Pedaços de Inocência – DTRL VIII
Essa é minha história, antes de mais nada quero revelar que tive momentos bons na vida, quando ainda tinha quatro anos conheci um lugar mágico, papai nos levou até o campo, cerca de quarenta quilômetros de casa, era área rural. Lá conheci um lago esplêndido, mesmo criança aquela imagem nunca sairia de minha cabeça. Papai dizia que aquele lugar era seu lugar predileto, um lugar especial.
A água do lago era tão clara, hoje era uma reserva ambiental, era proibido pescar ou nadar lá, ficava no meio da mata, havia pedras lindas, um córrego desaguava lá e seguia depois dele em direção ao rio
mais conhecido das redondezas.
Eu caminhava a margem do córrego e ele me alertou, papai disse que eu devia tomar cuidado com a água, pois aquele lago lindo poderia também ser letal por mais que parecesse mágico bem lá no fundo, a água também pode ser ruim, e poderia até mesmo matar. Naquele instante não acreditei nele, afinal como no fundo de um lago tão belo, poderia ter algo tão mal?
Dia 02 de junho, o juízo final
Eu caminhava pelo rio de sangue que jazia sob meus pés, as pegadas perseguiam o destino que a sorte havia me jurado. Precisava fazer o que era certo, devia tirar a ultima vida e cumprir com minha promessa de vingança, mas nem sempre o
que é certo é certo, é?
Os degraus da escada de mármore imperial pareciam ser a maior escalada de minha vida. Nos olhos o ódio e as lágrimas se misturavam dentro do espelho de minha retina, enquanto nas mãos trazia a arma providencial para o ultimo homicídio.
Ao girar compassado dos ponteiros de meu velho Rolex, herança de meu maldito pai, continuava a caminhar até o quarto onde havia prendido a jovem Vanessa. A escada já havia findado, agora restava atravessar o pequeno corredor que dava para a porta do quarto, aquele quarto escuro...
...
Liberdade ainda que tardia
Depois de anos eu estava livre, tantos crimes, tantas mortes. Cada vitima significava uma cicatriz em meu corpo, as duas primeiras foram em minha face, uma em cada lado do rosto iniciando ao lado da boca e terminando ao pé da orelha, feita a ferro quente, ao todo havia dezoito marcas, lembranças das dezoito crianças assassinadas.
No inicio me perguntei o porquê de tudo isso, afinal o que leva uma pessoa a matar crianças, seqüestrá-las, prende-las em um quarto escuro, abusar sexualmente delas, cometer atos obscenos e brutais? Por que eu tinha que ser um assassino? Eu não queria ser assim, eu nunca quis... Eu não quero!
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28 de maio, Cristina e seus lábios
Acordei de manhã, lembrei-me dela de como seus lábios eram lindos. Queria que eles não tivessem sido arrancados da maneira que foram, deve ter sido muito dolorido a pequena garota amarrada e tendo os lábios esticados por um alicate enquanto os mesmos eram cortados com um estilete comum desses que os alunos carregam em suas bolsinhas dentro de suas mochilas.
Cristina achava realmente que eu queria ajudá-la, mas eu não podia. Ela ficou olhando para mim, queria que eu a matasse enquanto sangrava feito uma porca, dava para enxergar a raiz de seus dentes, seu rosto ficou realmente assustador.
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29 de maio – Os olhos da bela Íris
Nada foi tão doloroso como aquela maldita semana, Íris era realmente uma garotinha maravilhosa, tinha um rosto bonito, mas os olhos, aqueles olhos esverdeados eram impecáveis, de incomparável e rara beleza.
Lembro-me quando ela me viu pela primeira vez, de certo deve ter se perguntado quem eu era, o que eu era, e por que ela estava ali.
Pobre menina, ela era magra, tinha cabelos negros e era tão frágil. Quando se viu presa a mesa, olhando para mim, teve a certeza que do céu não viria esperança alguma. Eu nunca fui ruim, não, eu não era assim. Chorei e uma lágrima desceu de meus olhos despencando até a face dela, enquanto o som sádico do motor arranhou meus tímpanos. Os gritos dela eram angustiantes. As faíscas provocadas pelo carvão da furadeira eram evidentes naquele quarto escuro, e logo a serra copo perfurou a órbita dela, os olhos foram arrancados e colocados dentro de uma vasilha de vidro, onde ficaram boiando dentro daquele liquido esverdeado.
