Melodia da escuridão

Ah, tinha que admitir, estava se borrando de medo.

Tentava motivar-se a seguir em frente com um ânimo que não sentia, mas não poderia voltar, simplesmente não podia, morreria se o fizesse.

Uma inquietação estranha o invadiu. Virou-se para trás lentamente, quase paralisado pelo medo do que nem sabia se existia. A lanterna agora iluminava o caminho pelo qual viera sem nada encontrar, apenas o mesmo corredor com as mesmas paredes de metal lembrando “geladeiras” de um necrotério.

Voltou-se para frente e logo se arrependeu de tê-lo feito tão bruscamente. Sua gasta e sensível lanterna começou a piscar descontroladamente. Congelou. Se a lanterna parasse de funcionar, estaria perdido. Apertava-a com tanta força que ficou preocupado de esmagá-la. Prendeu a respiração. A dançante lâmpada solta fazia um surtante movimento pendular: Esquerda, direita, esquerda, direita... esquerda... direita... parou. Tinha que tomar mais cuidado.

Retomou a caminhada e logo chegou a um amplo aposento, mas tão amplo que a luz de sua lanterna era engolida pela escuridão antes de encontrar alguma parede senão a atrás de si. Estava em uma passarela de metal com um enferrujado corrimão. Tentando imaginar o porquê da ferrugem, a resposta ficou clara. Goteiras por todas as partes, corroendo lentamente aquele esquecido metal subterrâneo.

Sentiu uma leve brisa e sobressaltou-se. Se havia vento, havia abertura, e se havia abertura, poderia estar em perigo. A passarela começou a tremer, e, preocupado com o possível colapso da estrutura, apressou-se para chegar em chão firme. Quando transferiu seu peso para o concreto, foi surpreendido por um espetáculo.

A brisa que passava fazia com que o triste metal soltasse uma solene melodia. Bem baixo e muito grave, o som foi aos poucos aumentando e preenchendo o ambiente. Era tão majestoso e ao mesmo tempo tão melancólico que ficou emocionado. Sentia como se cada célula de seu corpo estivesse vibrando junto com o metal, fazendo-o arrepiar. Era impressionante. Era como se o metal o chamasse, pedindo para que não fosse embora, que não o deixasse novamente sozinho. Nunca achou que ouviria algo tão repentino e bonito vindo de um lugar tão improvável.

A brisa foi diminuindo até cessar, e pouco depois, também o metal cessou sua cantoria, fazendo com que o manto de silêncio novamente cobrisse aquele escuro aposento. No escuro com a lanterna mirando o concreto, uma epifania o atingiu. Tinha certeza que se alguém o visse naquele instante, poderia detectar um brilho em seus olhos.

Seus olhos marejaram. A melodia era a mesma que ressoava dentro de seu apertado peito.

Ele sentia como se aquele cômodo fosse o interior de si mesmo. Melancólico, solitário, desesperançoso.

Largou sua mochila em um canto em baixo da plataforma e deitou em seu saco de dormir. Não importava se morresse ficando ali ou qualquer outra coisa lhe acontecesse.

Não poderia abandonar aquele lugar que era si mesmo.

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