O uivo de dor do cão ecoou alguns segundos, mesmo depois do seu corpo começar a ser devorado. Lágrimas de piedade e frustração escorreram pelo rosto da senhora. O cachorro já estava há oito anos com a família. Dócil sempre fora a companhia do menino. O que mais incomodou a mulher foi ver o garoto arrancar com os dentes, nacos de carne daquele que sempre estivera do seu lado. Brincando e correndo. Não era preciso ser adivinho para saber que aquelas alturas, todos os animais do sítio haviam sido devorados. As três figuras continuavam espreitando a casa. De vez enquanto, um deles empurrava alguma porta ou janela, ansioso por entrar na casa.                             O telefone já estava mudo há uma semana, e agora a luz e a água fora cortada. Era questão de tempo. Aquelas coisas aguardavam pacientemente pelo repasto. A mãe do menino começara a enlouquecer, e foi preciso que o marido a trancasse em um dos quartos, para evitar que ela corresse porta a fora. O pobre homem ainda tinha esperança de ajuda, e seu coração alegrou quando ouviu um carro se aproximando.                              Precavido ele abriu uma fresta na janela para observar quem chegava. Eram dois policiais. Estavam procurando pelo médico.  Após descobrirem pela secretária que o mesmo havia saído para ir ao sítio há uma semana ,e não voltara, resolveram averiguar. As três criaturas se ocultaram atrás da árvore, e quando os policiais deixaram o carro e começaram a se encaminhar para a casa, os atacaram sem piedade. Não houve tempo de serem avisados e nem de reagirem. Tiveram as gargantas rasgadas e em pouco tempo, foram devorados. Pela janela, o homem observou horrorizado o ataque. Um gemido alto fez com que saísse do seu posto de observação e corresse ao quarto. A esposa estava caída ao chão com um corte profundo no pescoço. Ao seu lado, uma tesoura pontiaguda. Um grito escapou do seu peito ao perceber que a mulher acabara de morrer. Do lado de fora os monstros interromperam a ruidosa mastigação e olharam para a casa. Enquanto isso o homem procurava pela garrafa de querosene. Não valia mais a pena resistir, mas não iria deixar que aquelas coisas o devorasse. Abriu uma maleta onde a esposa guardava documentos. Pegou a certidão de casamento e a de nascimento do filho. Chorou copiosamente, pensando nas duas pessoas que mais amara na vida. Começou a derramar o liquido nos papeis, mas uma caixinha chamou sua atenção. Sentado na beirada da cama, ele a abriu. Lá dentro havia papeis meio amarelados amarrados com uma fitinha azul. Eram cartas escritas á sua mulher, há nove anos.  Em uma delas uma mulher oferecia o filho que esperava em adoção. Explicava que durante a gestação, sofrera um ataque de zumbis e tinha muito medo que futuramente, eles viessem atrás do bebê. Iria partir para bem longe. As coisas começaram a fazer sentido para o homem. Lembrou-se da insistência da esposa em adotar uma criança, e de como ela recusou ir ate um orfanato, dizendo que no momento certo o filho que seria deles chegaria. Lembrou também que ficou tão encantado pelo bebê, que nem questionou o porquê de uma mãe se desfazer de um filho e se mudar de cidade tão rapidamente. Relanceou os olhos pelas outras cartas. Descobriu que a verdadeira mãe do menino sempre o acompanhou de longe, e que em todas as correspondências ela os aconselhava a partirem dali para bem longe. O homem olhou com rancor para o corpo da mulher no chão. Se ela tivesse dividido com ele esse tétrico segredo, tudo isso teria sido evitado. Tomou então uma ousada decisão. Espalhou o querosene pela casa, colocou fogo, em seguida jogou o líquido em si mesmo e abriu a porta. Os zumbis não atentaram para as labaredas que se espalhavam, e sim no homem que os olhava desafiadoramente.  Grunhindo eles foram entrando. Quando os três entraram o homem trancou novamente a porta, e abriu os braços. A criatura que um dia fora seu filho, arreganhou os dentes e se aproximou confiante. Quando o homem sentiu a primeira mordida, pressionou o isqueiro. O cheiro de seu corpo se queimando e o da carne apodrecida dos zumbis penetrou em suas narinas. Com uma gargalhada insana ele se entregou a morte.


vânia lopes
Enviado por vânia lopes em 04/07/2013
Código do texto: T4371613
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