Mais tarde com um pano tapando os olhos ela era estuprada, enquanto chorava sem lágrimas e a única coisa que enxergava era sua própria dor, sufocada em meio á escuridão que a cercava.
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30 de maio – Sheila
A morena de pele cor de jambo olhou na minha direção, eu ainda me lembrava de Íris, havia ficado hipnotizado com a cor daqueles olhos, como se um feitiço tivesse sido lançado em mim. Mesmo sendo bela decerto não notaria Sheila a não ser pelas curvas insinuantes que a jovem morena carregava.
A blusa dela foi rasgada e confesso que me excitei ao ver aquele belo par de seios. Mesmo que involuntariamente percebi que os mamilos dela se enrijeceram ao sentir os dedos promíscuos de um homem a acariciando provavelmente pela primeira vez a julgar que ela tinha apenas treze anos, mesmo sendo uma mulher já formada.
Ela me fitou e pude perceber que as mesmas indagações que as outras carregavam estavam evidentes no semblante dela. Maldita sorte a da pobre menina. Ouvi-a gritar o pai dela como se alguém mais a pudesse ouvir.
Ao perceber que a lâmina se aproximava a pobre garota inutilmente lutava, mas teve os seios decepados um a um, a lâmina da faca de açougueiro era enorme e muito afiada. A pobre menina desmaiou de dor antes mesmo de perder o primeiro seio.
A noite ela ainda estava lá, sangrando, morrendo aos poucos. Olhei para ela, os olhos dela estavam parados e vazios, o corpo trêmulo e a dor estava estampada no rosto como uma máscara de dia das bruxas.
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31 de maio – Jussara
Olhei para a jovem e já imaginei onde seria minha nova cicatriz, a nova marca que seria feita pela morte que viria a seguir. Os últimos dias haviam sido realmente cheios. As mortes estavam cada vez mais freqüentes.
Jussara não tinha pernas bonitas, seus olhos eram comuns, suas curvas eram modestas até mesmo pela idade de onze anos, mas em contra partida tinha um nariz perfeito.
Arrancá-lo foi fácil, ouvi aquele barulho infernal e o sangue jorrou ainda vivo pelo rosto da garota, minando da ferida e tingindo os lábios dela do carmesim da vida.
Jussara morreu enquanto engasgava com o próprio sangue ouvindo a ordem mais imprópria para aquela situação.
- Cale-se vadia! Cale-se putinha vagabunda!
Ela gritou até o ultimo suspiro.
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01 de junho – Estela
A noite que se sucedeu foi uma das piores de minha vida. A bela Íris me acordou ao sussurrar ao meu ouvido.
- Veja Vitor. Veja isso! – Eu acordei e a vi como se nada tivesse acontecido, ela estava linda como antes. Até que ela colocou as mãos sobre o rosto e gritou.
- Não! Não! – enfiando as unhas em suas órbitas arrancou os próprios olhos de uma maneira bizarra e estendeu as duas mãos para mim. Eu pude ver os olhos dela como fossem bolas de cristais mostrando todos aqueles rostos, vi até mesmo a primeira delas, Alexia, ela sorria, um sorriso banguelo e sangrento. Uma das mãos havia sido decepada assim como alguns dentes que foram arrancados com um alicate universal. Os cabelos e o couro cabeludo haviam sido arrancados, ela era perfeita, ela era tão perfeita...
- Me salve papai! – Ela dizia e então Íris cerrou os punhos e espremeu os próprios olhos, olhou para mim e me disse:
- Me coma seu filho da puta! Me coma!
Eu acordei banhado em suor. Olhei para Estela, ela estava amarrada como as outras, olhava para mim com aqueles olhos chorosos. Pensei em Alexia, tudo aquilo era por causa dela, chorei enquanto Estela gritava desesperada ao ter seus cabelos arrancados de maneira brutal. O sangue minando de seu couro cabeludo. Depois as pequenas orelhas eram cortadas com uma tesoura, as laminas se encontrando e mascando a cartilagem da jovem moça sendo que nem mesmo seus singelos brincos haviam sido retirados. Olhei para ela que sangrou até a morte.
Àquela noite não tive pesadelo algum, estava exausto.
