Pesadelo
As cortinas do meu quarto bailavam com a dança dos ventos; pela janela eu vi meus pais virando a esquina, depois apenas as suas sombras no asfalto. Eu estava sozinha em casa, embalada pela leitura de George Orwell em: “A Revolução dos Bichos”. A lua, erguida no céu negro e sem estrelas da cidade grande, tornava a noite ainda mais tranquila. Até que...
“SOCORRO! ELE QUER ME MATAR!”
Os gritos vinham da rua, fui até a janela e agachei-me de modo que ficasse o mais oculta possível a espiar: Era uma mulher quem berrava. Ela era alta, magra e muito bonita; estava jogada no asfalto, um homem de roupas brancas amareladas e cabelos desgrenhados ameaçava enterrar-lhe peito a dentro uma faca, e ela clamava, clamava por misericórdia, com os olhos molhados de lágrimas.
Não havia ninguém na rua, mesmo sendo apenas 20h. Era época de festa, todos se encontravam no centro da cidade, eu, que não sou lá muito fã de multidões, preferi ficar em casa. Péssima escolha...
— Não! Para! Para! — Implorava a jovem com as lágrimas rolando pelo rosto borrando-lhe a maquiagem, tão bem feita que parecia até uma pintura.
Uma sensação horrível me dominou, meus dentes batiam e meu corpo tremia. Mas aí você me pergunta, desgraçado leitor: “Por que você ficou assistindo a aquilo tudo sem fazer nada para ajudar a pobre moça?”, “Por que você não chamou a polícia?”. Digo-lhe que essa ideia veio-me à mente e, quando estendi a mão para pegar o celular, ouvi o último grito vindo da rua, olhei de novo lá para baixo e a infeliz tinha a grande lâmina enterrada entre seus olhos. Nesse momento eu fiquei paralisada, sem ação. Eu já havia presenciado a morte de perto: Meu avô enfartou em meio à ceia de natal no ano passado. Mas a morte daquela jovem, que tinha tanto ainda para viver, foi tão suja e tão... repugnante.
A música tocava alto na festa, o assassino arrancou a faca do crânio da jovem e, por uns segundos, ficou adimirando sua arma banhada em escarlate, para depois, limpá-la em sua camisa.
O maníaco soltou uma gargalhada alta jogando a cabeça para trás, porém, quando fez isso, me viu na janela.
Com os olhos perversos ele me fitava, e eu também o fazia, não conseguia desviar o olhar e, depois desses segundos de troca de olhares, ele correu em direção à porta de entrada da minha casa.
“Ai meu Deus!” pensei, eu não tranquei a porta, minha mãe disse para eu trancar, e eu esqueci!
Disparei do meu quarto e corri pela casa em direção à porta. Desci a escadaria que leva à sala de estar, mas, enquanto descia em disparada, senti que meus pés encontraram o vazio, e me vi rolando pelos degraus de madeira.
Contudo, a porta estava ali, há mais ou menos um metro de mim, era só ir até ela e girar a chave que já estava na fechadura. Seria algo fácil, se eu não estivesse caída sobre as minhas próprias pernas, num ângulo inumano. Elas latejavam de dor, uma dor insuportável.
No Rádio, dava-se um alerta: “Atenção toda a população! Foi dada a falta de um paciente no hospício municipal, os funcionários informam que ele possui sérios distúrbios mentais, é preferível que todos tranquem as portas e façam o mínimo de barulho possível dentro de casa até que ele seja encontrado. Volto logo com mais informações.”
Eu conseguia ver a silhueta do louco se formar atrás da porta de vidro, tentei mover as pernas para correr, mas era inútil.
A maçaneta girou, e a porta se abriu! O maníaco vinha com sua fome de morte no olhar, a grande faca refletia minha expressão de pânico em sua lâmina. Ele já estava praticamente sobre mim, uma inutilizada, como a mulher que morrera há um minuto atrás.
A faca descia em direção à minha cabeça como um raio, um borrão prateado letal, pronto para perfurar o meu cérebro. Mas quando a ponta da lâmina tocou minha cabeça...
— Filha, acorda, o café está na mesa! — Minha mãe berrou da cozinha.