A caverna

Acordou com os olhos ardendo, com a sensação de que haviam derramado uma porção de brasas sobre eles. A cabeça latejava como se houvessem trovões retumbando em seus ouvidos. Lentamente se esforçou para conseguir sentar, cada músculo do seu corpo urrava de desespero ao menor sinal de movimentação. Não conseguir conter um grito de dor.

Quando seus olhos se acostumaram com a escuridão ao seu redor, percebeu que não estava mais em seu quarto, mas sim em uma caverna escura deitado no chão frio.

Pouco a pouco se levantou e a passadas lentas e dolorosas, se pôs a caminhar.

O silêncio era total, somente ouvia o arrastar de seus pés e a escuridão claustrofobia não trazia o mínimo de conforto.

Lentamente a nuvem que pairava sobre seus pensamentos se afastou. Tentava se recordar como havia chegado ali, porém o esforço foi inútil.

O desespero invadiu-lhe o peito:

- Deuses onde estou.

Continuou sua caminhada lentamente, buscando respostas, ansiando desesperadamente por uma presença humana, seus instintos lhe gritavam que algo estava errado.

- Será que estou louco? Será que estou sonhando?

A distância ouviu o som de pequenos gemidos, poucos mais que murmúrios. De alguma forma sádica aqueles sons reconfortavam a sua alma.

- Não estou só.

Na medida em que se aproximavam os gemidos ficaram mais altos, formando frases desconexas, sem sentido algum.

Quando finalmente conseguiu vislumbrar a origem do som, a cena não lhe trouxe o conforto que tanto esperava.

Um ser humano acorrentado e nu se encontrava preso às pedras da caverna.

A curiosidade superou o medo que assolava o seu ser e pouco a pouco foi se aproximando, o som da sua respiração parecia uma ventania e o seu coração um enorme tambor.

O ruído veio antes da dor, um chicote estalou bem acima do seu joelho direito, rasgando profundamente sua carne, o sangue jorrava de sua perna.

Como um animal ferido correu, tropeçou diversas vezes, ferindo suas mãos, o seu rosto e castigando ainda mais a perna já machucada. E a risada gutural do ser que havia lhe ferido o acompanhava por toda a parte.

Em um dado momento seu corpo cedeu à hemorragia e ele caiu desmaiado.

Acordou mais uma vez, o desespero era evidente em seus olhos, onde estava, o que havia feito para estar naquele lugar?

Como uma resposta ao desespero começou a vasculhar a sua túnica em busca de alguma resposta para o que estava acontecendo ali, algum sinal.

Mas não encontrou nada mais que duas moedas no bolso oculto de sua vestimenta.

- Fui assaltado, esta é a única explicação. Fui assaltado por um bando de marginais sádicos. Preciso fugir! Buscar ajuda.

Passaram-se dias e ele não conseguiu localizar ajuda e muito menos uma saída. Ele dormiu e acordou por diversas vezes. Agindo como um animal que se esconde da presa, andava nas sombras. E somente encontrava torturados e algozes.

A fome devorava cada gota do seu ser, a sede estava prestes a matá-lo.

Encontrou um enorme rio, suas águas calmas eram profundas demais para atravessá-lo, mas suficientes para matar a sede.

Na margem do rio instalou seu pequeno refugio, já havia desistido de fugir a tempos, a única coisa que lhe restava era o desejo de sobreviver.

As feridas a muito haviam infeccionado, a sua existência por si só já era uma tortura.

Certo tempo depois entre devaneios e ilusões provocados pela febre, viu uma pequena barcaça que flutuava a distância no rio.

Tentou inutilmente gritar, mas a voz já havia desaparecido a muito tempo. O desespero aumentava ainda mais em seu peito.

- Vou morrer definhando aqui. É só uma questão de tempo.

Como se ouvisse os seus pensamentos o ancião que guiava a barcaça desviou o seu destino, indo na direção do condenado.

O guia possuía um corpo muito magro, coberto por uma vestimenta preta que lhe cobria o rosto, o seu olhar era penetrante como se visse cada pedaço da sua alma.

Ele se ajoelhou implorando ajuda, pedindo que o levasse com ele, fez muitas promessas, algumas verdadeiras outras nem tanto. Fez ameaças, chorou e a única resposta que obteve do ancião foi:

- Suplicas e ameaças, não valem nada, palavras são vento.

Como se fosse um sinal divino para a sua libertação ele se lembrou das poucas moedas que se encontravam dentro do bolso de sua vestimenta e as ofereceu:

- Sei que é pouco mas é tudo o que tenho.

- Pode embarcar. Respondeu o barqueiro.

Depois disso tudo ocorreu muito rápido e em pouco tempo ele pode visualizar o fim da caverna.

- A propósito meu nome é Arconte, bem vindo ao Hades.

E a gargalhada do barqueiro ecoou na escuridão.

Não se esqueça de sonhar...

Marcelo Rebelo

Marcelo Rebelo
Enviado por Marcelo Rebelo em 11/09/2013
Reeditado em 30/03/2015
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