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02 de junho – Vanessa
Ela seria a ultima e eu estaria livre. Olhei para a menina, ela devia ter oito anos, era branca, magra, e a voz era suave e tão infantil.
Lembrei-me de minha irmã. Aquilo havia acontecido há tanto tempo. Eu sabia que aquela seria a ultima. Ela olhou para mim, parecia enxergar meu interior, sabia que o assassino que estava ali não tinha nada a ver comigo.
Olhei de volta para ela, contemplei a inocência daquele olhar e percebi que aquilo talvez nunca acabasse. Olhei para ela e decidido falei que arrancaria as mãos dela, eu mesmo faria isso, e depois a mataria de uma maneira que nem mesmo ela poderia imaginar.
Nem mesmo eu podia suportar o ódio que era expresso em meus olhos.
...
Dia 12 de outubro de 1999
Eu tinha cinco anos, minha irmã tinha pouco mais que eu, ela tinha apenas sete anos. Estávamos brincando no parque, meu pai descuidou-se por cerca de cinco minutos para comprar-nos algodões doces em uma manhã ensolarada de domingo.
Alexia estava no balanço, eu descia pelo escorregador, quando vi que meu pai estava indo em direção ao moço do algodão doce, sorri de felicidade e corri na direção dele.
- Eu quero o azul papai! O azul! – eu disse enquanto o moço gentilmente me entregava.
- Um azul para você e um rosa para Alexia, Vitor – e então ele me entregou os dois, e quando me virei para ir em direção a minha irmã, ela simplesmente havia desaparecido.
- Cadê ela papai? – Ele se virou e lembro-me bem de ver seus olhos arregalados vasculhando a imensidão do parque. Nem nos brinquedos, nem nos bancos de madeira, ela não estava mais ali. Papai a chamou pelo nome, ele gritou enquanto me carregava no colo, demos várias voltas por toda área do parque municipal e não encontramos nada.
Dias se passaram, depois meses, e anos, e no terceiro ano quando esperança alguma existia ela foi finalmente encontrada. Ao menos pedaços de seu corpo.
Minha irmã havia sido violentada de todas as formas possíveis, segundo o que os exames revelavam. Mal se sabia a forma como ela havia morrido, alguns especialistas diziam que ela devia ter sido assassinada.
Ela foi encontrada na casa de um homem, o nome
dele era Aguiar. Ele tinha 43 anos, era um homem considerado calmo, teoricamente um cidadão pacato da sociedade.
Em frente a sua casa havia um jardim onde
supostamente passava a maior parte de seu tempo já que era aposentado por invalidez. Havia perdido o movimento do lado esquerdo do corpo após um AVC precoce aos 21 anos de idade.
O corpo de Alexia só foi descoberto quando as investigações referentes ao desaparecimento de uma jovem de oito anos chamada Paloma levaram diretamente até ele. Uma testemunha o viu dando a mão a menina que estava sozinha no parque brincando enquanto o pai lia um jornal distraído sentado em um banco a cerca de dez metros do brinquedo onde a menina se divertia.
Segundo a testemunha o homem passeava tranqüilo com um cachorro poodle, e foi justamente isso que a fez reparar no homem, a testemunha amava cães, o homem parou a cerca de cinco metros do brinquedo e a criança sorriu ao ver o cão latindo. O homem sorriu de volta e a testemunha percebeu algo estranho naquele olhar, algo sombrio e enganador. Logo ele chamou a menina que foi em direção ao cão, o homem se agachou próximo a ela e a deu algum doce, a menina aceitou e ele falou algo ao ouvido dela, tudo havia acontecido muito rápido.
A testemunha foi em direção ao pai da criança que ainda que ainda lia o jornal, quando ela falou para ele sobre o homem rapidamente ele se levantou. Ambos voltaram seus olhos em direção ao homem, ou pelo menos onde ele estava, mas não havia sinal dele e sequer da garotinha.
Uma semana depois graças à descrição que a testemunha havia passado, o suspeito foi encontrado. Entraram na casa dele, tudo era normal, uma casa grande para apenas uma pessoa. Eles procuraram em todos os quartos, mas não havia nada, cômodo por cômodo e a policia não encontrava nada. E foi por pura sorte, quando o homem, o Sr. Aguiar dono de uma serenidade desconcertante já se dizia possesso com todo aquele clima e acusações criadas para com ele, foi justamente no momento da queixa que uma barata saiu caminhando pelo assoalho.
