morar com ela na tal casinha. Arranjara trabalho como servente de pedreiro e estava levando até uma vida normal. Clidão tinha uma paixão violenta pela Helena. E um ciúme terrível também. Não deixava que ela fosse sozinha nem na igreja.
Mas puta é puta e deu no que deu. Um dia deu recaída nela e ela levou um cliente para cada. O Clidão, que já andava desconfiado que a Helena tinha voltado para a vida, acabou pegando ela no flaga. O cara conseguiu fugir,escapando pela janela, mas ela não.
O Clidão foi preso, julgado e condenado. Pegou 20 anos de cadeia e foi solto depois de cumprir uns dez. Quando saiu, foi morar na mesma casinha onde morava com a Helena, mas já não era o mesmo miserável violento e desgraçado de antes, que vivia arrumando briga com todo mundo. Na verdade, ele mudara tanto, que ficara irreconhecível para as pessoas que o conheceram antes. O danado havia se tornado Pai de Santo e agora, ao invés de fazer maldades, fazia o bem, curando as pessoas e aconselhando-as a seguir o bom caminho. Montara até uma tenda de umbanda, que ficou conhecida como a Tenda do Pai Clidão.
Tudo ia bem até o dia em apareceu lá na tenda uma mulher chamada Alzirinha. Clidão logo se encantou com ela e a convidou para morar com ele. Em pouco tempo ela se tornou um dos “cavalos” da Tenda e começou a receber um espírito que se identificava como sendo de Helena. Pelo menos foi assim que ela se identificou quando se incorporou na Alzirinha, e o Clidão acreditou de pronto, pois a voz do espírito era danada de parecida com a da Helena.
Durante um bom tempo tudo correu em paz na Tenda do Clidão. Ele estava calmo e feliz. Achava até que a Helena o havia perdoado, pois o espírito dela nunca fizera qualquer censura a ele, nem jamais se referira ao crime que ele praticara contra ela. Era um "espirito guia", que dava bons conselhos e ajudava a fazer a fama da Tenda do Clidão.
Logo os dois estavam vivendo maritalmente e não demorou muito, se casaram . Para o Clidão era como se a Alzirinha fosse a Helena ressuscitada. Ele se sentia redimido do crime, pois era como se Helena o tivesse perdoado e voltado para ele.
Mas não foi espanto para ninguém o que aconteceu. Puta é puta, assassino é assassino, dizia multidão que, naquele dia, á tardinha, se ajuntava na porta da Tenda do Clidão. Lá estavam vários carros da polícia, uma ambulância, um carro do IML, mas, segundo se viu, apenas o pessoal do Instituto Médico Legal teve serviço para fazer. Eles tiveram que trabalhar de remover os corpos do Pai Clidão e da Alzirinha para o IML, ela retalhada com dezessete facadas, e ele com uma única perfuração no abdome, mas ambos efetivamente mortos.
Os jornais, no dia seguinte, esclareceram o que aconteceu. Clidão matara Alzirinha por razões de ciúme. Descobrira que ela estava tendo caso com um rapaz das vizinhanças. Dera dezessete facadas nela e depois praticara haraquiri, enfiando a faca na própria barriga.
Foi um caso comum de assassinato por ciúme. Clidão já tinha um histórico conhecido e ninguém se espantou com as coincidências do caso. A única coisa que intrigou todo mundo e permanece inexplicável até hoje é o fato de que a Alzirinha não se chamava assim, mas Helena. As pesquisas, feitas pela polícia, mostraram que ela, na verdade, tinha nascido no mesmo dia, ano e cidade que Helena. E os nomes dos pais eram os mesmos. Era coincidência demais e o juiz autorizou uma exumação do cadáver dela para que se fizesse uma investigação. E qual não foi o espanto de todos ao encontrarem, dentro do caixão, o esqueleto de uma mulher que já havia morrido há, pelo menos uns doze anos, segundo a perícia. No entanto, não fazia mais que quinze dias que Alzirinha havia sido enterrada. O Caso Clidão continua sendo, até hoje, um mistério.
Quando o Clidão morreu, um corvo pousou na cumeeira da casa dele e ficou lá até que o corpo foi transladado para o cemitério. Não faltou quem dissesse que a agourenta ave era uma sentinela do capeta, que estava guardando a alma do miserável, para evitar que alguém a roubasse. Outros disseram que o corvo empoleirara ali atraído pelo cheiro do cadáver. Pois o Clidão era, já em vida, diziam, mais podre do que uma carcaça no lixo.
De fato, o cara era mesmo uma tranqueira de marca maior. Dizem até que batia na mãe quando ela não tinha mistura para por na marmita dele. Bater na mãe por falta de mistura é um dos pecados preferidos do diabo, dizem. É pecado que Deus não perdoa e não tem advogado, por melhor que seja, que consiga redução de pena no inferno para o cara que faz um negócio desses. Lá no Piauí, dizem, tinha um cara assim. Ele era um cabra ruim que batia na mãe, e um dia, de ruindade, acabou matando a pobre velha. Antes de morrer ela amaldiçoou o filho ingrato, rogando uma terrível praga nele. Que ele, depois de morto, ia ficar com uma cabeça enorme, do tamanho de uma cuia, dessas que as mulheres do sertão usam para fazer farinha. E além disso, não ia ter descanso e haveria de ficar vagando no Rio Parnaíba até que sete virgens fizessem amor com ele. Daí as moças das redondezas, principalmente se virgens, evitavam lavar roupas no Rio Parnaíba, por que tinham medo que o Cabeça de Cuia as pegasse. Os barqueiros também tinham medo de navegar naquele trecho do rio, porque diziam que o Cabeça de Cuia costumava afundar suas canoas.
