Sessão de Terapia - DTRL


     Era a cena clássica de um consultório, o analista em sua poltrona e o cliente debruçado no divã:
     - Diga-me senhor Vampelt, como e quando percebeu ter este problema? – perguntou o analista.
     - Ah doutor – ia respondendo Vampelt – foi há muito tempo, eu era muito jovem. Sabe, como sempre acontece nessas horas acreditei em um amigo, bem, pelo menos achei que Virgilius era meu amigo, mas não. Ele me atraiu para as sombras e para o declínio junto com ele! Foi ele quem me arrastou para essa vida.
     - Vejo que se arrepende muito senhor Vampelt. Teve que largar muita coisa por causa disso não?
     - Sim, eu tinha uma família linda, um bom emprego, uma bela posição social, propriedades. Mas perdi tudo! Agora, veja o que sou, apenas uma forma decadente de vida, vivo como um bicho doutor, me escondendo nas sombras da noite a margem da sociedade humana.
     - Não seja tão rígido consigo mesmo senhor Vampelt. O senhor não está tão mal assim.
     O analista queria apenas elevar a moral de Vampelt, pois o estado dele era deplorável, muito magro, olhos profundos com grandes olheiras, semblante extremamente depressivo e uma excessiva palidez, demonstrando seu péssimo estado de saúde causado pelos anos e anos de entrega ao vício.
     - Ora doutor, eu sei que minha vida é uma droga, não precisa tentar me confortar. Ninguém me quer por perto, se eu apareço na vida de alguém é para causar desgraça, nada mais... eu sou... eu sou... eu sou... odiado por todos doutor!
     Vampelt começou a chorar copiosamente.
     - Minha vida não presta! O senhor não sabe doutor quantas vezes pensei em acabar com tudo, há momentos em que meu coração pede para ser perfurado!
     - Não diga isso homem! Olhe, é possível vencer!
     - Mas como faço isso doutor? – quis saber Vampelt.
     - Basta renunciar ao vício! Você pode, pode ser mais forte que ele.
     - Não acredito nisso doutor, agora mesmo sinto uma vontade tremenda de me saciar, e sei que quando eu o fizer me arrependerei depois.
     - Tente se controlar senhor Vampelt, verá que consegue. Concentre-se, diga a você mesmo que não precisa de drogas!
     - Drogas? Desculpa doutor, mas nunca falei em drogas.
     - Não negue seu vício homem! Não tenha vergonha em admiti-lo. Olhe, já atendi muitos como você, pobres coitados desiludidos com a vida. Mas pode-se vencer.
     - Mas doutor, eu...
  - Não fale! Apenas confie em mim! Olhe, tenho certeza, você vai se livrar desse vício hoje mesmo. E digo mais: se não conseguir não precisa pagar pela sessão!
     - Tem certeza disso doutor?
     - Claro senhor Vampelt.
   - Mas o desejo é tão forte, incontrolável. Impossível resistir. Tenho que me saciar agora doutor.
     - Não senhor Vampelt, resista! É uma decisão difícil? Sim, mas ela significa o fim de uma vida jogada nas sombras, o fim de uma vida vadeando, o fim de uma vida... deixa ver o termo...
     - Que tal morcegando doutor? – sugeriu Vampelt.
     - Isso! O fim de uma vida morcegando!
 Pela primeira vez Vampelt sentiu confiança nas palavras de alguém, percorreu tantos consultórios, tantos analistas, mas ali estava um diferente, um homem que transmitia otimismo com suas palavras.
     - Está certo doutor. Vou largar o vício! Vou renascer como o homem que fui um dia!
     Vampelt derramava lágrimas de emoção.
  - É assim que se fala senhor Vampelt! Mas devo anunciar que infelizmente o tempo dessa consulta acabou, vamos marcar para semana que vem e acompanhar sua evolução.
  O senhor Vampelt se levantou do divã e cumprimentou seu analista. Já ia virando as costas para ir embora quando foi chamado pelo bom doutor:
     - Senhor Vampelt? Não está se esquecendo de nada?
     - Desculpe doutor – falou Vampelt – tenho que lhe pagar pela consulta. Quanto é mesmo?
     - Como é nosso primeiro encontro eu cobro um preço especial senhor Vampelt, R$ 700,00. Afinal sairia de graça só se o senhor não se livrasse do vício e isso nós não queremos, não é mesmo?
     Vampelt ficou um pouco mais branco, como se isto ainda fosse possível, e depois de um breve instante falou:
     - Heerr... R$ 700,00?
  - Sim, e lembre-se que é com um desconto  bem camarada.
     - Bem doutor, nessa condições eu devo repensar um pouco...
    Infelizmente o senhor Vampelt não abandonou o vício naquele dia. Não que os argumentos do doutor não fossem convincentes, mas pensando bem de onde ele iria tirar R$700,00? Afinal era um vampiro de classe média. Então ele saciou seu vicio por sangue, única condição de não pagar a consulta. De qualquer forma seu terapeuta não teria como cobrar nada dele mesmo, estava morto no chão com dois furos na veia jugular, pobre doutor, era um bom profissional, e tinha um sangue muito saboroso também. Pena que cobrasse tão caro.
     Bem, fazer o quê. Vampelt ainda tinha esperança de se livrar de seu vício, e por isso saiu a procura de um novo analista.
Luciano Silva Vieira
Enviado por Luciano Silva Vieira em 08/07/2013
Reeditado em 15/07/2013
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