A Cidade da Morte: A misteriosa Criatura

Este conto será dividido em 4 capítulos e será dedicado a todos os amigos leitores e escritores do recanto. Resolvi escrever essa estória, pois estou prestes a atingir uma marca pessoal de 100 textos. Espero que gostem deste conto, que chamo de: "A Cidade da Morte".

A Cidade da Morte: A Misteriosa Criatura

Dois anos haviam se passado desde a queda do meteoro que varreu noventa e cinco porcento da população mundial e destruiu cidades inteiras. Ao contrário do que fora planejado, o mundo não estava em reconstrução. Os sobreviventes viviam no que restou das casas e prédios, e se alimentavam do estoque de comida que fora provisionado antes da tragédia. O povo perdeu o senso de civilidade, provocando a formação de vários grupos: os Nômades, que vagavam de cidade em cidade em busca de comida e abrigo; as Gangues, que saqueavam os armazéns e promoviam a desordem por onde passavam; os canibais, que embora se comportassem como gangues, apenas matavam para se alimentar; e as tribos, colônias de sobreviventes que tentavam viver em harmonia, protegendo-se dos outros grupos. Confrontos entre nômades e sobreviventes eram constantes, cujos vencedores ficavam com o suprimentos e com o controle das tribos. Os principais líderes mundiais estavam mortos. Não havia mais governo, mandava o mais forte de acordo com leis próprias. Não havia mais energia elétrica, com isso houve grande retrocesso na nova civilização, que vivia de forma precária, quase arcaica. Água limpa era coisa rara, por isso valia mais do que ouro e muita gente morria por uma simples garrafa.

Alice estava exausta. Sentou-se à sombra da varanda de uma casa abandonada e ficou observando a briga entre Jack e um membro da tribo, um homem magro e barbudo que defendia o seu estoque de enlatados e dois garrafões de água mineral. “Jack vai vencer fácil”, pensou ela. Era um homem bastante forte e sabia brigar. Fora ele que a salvou de uma gangue que queria estuprá-la. Derrubou quatro homens a socos e matou dois a tiros. Como os pais dela haviam sido mortos, resolveu acompanhá-lo em sua jornada. Jack não estava sozinho, fazia parte de um grupo nômade que tinha mais cinco membros que seguiam para a “grande tribo do norte”. Diziam que lá havia grande estoque de comida e água limpa.

O homem não resistiu à briga e, depois de apanhar muito, se deixou cair com o rosto estourado e sangrando bastante. Jack, sempre convencido, piscou para Alice e retirou da mochila três cantis e os encheu com a água do garrafão. Preencheu sua mochila com os enlatados e, antes de ir, deu mais um chute no pobre homem.

Wallace, o líder do grupo, estava em confronto com os outros habitantes da tribo. Com ele estava Deise, a médica sexy e durona; André, o jovem fuzileiro; Greg, um velho advogado que sempre questiona suas ordens, e Carla, estudante que era contra os confrontos. Na verdade os Nômades, ao contrário das gangues, evitavam brigas, entretanto era difícil conseguir comida de forma pacífica. Para a sorte de Wallace e de seu grupo, essa tribo não estava armada, caso contrário encontrariam sérios problemas em decorrência da pouca munição que possuíam. Venceram fácil o confronto.

Fazia um calor infernal naquela tarde. Os homens do grupo se refrescavam no bar enquanto as mulheres se banhavam nas águas barrentas de um açude. Wallace discutiu com Jack por causa dos excessos cometidos por ele durante as brigas.

-Cansei-me de discutir com você sobre isso, Jack! Brigamos apenas porque precisamos de água e comida. O mundo não é um ringue para você sair batendo de forma desordenada!

-Poupe-me de sermões, chefe! Vocês precisam de mim, e não vou mudar só porque você quer. Se pretende me expulsar do grupo, vá em frente, faça a votação. Quero ver quem será a favor... Há canibais e gangues lá fora. Esse grupo não sobreviveria sem mim nem duas horas.