Uma mulher, a policial Alicia Fernandes, olhou
enojada para o animal e por mero acaso seus olhos perseguiram a criatura peçonhenta que seguiu pelo corredor até um buraco na parede, um buraco denunciador acima do rodapé. Ela entrou e logo foi vista uma espécie de luminosidade reveladora.
- Mas o que é isso? – Perguntou a policial, quando o homem se voltou para o buraco que ele ainda não percebera, e ainda maior era a surpresa ao ver que o que refletia ali era justamente parte do cabo de uma colher de alumínio, que havia sido usada supostamente por minha irmã em uma tentativa de cavar a parede de um cômodo escondido dentro da própria casa. Um corredor de não mais que um metro e meio por quatro metros de largura.
O local onde elas eram presas era como uma cabine acústica, a prova de som, a entrada era pelo sótão, mas como havia uma portinhola no corredor que ficava próximo a sala, mal se percebia que havia outra entrada para uma falsa parede. Lá naquele quarto havia uma cama, algemas, correntes, cordas, um chicote de três pontas, drogas, uma bolsa repleta de facas afiadas e uma menina que não era minha irmã. Minha irmã estava enterrada no jardim, havia morrido a cerca de três dias, por isso ele procurou outra. Tudo os apetrechos ficavam trancados dentro de uma caixa de concreto. A vitima ficava solta ali, sem acesso a nada, e foi assim que ele a matou, ou pela hipótese mais real, morreu depois de ter engravidado dele.
Papai e mamãe se divorciaram depois de um tempo. Ela podia tentar não o culpar, mas o culpava. Mamãe me tirou de meu pai, ele virou um alcoólatra, fiquei se vê-lo por seis meses até o dia em que mamãe morreu de um mal súbito.
Papai me pegou na casa de meus avós, lembro-me bem daquele dia, ele estava de terno e gravata, algo completamente estranho sabendo que meu pai nunca fora um homem de usar tais trajes. Mas eu mal sabia para onde estávamos indo. Paramos em frente a uma grande escadaria, uma multidão gritava culpado em frente ao prédio e só aí ele apontou para um homem, o homem que andava manquitolando.
- Ta vendo aquele homem filho – eu vi o olhar de meu pai e nunca me esqueci daquele olhar – esse desgraçado está solto por que é um maldito demente, um louco – eu ainda não entendia o que papai queria.
O homem olhou para papai e então para mim. Ele sorriu tal qual o diabo vestido de toda sua prepotência e naquele a partir de então o odiei.
Papai arrancou o carro e voltamos para nossa casa. A noite ouvi o barulho do portão da garagem sendo aberto e vi que papai estava saindo. Corri até a janela e fiquei ali até que ele voltou. Ele não me viu aquela noite. No outro dia por volta das nove horas, dois policiais foram até minha casa e o levaram, sem prova alguma ele regressou em dois dias.
O homem havia desaparecido, Aguiar nunca foi encontrado. Fiquei na casa da vizinha nesses dois dias.
O tempo passou, papai ficou enlouquecido, falava sozinho, falava com Alexia como se ela estivesse correndo e brincando pela casa.
- Alexia pare com isso! Querida venha comer seu lanche! – e a mesa era posta como se Alexia estivesse por ali. Depois dizia que era melhor ele não ter reclamações sobre ela na escola, pois nossa mãe o havia abandonado. Chorei por noites, chorei uma vida até que meu pai chegou com uma menina em casa, o nome dela era Cecília.
- Alexia, já disse! Pare de brincar de ter outro nome! Não gosto disso! – ele disse.
- Papai, essa não é Alexia – eu adverti em vão e na segunda vez que falei, ele me agrediu com o soco.
Desmaiei e acordei amarrado ao pé da mesa, ouvindo o som de bater das marteladas. Uma semana depois eu estava preso em uma jaula que era acorrentada ao teto, como um pássaro. Estava em um quarto escuro, que não conhecia. Olhei para baixo e papai sorriu para mim.
- Veja, olha como ela se parece com sua irmã, não foi minha culpa filho. Vitor ela é sua irmã não é? – eu estava apavorado, papai havia cortado os dedos da menina e pintou as unhas dela como mamãe fazia com as de Alexia. Uma de cada cor. A menina estava morta por sobre a mesa de madeira – Você precisa me ajudar a trazê-la de volta! Me ajude!