Bem, não sei se foi inspirado nessa lenda ou não, mas o fato é que o Clidão tinha o apelido de Cabeção. Ele tinha, na verdade, uma baita cabeça, e com um cérebro maldito por dentro.
O Clidão ficou famoso, não tanto por bater na mãe, e pelas brigas a canivete e navalha que ele promovia no bairro, mas principalmente por ter matado a Helena, uma prostituta que vivia com ele, com dezessete facadas. A coitada ficou que nem um porco sovado, retalhada como uma posta de carne preparada para um churrasco.
O crime foi cometido por ciúmes. O Clidão tirara Helena da vida e fora morar com ela na tal casinha. Arranjara trabalho como servente de pedreiro e estava levando até uma vida normal. Clidão tinha uma paixão violenta pela Helena. E um ciúme terrível também. Não deixava que ela fosse sozinha nem na igreja.
Mas puta é puta e deu no que deu. Um dia deu recaída nela e ela levou um cliente para cada. O Clidão, que já andava desconfiado que a Helena tinha voltado para a vida, acabou pegando ela no flaga. O cara conseguiu fugir,escapando pela janela, mas ela não.
O Clidão foi preso, julgado e condenado. Pegou 20 anos de cadeia e foi solto depois de cumprir uns dez. Quando saiu, foi morar na mesma casinha onde morava com a Helena, mas já não era o mesmo miserável violento e desgraçado de antes, que vivia arrumando briga com todo mundo. Na verdade, ele mudara tanto, que ficara irreconhecível para as pessoas que o conheceram antes. O danado havia se tornado Pai de Santo e agora, ao invés de fazer maldades, fazia o bem, curando as pessoas e aconselhando-as a seguir o bom caminho. Montara até uma tenda de umbanda, que ficou conhecida como a Tenda do Pai Clidão.
Tudo ia bem até o dia em apareceu lá na tenda uma mulher chamada Alzirinha. Clidão logo se encantou com ela e a convidou para morar com ele. Em pouco tempo ela se tornou um dos “cavalos” da Tenda e começou a receber um espírito que se identificava como sendo de Helena. Pelo menos foi assim que ela se identificou quando se incorporou na Alzirinha, e o Clidão acreditou de pronto, pois a voz do espírito era danada de parecida com a da Helena.
Durante um bom tempo tudo correu em paz na Tenda do Clidão. Ele estava calmo e feliz. Achava até que a Helena o havia perdoado, pois o espírito dela nunca fizera qualquer censura a ele, nem jamais se referira ao crime que ele praticara contra ela. Era um "espirito guia", que dava bons conselhos e ajudava a fazer a fama da Tenda do Clidão.
Logo os dois estavam vivendo maritalmente e não demorou muito, se casaram . Para o Clidão era como se a Alzirinha fosse a Helena ressuscitada. Ele se sentia redimido do crime, pois era como se Helena o tivesse perdoado e voltado para ele.
Mas não foi espanto para ninguém o que aconteceu. Puta é puta, assassino é assassino, dizia multidão que, naquele dia, á tardinha, se ajuntava na porta da Tenda do Clidão. Lá estavam vários carros da polícia, uma ambulância, um carro do IML, mas, segundo se viu, apenas o pessoal do Instituto Médico Legal teve serviço para fazer. Eles tiveram que trabalhar de remover os corpos do Pai Clidão e da Alzirinha para o IML, ela retalhada com dezessete facadas, e ele com uma única perfuração no abdome, mas ambos efetivamente mortos.
Os jornais, no dia seguinte, esclareceram o que aconteceu. Clidão matara Alzirinha por razões de ciúme. Descobrira que ela estava tendo caso com um rapaz das vizinhanças. Dera dezessete facadas nela e depois praticara haraquiri, enfiando a faca na própria barriga.
Foi um caso comum de assassinato por ciúme. Clidão já tinha um histórico conhecido e ninguém se espantou com as coincidências do caso. A única coisa que intrigou todo mundo e permanece inexplicável até hoje é o fato de que a Alzirinha não se chamava assim, mas Helena. As pesquisas, feitas pela polícia, mostraram que ela, na verdade, tinha nascido no mesmo dia, ano e cidade que Helena. E os nomes dos pais eram os mesmos. Era coincidência demais e o juiz autorizou uma exumação do cadáver dela para que se fizesse uma investigação. E qual não foi o espanto de todos ao encontrarem, dentro do caixão, o esqueleto de uma mulher que já havia morrido há, pelo menos uns doze anos, segundo a perícia. No entanto, não fazia mais que quinze dias que Alzirinha havia sido enterrada. O Caso Clidão continua sendo, até hoje, um mistério.