Os Contos do Frio
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O Sabor de Congelar
BRASIL NOTÍCIAS — 15 de Junho de 2013
População abandona cidade turística
A turística cidade Tempestade de Gelo é uma das mais famosas do Brasil, localizada no Estado de São Paulo, sua nomeação é uma ironia à condição climática que a constitui, pois ao contrário de todo o estado, cujo clima predominante é frio, na cidade a temperatura ultrapassa os quarenta graus e as chuvas ocorrem em determinados períodos, assim como ocorre na região nordeste do país.
A condição climática é um dos fatores que atrai turistas, além da estrutura semelhante com as cidades pequenas da América do Norte. Os hotéis de Tempestade de Gelo são todos cinco estrelas e há alguns com luxo realmente alto.
Mas atualmente as visitas à cidade diminuíram gradativamente, pois a população desaparecera misteriosamente. Segundo visitantes da cidade, há barricadas espalhadas como se a população tivesse se protegendo de algo, mas não há vestígios de nenhuma batalha ou sequer um corpo.
As autoridades de segurança do Brasil. iniciaram as investigações, mas até agora nada foi descoberto e o mistério do súbito desaparecimento da população de Tempestade do Gelo continua sem solução.
Dois meteorologistas de uma estação meteorológica na Antártida conversam tranquilamente sobre as condições de trabalho enquanto observam os monitores. Um deles está sentado a um painel de monitores à esquerda e o outro á direita.
— Está um frio de rachar! — falou o meteorologista da esquerda num tom claramente divertido. — Sabe, trabalho aqui há mais de três anos e só suporte esse frio por causa dessa roupa que vestimos. Mas não posso deixar de dizer que o salário e as férias também contribuem para suportar tais condições.Terminando de falar, o meteorologista soltou uma gargalhada divertida e zombeteira.
— Eu só estou aqui porque infelizmente não posso voltar ao meu país, devido a problemas pessoais. Sou da África e lá faz um ótimo calor. - falou o meteorologista à direita, num tom furioso. — não conheço muito bem as condições das férias, pode me dizer como elas são?
— Muito boas. — O primeiro falou num tom divertido. — Já ouviu falar da cidade Tempestade de Gelo, município do Estado de São Paulo?
— Já sim. Dizem que é a cidade mais quente do país, embora esteja num estado de clima mais frio. - o segundo respondeu.
— Pois já que você adora o calor, acredito que vai gostar muito das férias, pois a empresa para qual trabalhamos tem filiação com uma rede de hotéis da cidade Tempestade de Gelo e nas férias nos hospedamos sempre em um deles.
Antes que o outro meteorologista pudesse ter qualquer reação, o telefone da estação tocou e ele atendeu. Para sua surpresa era um dos superiores que iria noticiá-lo sobre suas férias que começavam naquele mesmo instante. Um pequeno avião o apanharia na estação e o levaria para o Brasil, onde um motorista particular esperaria para levá-lo à cidade.
Dois dias depois então, o meteorologista estava diante da estrada de terra batida que seguia descendo a encosta de uma montanha e que levava à cidade Tempestade de Gelo. O carro teve algum defeito no motor exatamente diante da estrada e o motorista disse que sabia consertar, pois era um defeito costumeiro e simples do veículo, mas o meteorologista de férias não quis esperar, agradeceu o homem e seguiu descendo lentamente pela estrada.
Logo no inicio percebeu que a descida era bastante longa, pois não conseguia ver o fim da estrada cercada por uma densa floresta com árvores próximas umas das outras.
A descida foi bastante longa, o que o meteorologista calculou cerca de uma hora, até ver o fim da estrada, às margens de um amplo campo quadrado.
A grama do campo estava seca e malcuidada. Assim que o meteorologista pisou na grama, viu que ao nordeste havia uma outra estrada de terra batida, agora retilínea, que seguia para o norte. Sem pensar duas vezes, ele rumou para a estrada e seguiu para o norte.