-Que seja. Não farei essa votação novamente, pois já sei o resultado. Mas não ficaria triste se você encontrasse alguém capaz de lhe aplicar uma verdadeira surra. Saiba que de minha parte não receberá ajuda.

Jack tomou um gole de conhaque e deu de ombros. André olhou para Wallace com vergonha e passividade, pois sabia que se contrariasse Jack, tal atitude lhe seria prejudicial. Quem gostou da situação foi Greg, que sorriu discretamente após tomar um copo de cerveja quente. Wallace saiu do bar com um Martini na mão, olhou para o céu cinzento de poucas nuvens e seguiu em lenta caminhada pela cidade. Ao seu redor havia casas em ruínas, além de prédios destruídos. Mais à frente existiam choupanas ondes os habitantes mais antigos fixaram residência. Ele pôde ver uma mulher correndo para se esconder. As crianças estavam com medo e se escondiam debaixo das paredes de concreto tombadas. Na parte mais afastada da cidade, verdadeiros cemitérios improvisados serviam de morada para os mortos. O cheiro era insuportável. Wallace tomou mais um gole de Martini, praguejando para si mesmo. Novamente outra mulher correu bem a sua frente, mas desta vez estava nua. Ele balançou a cabeça negativamente enquanto a jovem se escondia em meio às ruínas de um prédio. Nem todas as tribos possuíam médicos, muito menos curandeiros, e Wallace pode comprovar isso ao ver tantas pessoas doentes largadas nas ruas para morrerem.

No açude, Deise e Carla tomavam o seu primeiro banho depois de quase duas semanas. Alice evitava essas águas, pois sua pele era incrivelmente frágil. Segurando um pistola, ela vigiava o local para evitar a invasão de algum tarado. Carla e Deise conversavam sobre os homens do grupo:

- O que você acha do André? - perguntou Carla, com um olhar malicioso.

- Já lhe disse, não me interesso por rapazotes. Se tivesse que me envolver com algum homem desse grupo, seria com Jack. Agora você parece ter uma quedinha por ele, não? - questionou Deise.

- Não sei exatamente. Ele parece ser um bom rapaz, mas às vezes tenho a impressão de que ele é bem mais covarde do que aparenta. Para um fuzileiro, não é bem uma qualidade a ser apreciada.

- Por isso prefiro o Jack. O Wallace, apesar de corajoso, é muito certinho. Mesmo sendo advogada, não é uma característica que aprecio num homem com quem pretendo ter um relacionamento.

Alice escutava a conversa sem dar palpite. Olhava ao redor do açude, por entre as árvores e arbustos em busca de algum espião. Tudo parecia bem tranquilo, silencioso até demais. Ela temia a invasão súbita de alguma gangue. Achava arriscado ficarem sozinhas naquele lugar, mas foi decisão de Deise para que pudessem nadar nuas no açude. Carla sempre ia na onda de Deise. Eram amigas inseparáveis desde que as conheceram. Para o espanto de Alice, um arbusto se mexeu. Ela apontou a arma, esperando que alguém saísse; mas para seu alívio, era apenas um pequeno esquilo.

- O que foi isso? - perguntou Deise.

- Não foi nada – respondeu Alice – Vocês poderiam se apressar? Precisamos encontrar os rapazes para planejar nossa noite.

- Tem razão. Vamos, Carla.

Enquanto as duas se vestiam, novamente os arbustos se mexeram, mas dessa vez o animal parecia maior. Carla soltou um gemido, enquanto Deise se apressava com a blusa. Alice estava assustada, e sua mão tremia ao apontar a arma para todas as direções. Seja lá o que for, era bastante rápido, e parecia ficar invisível por entre as árvores. As três mulheres se juntaram, mas não sabiam para onde ir. Estavam cercadas por algo desconhecido. Para azar delas, os rapazes pareciam estar bem longe dali. Uma sombra pareceu flutuar pela floresta. De repente um silêncio inquietante. Alice puxou Carla pelo braço. Deise também estava armada e seguiu na frente. A mesma sombra parecia segui-las pela floresta. O sol se escondia por trás das montanhas e a noite parecia cair no meio do nada. Os pássaros fugiam, como se temessem o perigo. Fazia frio. O vento fazia os galhos dançarem, mas era uma dança macabra, o anúncio de uma tragédia. Carla se encolhia atrás de Alice, olhando para os lados assustada. Estava tão pálida que mais parecia um cadáver. “Devo concordar com Alice, foi mesmo uma péssima ideia”, pensou ela.

