A FAMÍLIA

A família chegou numa manhã de setembro à pequena cidade. Ocuparam a casa branca da esquina, há muito vazia. Chamou atenção dos vizinhos, não acostumados a gente nova. Observou-se uma senhora corpulenta de rosto pálido aparentando uns sessenta e algo que parecia uma criança protegido por uma coberta de cor escura.

Os dias passaram e nada mudou na cidade a não ser o fato que os novos vizinhos quase saiam do velho imóvel. Coisa pouco, tipo vir até o portão e mais nada. Nem conversas, nem compras, nem nada. Da tal criança, nada... Nem brincadeira no quintal.

Não demorou para o comportamento dos vizinhos provocar comentários: por que não passeavam? Conversavam ou iam às compras? Perguntas sem respostas, até que Ignácio, um menino levado, filho de Ernestina e Zé Prego, combinou com seu grupo de amigos: “Vamos lá. Dizem que são malucos. Vamos entrar e observar”; “Eu não vou”, respondeu o moleque conhecido como Bombinha, “Pode ser assombração”; “Ora, a gente só vai descobrir vendo” decidiu.

Numa tarde, quase noite, Ignácio foi até a casa e com cuidado pulou a cerca na parte dos fundos do terreno. Andou de pé em pé até alcançar a porta dos fundos. O silencio era total. Fazia calor e o menino molhava em suor. Tentou olhar pela fresta, mas nada viu. Tentou de novo, também nada além dos móveis. Já era noite quando um movimento revelou alguém andando num dos cômodos. Ignácio continuou a observação até que viu algo se arrastando. Conforme se aproximava, revelava-se estranho: Seu corpo era disforme. Sua cabeça descomunal. Seus olhos se mostravam vermelhos e grandes; seus braços eram longos e ajudavam na movimentação do corpo; não tinha pernas e sim patas que se arrastavam. O olhar continuava na direção da porta, e num determinado momento encontrou o rosto assustado de Ignácio que tomado pelo medo, decidiu correr. Saiu em disparada sem observar o caminho até que um toco atravessado provocou a queda. O menino sentiu quando o osso da perna se partiu. Gritou. Gritou mais alto. Até que encontrou os olhos vermelhos... O menino tentou se arrastar, mas duas garras o seguraram e num só golpe arrancou um de seus braços. Foi a última coisa que viu.

No outro dia, enquanto todos procuravam pelo menino Ignácio, a família desaparecia misteriosamente. Dizem que em busca de uma casinha, de outra cidade, em que haja pelo menos um curioso para alimentar a sede de sangue do filho do mal, cuidado pela sacerdotisa.