ENTRE CAIXÕES - PARTE II

Astrobaldo levantou num salto, medroso como ele só. Sua mãe disse-lhe:

- Acorda filho, venha tomar seu café, depois vá deitar-se um pouco na cama.

- Sim mainha, já estou indo.

Na mesa o café exalando fumaça, na macaxeira derretia a manteiga. Astrobaldo ainda sentindo vestígios do pesadelo, obedeceu sua mãe, comeu e logo estava aos roncos em sua cama.

Enquanto Astrobaldo descansava, sua mãe aproveitou para deitar-se também, afinal não havia pregado os olhos a noite toda. Caiu em sua cama, e logo intentava levantar-se para os afazeres do dia. E não demorou muito tempo quando bateram a porta: toc...toc...toc... a mãe de Astrobaldo avexou-se em levantar-se, e caminhou até a porta, quando:

- D. Maria viemos buscar a encomenda, já está pronta?

- Sim meu filho, está logo ali atrás. Entre pode pegar.

E o moço pagou pelo serviço e adiantou-se a pegar o caixão, mas não se sabe por que estava tão pesado. E com muita dificuldade carregaram o caixão até o seu destino. E para surpresa de todos, quando abriram o caixão o falecido já fazia jus ao seu bem, deitado estava em sua eterna morada. Ninguém entendeu nada, também como iriam entender o sobrenatural.

Ornamentaram o caixão do defunto que dormia tranquilo, e logo começou a chegar parentes, vizinhos e amigos, para o último adeus.

A família pranteava a perda do ente querido. Voltando a Astrobaldo, este dormia como um anjo, quando acordou de sobressalto gritando por mainha, que se avexou em saber o que ocorria.

- Mainha socorro, me ajude!

- O que foi meu filho?

- Mainha um grupo de falecidos estão vindo atrás de mim, eles querem me pegar.

- Acalme-se filho, foi só um pesadelo.

- Foi não mainha, e até o Tonhão do boteco estava entre eles.

- Ora meu filho, deixe de bobagem, o Tonhão está vivo.

- Tá não mainha.

- Vixe que você está pior do que imaginei, deve ser o seu medo em fazer caixão.

- É não mainha, eles estavam mesmo mortos.

Enquanto isso o entardecer, o sol já se ia no horizonte, enquanto a noite se anunciava. Aquela noite parecia calma e logo todos se recolheram, Astrobaldo e sua mãe cansados da noite anterior, logo caíram no sono, o mais profundo.

E estando todos em paz em seus sonos, eis que bateram tanto na porta que pareciam que botariam abaixo. Dona Maria exausta, acordou de um sono pesado e ainda cambaleando, levanta-se e calçou um par de chinelos jogados ao lado e saiu arrastando-os. Astrobaldo não acordava nem por um Decreto.

Ao girar a chave na porta, e com muita dificuldade arrastou a, tentando abrir, dando de cara com diversas pessoas, que gritavam:

- Dona Maria, nos socorra, precisamos dos serviços de Astrobaldo, houve um acidente na estrada, houve muitas mortes, a maioria são nossos vizinhos, vamos precisar de muitos caixões.

Dona Maria ainda tonta de sono, bocejou, enquanto ouvia aquele alvoroço. E acordando definitivamente, encaminhou-se ao quarto para acordar Astrobaldo. Pobre menino, tão menino e com a responsabilidade de suster a casa. Enquanto isso:

- Filho! Acorda! Precisamos fazer caixões, há muitos mortos, vamos levante.

Astrobaldo, coitado caindo de sono encaminhou-se para a oficina, dando início ao seu trabalho. Teria que fazer vinte e dois caixões, quando ele iria terminar ninguém sabe, afinal ele era apenas um garoto. E deu início ao seu trabalho, sua mãe ao seu lado procurava ajudá-lo no que fosse possível, lixava daqui, envernizava ali, polia acolá, e assim ajudava como podia.

Para o serviço sair mais rápido, Astrobaldo começou a cortar a madeira, em tamanho padrão, não importava o tamanho e peso do defunto, todos teriam o mesmo tamanho de caixão, porque um trabalho em série é mais rápido. Ele trabalhou uma noite, a base de café para não dormir, a segunda, terceira e quarta noite, as vezes tirava um cochilo de trinta minutos. E ao final de quatro dias os caixões estavam prontos.

Houve um funeral em série na cidade e entre eles se encontrava o Tonhão do botequim, e quando Astrobaldo o viu, deu um grito para a mãe.

- Mainha! Eu não te falei que o Tonhão estava morto, correndo atrás de mim?

- Sim meu filho, você falou.

Astrobaldo trabalhou muito, mas também começou a ganhar muito dinheiro. Pensou grande, comprou máquinas industriais, e no terreno da mãe levantou uma oficina maior e mais confortável. Sua fama correu pelas cidades vizinhas, e Astrobaldo começou a receber mais pedidos do que podia atender, logo ele contratou ajudantes e ensinou o ofício. Astrobaldo passou a fazer pronta entrega e guardava na oficina, quando os pedidos chegavam era só entregar. Os anos se passaram e logo ele já era um rapaz. Seus negócios cresceram tanto por ter qualidade e pontualidade. Astrobaldo era muito ambicioso e diversificou seus negócios, passou a fabricar também móveis coloniais, diziam na redondeza que perfeição melhor não havia.

Em pouco tempo Astrobaldo era um grande comerciante, próspero, e por que não dizer um dos homens mais ricos de sua cidade. Dizem as más línguas que ele até fez pacto com o demo.

Certa noite deitou-se em sua cama, e logo estava envolto de mortos, caiam por cima dele, quase o sufocando, Astrobaldo tentou correr, mais estava paralisado, tentou gritar e a voz não saia, e não sabia o que fazer, quando uma labareda de fogo amarelo mesclado com vermelho incendiou em seu quarto, eis que surge um personagem em meio as chamas que desafia qualquer terror, sua pele avermelhada, na cabeça dois leves chifres, um grande rabo peludo balançava em meio as chamas de fogo, enquanto aquele personagem rosnava furioso a dizer:

- Eu vim te cobrar! Você me deve e tem que me pagar!

- Eeeuu... devo o que?

- Você sabe muito bem!!!!

As chamas tomaram conta do aposento, enquanto Astrobaldo gritava correndo em chamas...

Continua...

Rivanda De Siqueira
Enviado por Rivanda De Siqueira em 23/04/2013
Reeditado em 04/05/2013
Código do texto: T4255285
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