Para voltar à cidade era preciso uma caminhada de apenas dez minutos, mas diante das circunstâncias, parecia uma jornada interminável. O chão barrento parecia prender os pés das três mulheres. Alice ouviu um barulho que vinha das árvores. Deise apontou a arma prontamente, mas o que viu foi apenas mais um vulto seguindo rapidamente para a escuridão. Carla prometeu que se saísse viva, escutaria Alice mais vezes. “Se saísse viva...”, imaginou ela. Já havia escapado da morte outras vezes, mas sabia exatamente de quem estava fugindo. Deise viu uma figura de estatura mediana atrás de uma árvore e tentou se aproximar.

- Volte aqui, Deise! - Gritou Alice.

Carla ficou estática, paralisada de tanto medo. Alice correu atrás de Deise. As duas viram um ser estranho a fitá-las; porém estava oculto pela escuridão da floresta. Deise atirou, espantando alguns macacos e pássaros. A figura desapareceu. Novamente se fez silêncio. Alice varreu sua volta em busca do estranho, com os olhos arregalados e as mãos ainda tremendo. Tinha boa mira, mas assustada dificilmente acertaria um alvo se tivesse bem a sua frente. Deise era mais fria. Com um olhar felino percorria cada árvore em busca do menor sinal de vida. O silêncio permaneceu por alguns segundos, até que se ouviu os gritos de Carla.

Alice correu para ajudá-la. Deise atirou para o alto, imaginando que fosse um animal. Carla estava sendo arrastada para a floresta. Alice atirou na sombra que puxava a companheira. Carla gritava por socorro, enquanto desaparecia em meio à escuridão. Alice atirou mais uma vez, mas a bala atingiu uma das árvores. Seja lá o que for, tinha uma força impressionante e conseguia se desviar das balas com extrema rapidez. Deise já não tinha mais esperanças de salvar a amiga. Ela se ajoelhou enquanto Alice se embrenhava na floresta, ziguezagueando desesperadamente para se desviar das árvores e dos arbustos. De repente um tiro ecoou pela floresta de forma estridente. Nos segundos seguintes não se ouviam os gritos de Carla. Alice imaginou o pior, enquanto caminhava com dificuldade por entre o mato. Ela ficava imaginando como iria explicar o desaparecimento de Carla para Wallace e os outros do grupo. Imaginou a reação de André ao saber do fato e da fúria com que Jack reagiria. Não seria nada fácil. Para o seu alívio, ouviu o choro de Carla a uma média distância, ecoando como uma melancólica canção. Caminhou mais um pouco pela floresta escura, e ficou surpresa ao ver que ela não estava sozinha. Carla estava acompanhada de um homem estranho, de cabelos e barba compridos. Ela apontou a arma para o homem:

- Afaste-se dela, agora! - gritou ela.

O homem levantou as mãos e se virou para Alice. Estava usando uma jaqueta de couro e uma calça bem rasgada. Parecia motoqueiro. Com a voz grave ele disse:

- Baixe essa arma, eu não estou sozinho. Há outros do meu grupo pela cidade e certamente já renderam os seus amigos. Se não fosse por mim, sua amiga já estaria morta.

- Quem a pegou? Que criatura era essa?

- Acredite, minha jovem, você não vai querer saber... Agora baixe essa arma e vamos voltar para a cidade, caso contrário alguém vai sair machucado, seriamente machucado...

Continua...

Cleiomar Queiroz
Enviado por Cleiomar Queiroz em 30/06/2013
Reeditado em 04/07/2013
Código do texto: T4365963
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