- Não! Você está louco pai! – eu gritei, e então ele disse que precisava fazer com que eu enxergasse a dor dela e a cada morte ele me fazia uma cicatriz, foi assim durante anos.
No inicio me perguntei o porquê de tudo isso, afinal o que leva uma pessoa a matar crianças, seqüestrá-las, prende-las em um quarto escuro, abusar sexualmente delas, cometer atos obscenos e brutais? Por que eu tinha que ser um assassino? Eu não queria ser assim, eu nunca quis... Eu não quero!
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02 de junho de 2013 - Fim
Ela seria a ultima e eu estaria livre. Olhei para a menina, ela devia ter oito anos, era branca, magra, e a voz era suave e tão infantil.
Lembrei-me de minha irmã. Aquilo havia acontecido há tanto tempo. Eu sabia que aquela seria a ultima. Ela olhou para mim, parecia enxergar meu interior, sabia que o assassino que estava ali não tinha nada a ver comigo.
Olhei de volta para ela, contemplei a inocência daquele olhar e percebi que aquilo talvez nunca acabasse. Olhei para ela e decidido falei que arrancaria as mãos dela, eu mesmo faria isso, e depois a mataria de uma maneira que nem mesmo ela poderia imaginar.
Nem mesmo eu podia suportar o ódio que era expresso em meus olhos.
- Ela tem as mãos da sua irmã! É alexia se
manifestando de alguma forma filho! – disse o velho louco enquanto olhava para a coleção de membros humanos que ele julgava ser parte de Alexia, mas havia tantos... Olhei para ele e tive que dizer que arrancaria as mãos dela, era a única chance que eu tinha.
- Eu faço isso papai – os olhos ficaram mais vivos que o normal – você tem razão, é Alexia. Vou arrancar os braços e depois vou matá-la.
- Ele então desceu a jaula liberando a corrente enquanto a carretilha girava. Quando cheguei ao chão ele abriu a jaula e me deu um abraço. Nem mesmo aquele calor paternal poderia me cegar naquele momento, meu pai era um maldito assassino, um demente como o próprio assassino de minha querida irmã. E suspeitava até que ele poderia envenenado minha mãe. Pensei nisso por anos, mas não chegaria a conclusão alguma.
- Papai, será se poderia me dar algo para beber antes. Já tenho dezenove anos então não há problemas há? – perguntei.
- Não filho, pensando bem você já é um homem. Pena que sua irmã não possa te ver agora, mas logo ela estará aqui, ela está voltando aos poucos – ele deu uma pausa – seremos uma família feliz de novo, eu vou buscar a bebida.
Ele subiu a escada e abriu a portinhola, o quarto foi projetado com a mesma idéia do quarto do Sr. Aguiar, porém era mais alto, a entrada também era pelo sótão, e a portinhola era debaixo de um sanitário dentro do banheiro que foi feito no cômodo que podia ser usado como um quarto, era um banheiro desativado. Ele saiu e logo olhei na direção da bolsa por sobre a mesa. Peguei a enorme faca de açougueiro e andei na direção de Vanessa, ela tremeu, olhou em meus olhos sabendo que eu não era como meu pai, mas ainda assim teve medo.
- Calma, eu vou te soltar – Cochichei e ela acenou com a cabeça meio trêmula – Fique aqui até eu voltar, ele não vai te fazer mal.
- Saí do quarto onde vivi por anos e fui em direção
a meu pai, desci a escada do sótão e entrei no corredor, tudo ainda estava idêntico ao que minhas memórias me passavam. Desci as escadas em direção ao primeiro piso e ouvi o barulho dele mexendo na cozinha e sua voz chegou aos meus ouvidos.
- Viu querida, seremos uma família de novo. Desculpe o papai querida, eu devia ter ficado perto de você – então ouvi soluços e um choro penoso. Me comovi e desci as escadas em direção a ele, virei na direção da cozinha e o chamei.
- Papai – ele se virou em lágrimas – não foi sua
culpa.
Papai chorava como uma criança, ele soltou a bebida que nos preparava e ouvi o som das taças caírem ao chão. Fui até ele escondendo a faca e o abracei com grande carinho, o carinho de filho que ainda restava.
