Para ler antes de dormir

Segunda-feira, o dia foi cheio. O som da água caindo do chuveiro é o único que se ouve pela casa de Bernardo. Ele gira o registro e a água cessa de cair. Sentindo-se relaxado, pega a toalha que estava pendurada e começa a se secar, “nada melhor que um banho quente antes de dormir...”, pensa ele.

Sai do banheiro vestido com as velhas roupas de dormir, passando pela porta sempre aberta por morar sozinho, e olha alguma coisa na tela do computador enquanto esfrega a toalha na cabeça. Mais um dia que chegou ao fim. Bernardo desliga o computador e vai pendurar a toalha no pequeno varal de casa. Em seguida volta pro quarto, apaga as luzes, deita na cama e se cobre. Precisa puxar o cobertor pra se cobrir inteiro: ficou entre o colchão e a cama de novo, e então se enrola, fecha os olhos, e espera o sono chegar.

Terça-feira. Bernardo chega em casa de noite, como sempre. Come, toma banho, e deita pra dormir. Ao tentar se cobrir, sente que um pedaço do cobertor ainda está preso, e puxa com força até soltar, então se enrola nele e dorme.

Quarta-feira de chuva. Deita-se, exausto, em sua cama pra se recuperar do dia cansativo. Puxa o cobertor e, irritado, percebe que ainda está preso entre a cama e o colchão. Ele puxa com bastante força dessa vez, e consegue soltar o maldito cobertor.

Quinta-feira, o dia passou rápido. Depois do banho, Bernardo fica ainda um tempo lendo no computador e, antes de se deitar, decide olhar para a cama. Ele vê que o cobertor não está entre o colchão e o estrado, como ele achava, e não entende por que precisa ficar puxando o maldito cobertor todas as noites. Então ele o tira da cama, se enrola nele de pé, apaga a luz e deita.

Bernardo acorda de madrugada com frio, coberto apenas pela metade. Ele puxa o cobertor e sente que está preso de novo. Puxa com mais força, mas o cobertor não se solta. Ainda lento pelo sono, acorda de súbito quando, violentamente, o cobertor é puxado dele. Bernardo abre os olhos assustado e pula da cama, enquanto corre para acender a luz. Com o quarto iluminado e ainda se acostumando com a claridade, ele vê seu cobertor, está no pé da cama, quase todo embaixo dela. Depois de observar a cena, se acalma e pensa um pouco, assumindo que a única possibilidade foi que ele teve algum espasmo durante o sono e acabou empurrando o cobertor para fora da cama. Então ele tira o cobertor do chão, bate ele pra tirar qualquer poeira, apaga a luz, deita, e dorme até o dia seguinte.

Sexta-feira. Conversou sobre o estranho acontecimento com um amigo, que disse ter passado por coisas parecidas, algo sobre ficar sem ar durante o sono e acordar exaltado. Chegando em casa, então, Bernardo jantou, tomou banho e ficou no computador, afinal ele não ira mais sair hoje, e amanhã seria sábado. Depois de ler algumas coisas, decidiu programar a câmera do computador no modo noturno, para gravar seu sono e ver se os espasmos da última noite aconteceriam de novo. Foi deitar. “Que milagre, o cobertor não ficou preso dessa vez!”.

Já de manhã, acorda com o celular tocando, e percebe que seu cobertor não está na cama. Era seu amigo ligando, chamando-o para comer alguma coisa. Bernardo se levanta, coloca uma roupa qualquer, e percebe que o maldito cobertor está no chão, novamente debaixo da cama. Ele joga o cobertor em cima do colchão e desliga o computador, que ainda estava com a câmera gravando.

Bernardo passa a manhã com o amigo, depois vai de tarde ver seus pais, e só chega em casa já de noite. Toma banho e vai pro computador. “Ah é, eu preciso assistir o vídeo da noite passada.” Play, o vídeo começa. Pra não perder tempo, ele passa em velocidade acelerada, procurando o momento em que o cobertor foi parar no chão. No vídeo: 2h da madrugada: nada; 3h: nada; até que vê no quadro seguinte que o cobertor já está fora da cama: “opa!”.

Colocando novamente o vídeo em 3h da madrugada, começa a passá-lo mais devagar, e nota a si mesmo sendo descoberto lentamente, num processo que durou cerca de 20 segundos. Então Bernardo volta o vídeo, para quando o cobertor começa a sair da cama, e pausa para ver melhor. O que ele viu, no pé de sua cama, gelou sua espinha.

Suando frio, ele vê, de forma borrada na imagem, uma mão, grande e magra, agarrando seu cobertor pela ponta, e o puxando para debaixo da cama. Determinado a não olhar para trás nesse momento, Bernardo começa a sentir uma respiração fria detrás de si. Paralisado pelo medo, ele distingue uma voz medonhamente grossa pronunciando “ESTOU COM... FRIIIIO!”

O Estagiário
Enviado por O Estagiário em 16/09/2013
Código do texto: T4484643
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