Foi outra longa caminhada, durou cerca de quarenta minutos até que pudesse ver o fim da estrada, às margens de uma rua asfaltada. Ao fim da estrada, a margem direita que antes tinha árvores, passou a ter um alto muro de um dos edifícios, enquanto a outra continuava igual.
O meteorologista caminhou para o asfalto, alegre com o calor que preenchia todo seu corpo e olhou para a rua e os edifícios.
— Isto é estranho. Não há um sinal de vida ou trânsito aqui. Ou o comércio e o trânsito nessa parte da cidade estão muito ruins ou toda a população se mudou. — O meteorologista pensou alto num tom claro de confusão.
De repente o calor sumiu, sem motivo, pois o céu continuava azul e sem nuvens e o sol ainda irradiava o asfalto com seus raios, porém ainda assim o calor foi substituído por uma forte onda de frio, superior ao frio da Antártica, mas impossível de congelar.
— Isto é estranho e está me assustando! — O meteorologista exclamou assustado. — É pleno verão! como pode estar tão frio?! Vou embora daqui agora mesmo!
O meteorologista se virou para a estrada de terra, mas viu algo que o fez parar onde estava.
Uma gigantesca parede de gelo formou-se de repente, tão alta e íngreme que não se podia escalar para saltar do outro lado e tão espessa que nem o maior aríete do mundo poderia derrubá-la ou quebrá-la.
Sem pensar, o meteorologista virou para a rua que seguia ao leste e correu, assustado e aterrorizado demais; olhava para os lados à procura de saídas, mas os edifícios estavam cobertos por espessas camadas de gelo, impossibilitando o acesso às portas, bem como o chão sob os pés.
Chegando ao final da rua, o desespero do meteorologista aumentou, pois não havia saída. A rua que continuava para o sul, estava bloqueada por uma barricada de carros e outros objetos.
Mesmo com todo o terror, o meteorologista reuniu coragem suficiente para olhar para os lados e ao norte, um pouco para o oeste, ele viu um pequeno muro de madeira, coberto por uma leve camada de gelo e no topo, com um brilho fluorescente azul-claro.
Aquilo deu esperanças ao homem, que correu para o muro, saltou, agarrou-se no topo, fez força para subir e caiu do outro lado, com um baque surdo.
Está num corredor estreito, as paredes e o chão cobertos por espessas camadas de gelo, no alto o sol com seus raios que não conseguem tocar nada naquele lugar assustador. Ao final do longo corredor, há uma porta comum de madeira, coberta por uma fina camada de gelo e no portal, um brilho fluorescente como o do todo do muro. Acima do portal há um letreiro com o seguinte dizer: saída.
Esperançoso, o meteorologista começou a correr em direção ao norte, para a porta, mas após alguns metros, ainda distante da metade do corredor, escutou um baque surdo, como se alguém tivesse saltado o muro. Seguindo de perto o baque, houve um som realmente assustador, como se um animal feroz corresse sobre as quatro patas.
O meteorologista apertou o passo, mas sentiu que deveria saber o que era o ser que o perseguia. Sem diminuir a velocidade da corrida, ele virou o rosto para trás e se espantou com o que viu.
Era um ser humanoide, com membros, tronco e cabeça semelhantes aos dos humanos, mas sem dedos nos pés, sem boca, nariz, olhos, orelhas, sem cabelo algum e sem pele, seu corpo revestido por um tecido vivo, somente músculos.
O meteorologista tornou a olhar para frente, percebendo que já estava há alguns passos da metade do corredor, quando percebeu também que os passos pararam atrás dele.
Em seguida o ser que o perseguia o agarrou pelas costas, seu peso tão alto que o fez ficar corcunda e virar para trás, na direção do muro.
E viu algo que o fez arregalar os olhos, algo que só ele pôde ver, ao mesmo tempo que uma voz gélida e assustadora sussurrou-lhe ao ouvido:
— O Frio vai te mostrar o Sabor de Congelar.
O que ele viu ninguém pôde saber, pois uma dor como mil facas perfurando sua pele surgiu e uma espessa camada de gelo começou a cobrir seu corpo, começando pelos pés, até cobri-lo completamente, deixando-o como uma estátua de gelo.