- Vamos ficar bem papai, você pode esquecer isso tudo, pode – eu queria que ele ficasse bem.
- As mãos dela filho, são as mãos dela você viu – não adiantava, ele estava louco – vamos lá Vitor, você precisa me ajudar a trazer ela de volta, quero ficar perto de minha filha novamente.
- Claro papai, você vai – disse enquanto as lágrimas brotaram de meus olhos em chamas – papai, eu te amo! – me declarei abraçando-o com toda minha força e enfiando a faca nas costas dele profundamente, papai morreu nos meus braços, senti seu corpo caindo até que os joelhos dele tocaram o chão e eu fui junto. Não queria soltá-lo.
Eu queria acreditar que estaria com ela, mesmo depois de todo mal que ele fez, mas não me atrevi a pensar em algo diferente, não, não me atrevi.
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O juízo final
Os degraus da escada de mármore imperial pareciam ser a maior escalada de minha vida. Nos olhos o ódio e as lágrimas se misturavam dentro do espelho de minha retina, enquanto nas mãos trazia a arma providencial para o ultimo homicídio.
Ao girar compassado dos ponteiros de meu velho Rolex, herança de meu maldito pai, continuava a caminhar até o quarto onde havia prendido a jovem Vanessa. A escada já havia findado, agora restava atravessar o pequeno corredor que dava para a porta do quarto, aquele quarto escuro...
No fim do corredor era a portinhola, subi-a e fui de encontro a Vanessa. Nas mãos eu carregava o destino de uma vida. Olhei para menina que jazia encolhida como um rato assustado.
- Vá embora, corra até a casa da frente, bata, diga seu nome, se não atenderem, corra para próxima, logo eles estarão aqui – A menina me abraçou e fugiu olhando curiosa para o que eu carregava.
Olhei para a jaula onde papai me manteve preso
por todo aquele tempo, me deixando assistir cada morte sem poder fazer nada. Certo dia papai estava bêbado demais e me revelou como matou o homem aquela noite.
Ele foi até a casa dele e apontou a arma, fez com que o homem entrasse no carro e o levou para um lugar onde ninguém iria encontrá-lo, levou-o até o lago. Lá ele surrou o homem, chutou-o, socou-o com toda força e ódio. No fim, cuspiu na cara dele.
O homem implorou para que ele não o matasse, ele dizia que não pôde se controlar. Ao ouvir aquilo papai atirou nas duas pernas dele e amarrou cada pé a uma pedra de cerca de um quilo e meio cada, lançando o homem no lago. O homem afundou gritando em meio a dor e ao desespero, afogou-se nas águas mágicas daquele lago, e aquela magia o manteria lá para sempre.
Olhei para a argola onde a jaula ficava presa e
olhei para minhas mãos. Avancei o botão do disjuntor que acionava a subida da jaula e entrei dentro dela enquanto a grade afastava-se do chão.
Precisava fazer o que era certo, devia tirar a ultima vida e cumprir com minha promessa de vingança, mas nem sempre o que é certo é certo, é? Amarrei a corda que carregava nas mãos a argola que prendia a jaula. Passei o laço pelo pescoço e senti o tecido envolver minha pele. Olhei por uma ultima vez para aquele quarto e me lembrei de Alexia aquele dia no parque, deixei meu corpo cair e senti a corda pressionar meu pescoço. Quando acordei ainda estava com os dois algodões doces na mão, um rosa e um azul, Alexia correu de encontro a mim e me recebeu, olhou em meus olhos pegou o algodão doce e me beijou a face e então se despediu de mim, aquilo foi só um sonho.
Acordei de verdade em um quarto branco, diferente do que estava acostumado a dormir, ao meu lado Sheila e sua mãe. A vizinha da frente, a mesma que cuidou de mim aqueles dois dias havia entrado na casa depois de Sheila tê-la pedido socorro e cortou a corda onde eu me enforcava. Eu já inconsciente fiquei no CTI por três meses, estou feliz por que sei que minha irmã está melhor agora, sabendo que papai não fará mais nada de errado e pagará pelos seus erros. Eu estou em uma casa de recuperação, mas é tão calmo, eles estão me ajudando a entender...
- Vitor, hora de parar de escrever um pouco, você tem visitas! – Disse a voz da Doutora Michely, e logo eu soube que Vanessa estava ali, ela sempre vinha me ver.
Fim!