Virus 2 : Castigo Divino

Alguns acham que é castigo divino , outros que é o fim dos tempos , a porta do inferno abriu , ouvi uma garota dizer ontem . Ninguem quer assumir a culpa de nada , preferem direcionar as respostas a algo sagrado , religioso , divino . Foi bom encontrar esse grupo de pessoas depois de quatro meses vagando sozinho , dormindo encolhido em banheiros ou acuado em bueiros sujos . O cheiro dos não infectados ja não se diferencia mais tanto assim dos infectados . Nesse acampamento a agua e racionada , e proibido tomar mais que um banho por semana , o que é um tempo muito longo quando se vive em cabanas sob o sol vestindo roupas sujas em meio ao lixo. As pessoas tentam disfarçar o medo , viver de forma caracturna , tensas , famintas , em silencio na maior parte do tempo . Mesmo assim na ultima noite dormi como não dormia a tempos . Ninguem dentro do lugar pode portar armas , somente os guardas que se revezavam durante a noite em torres montadas em postes de luz e arvores . Eles carregam as poucas balas quem teem . Foi um guarda numa dessas torres que me avistou quando me aproximava em busca de comida . Num primeiro momento tanto eu quando o ele ficamos alertas , pensando que se tratava de um contaminado . Um tiro roçou minha perna , como recuei procurado abrigo atras de um carro ele sacou que eu não era uma ameaça , pelo menos por enquanto . Tive de entregar minha faca de dentes e uma corrente que carrego para proteção, mais psicologica devo dizer , pois se um grupo de tres ou quatro avançar ao meu encontro pouco posso fazer com tão pouco .No acampamento me deram comida , deixaram que tomasse um banho curto , não mais que um minuto , e todos queriam saber de onde eu tiha vindo .

'' Da centro da cidade , me escondia no cinema esperando que um bando que rumava em direção ao mercado onde os fuzileiros se abrigam saissem do caminho ''

Queriam saber como estavam as ruas , se havia mais imunes ao virus .

'' Vocês são os primeiros que vejo em quatro meses ''

Contei a eles sobre o garoto que arrastava a perna quebrada . Disse que provavelmente ja estaria morto , pois eu o havia deixado sozinho em meio ao parque descampado , cercado de toda essa merda que povoa o mundo agora . O acampamento era repleto de crianças , uma duzia delas , limitadas a brincar proximas aos pais . A ultima criança que vi foi a tanto tempo que pensei que elas ja não existissem mais . Uma mulher chamada Leona estava gravida , disse que de sete meses , segundo o pai , um padeiro que ajuda como cozinheiro no acampamento me disse que ela queria tirar a criança , não queria que o filho nascesse para servir de caça . A pobre mulher ja havia perdido as esperanças de que uma cura fosse encontrada . Talvez ela esteja certa , logo que a unica resposta que temos do governo e uma gravação que passou a ser transmitida pelo radio a um mes . A gravação diz para todos seguirem para o litoral , diz que a comida e agua , proteção para queles que quiserem se arriscar por seiscentos quilometros de cidades e estradas recheadas de merda e morte . Bem , mas ninguem estava certo de que a voz no radio pertencia a alguem do governo ou se haveria mais proteção la do que em qualquer outro lugar .

'' São os fuzileiros , provavelmente são os fuzileiros tentando atrair grupos para saquearem ''

Os fuzileiros são um grupo armado que se tornou uma ameaça tão grande quanto os contaminados . Fazem arrastões , levam mulheres e crianças ; matam os velhos , os feridos , os doentes . Cada grupo de fuzileiros toma conta de si , tudo o que fazem e não entrar em conflito com outros grupos , não invadindo territorios e trocando informações pelo radio .

'' Não acho que devemos sair daqui ''

Foi isso que Vanessa disse . Ela e a mesma que acredita que tudo isso que esta acontecendo e um castigo .

'' Estamos mais seguros aqui , juntos , longe das cidades ...''

Eu não tinha muita certeza disso . Quando me aproximava do acampamento encontrei o corpo de um contaminado morto bem proximo ,mais tarde vim a descobrir que foram os proprios guardas que haviam matado aquele .

'' O avistei numa manha , dois dias antes de vocÊ chegar ''

Disse Maicon , o guarda que o tinha matado .

'' Estava montando guarda de cima daquele poste , foi então que o avistei . Precisei de dois tiros ''

O corpo do contaminado ja não tinha metade da cabeça . Segundo Maicon foi ele quem arrancou a metade com um tiro .

'' Tinha mais alguns com ele ? ''

Perguntei . Eu nunca vi nenhum deles caminhando sozinho . Sempre estão em bandos .

'' Não , meu chapa , esse estava sozinho , se tivessem outros com ele eu tambem os teria matado ''

Foi logo depois que ouvi a historia que tive certeza de que aquele lugar não era tão mais seguro que os banheiros ou qualquer outro buraco . Se uma daquelas coisas rumava naquela direção , outros certamente estavam fazendo , falei isso para o guarda , mas estava muito cheio de si por ter matado um , e mesmo que quisesse me ouvir estavam muito confortaveis com as condições que tinham ali .

Falei com Vanessa sobre isso , sobre os contaminados poderem estar usando aquele caminho . Mas não acreditava que alguma coisa pudesse acontecer a eles .

'' Talvez eles estejam tão assustados quanto nos , ja pensou nisso ? ''

Disse Vanessa .

'' Se realmente caminham em bandos , talvez seja porque tenham medo , talvez nos sejamos os montros aos olhos deles . ''

'' Não vejo ninguem aqui com sangue seco na roupa ou carne podre nos dentes . Essas coisas matam pelo simples prazer de matar , agem como cães raivosos , não acho que tenham medo de nos , somos nos que estamos vivendo escondidos e assustados . É Leona quem prefere ver o feto que carrega na barriga morto na sua frente a servindo de presa para essas coisas . Não é castigo nenhum o que esta acontecendo aqui , simplesmente nos tornamos animais , passamos a agir bestialmente matando e caçando , nos alimentando de sofrimento e dor . Simplesmente evoluimos para isso .''

Vanessa não concordou com o que eu disse . Eu de fato não concordava , simplesmente não conseguia ouvir sua versão romantica dos fatos . Antes de deixar o acampamento perguntei se ela queria vir comigo .

'' Para onde esta indo ? ''

'' Qualquer lugar , acho melhor em movimento a ficar parado , esperando um bando dessas coisas atacar durante a noite , desarmado ... e tambem não quero ver ninguem morrendo enquanto fujo sem poder fazer nada . ''

'' Acha que vamos morrer ? ''

'' Se atacarem sim . ''

Me deram um pouco de comida e agua quando parti . Maicon ofereceu uma arma pequena com uma bala .

'' E tudo que posso lhe dar ''

Disse ele . Ambos sabiamos que aquela bala não era para ser usada em um contaminado , foi por isso que recusei , porque sabia que a usaria caso levasse . Usaria durante a noite , quando os sons , os gemidos , o caminhar de pes descalços , o silencio dos passaros e o cantar perturbador dos grilos se tornam insuportaveis . Bem , são seiscentos quilometros até o litorol , até a voz gravada , até o possivel governo .

12/03/2013

11h15m

Cleber Inacio
Enviado por Cleber Inacio em 12/03/2013
Código do texto: T4184246
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