Morte Escura - DTRL

Saudações, meu nome é Lauro e vim por meio desta fazer saber aquém se interessar em ler minha história.

Sábado, dez da noite, meus amigos e eu estávamos no quintal de casa, o portão estava aberto, a noite clara e a rua bem iluminada, menos no seu final, onde árvores grandes com seus vastos e viçosos galhos e cheios de folhas tapavam as luzes. Conversas fúteis surgiam e acabavam aos sons de intensas risadas, potencializadas pelo bom vinho que consumíamos com grande gosto, afinal estávamos em uma noite de julho e o frio pedia algo para aquecer nossos corpos e melhor por estar em companhia dos amigos, acompanhados com fundo musical, vindo de uma caixa de música em que um pendrive fornecia os mp3, com muito Rock ‘n’ Roll, para o nosso deleite.

Em dado momento olhei para a rua e vi, bem ao longe, no final da mesma, um vulto atravessar a rua de lado a outro e sumir no muro da concessionária de energia.

— Que porra é essa? - Pensei alto.

— Que foi Lauro?

— Caramba! Acho que vi um cara atravessar a rua e sumir no muro lá no final...

Não tive tempo de terminar o meu raciocínio, meus amigos estavam rachando de rir da minha cara.

— Que barato você tá usando hein Lauro? Divide com a gente... Ou só você quer ficar doidão?! Ha! Ha!

Nem quis retrucar, sabia que seria pior, depois das gozações, retomamos as conversas com outros assuntos e acabei esquecendo-me do que vi. Assim a noite esvaia-se e pelas três e trinta, meus amigos despediam-se de mim e cada um seguia seu rumo, evidente que todos já muito alegres com a quantidade de álcool ingerida e por reviver velhos tempos. Eu ainda fiquei ali, estava limpando a bagunça e o portão continuava aberto. Juntei as bitucas de cigarro, uma varridinha rápida e juntei tudo num saco de lixo, andei até a lixeira, depositei o lixo nela e já estava tornando à minha casa quando olhei para a via e lá notei novamente a figura mal distinta, escura, atravessando de volta, indo desaparecer na sombra da árvore.

Aquilo me incomodou, “que merda é essa” pensei, adentrei em meu lar e busquei uma lanterna, desci a rua que tem uns cem metros de comprimento e morre na avenida principal do meu bairro. Chegando perto da árvore, acionei a luz, estava bem escuro por causa da sombra que existia e para completar a lâmpada de um poste próximo estava queimada, olhei no muro, olhei em volta do tronco e para cima nos galhos, nada, um silêncio tremendo existia e me confortava por não haver ninguém a essa hora na rua e me ver igual um maluco procurando por um “homem sombra”.

Mudei de ideia ao enxergar uma nódoa escura no chão da encruzilhada, o contorno de uma figura humana, sombra essa que se aligeirou a esconder-se nas trevas já na avenida. Acelerei meu passo e ganhei o meio da via, ao lado da entrada da minha rua há um bar ao qual a cobertura serve de proteção para as pessoas que embarcam nos coletivos. Uma garoa fina molhava meu rosto agora e pensei que o suposto homem seguiu para a cobertura, caminhei devagar, o poste que iluminava aquele lugar ficava um pouco distante e a luz difusa estava mais fraca devido ao sereno e uma bruma leve. Cheguei ao ponto de ônibus e mais uma vez me deparei comigo só, a névoa diminuiu e a luz irradiava do alto e a minha frente, produzindo minha sombra no meu lado direito, pegando o piso de concreto e parte do asfalto.

A paz foi quebrada por um latido alto de um cachorro no meio da avenida, assustei-me, meu coração quase saiu pela boca, cheguei a ver seus olhos cintilarem olhando em minha direção, respirei fundo e mirei ao chão do meu lado, estremeci, mais uma sombra existia, minha espinha gelou, mas não enxergava ninguém, ao me virar, minha errônea constatação foi para as picas, uma mão forte catrafilou minha garganta com tamanha força que não conseguia mais respirar, fui suspendido ao ar, ainda consegui ver seu rosto, como que por ácido desfigurado, enlameado, das pálpebras brotavam vermes, disse com voz rouquenha e esparsa:

— Bem-vindo a minha maldição! Dela tu serás refém e perpetuará tua prisão nas trevas.

A criatura transpassou meu abdômen com a outra mão, senti minhas entranhas dilacerarem, puxou seu braço, trazendo com ele pedaços das minhas tripas e antes que eu desfalecesse de vez, abraçou com suas mãos a minha cabeça e com os polegares afundou meus olhos, estourando-os contra a caixa craniana.

Meu corpo foi achado em um terreno baldio, perto de onde eu morava, triste ver meus pais me enterrarem apenas com uma foto em meu caixão.

— Para você que acabou de ler isso, é minha sina agora continuar oque fizeram comigo, assim sendo já aviso o seu destino, eu apenas ceifo a vida, mas aqueles aquém eu não posso dizer, aprisionam o espirito nas trevas e os cegam para nunca mais enxergarem a luz, então fique longe das sombras, porque eu posso estar nelas... Ha! Ha! Ha!

— Que porra de texto medonho é esse, parece que foi feito pra assustar crianças! Bah! - Jorge disse isso amassando e jogando o papel almaço para longe.

Jorge trabalhava no período noturno, achou aquele escrito no chão e por curiosidade o leu, vinha voltando para casa caminhando, já que morava perto do emprego e não existiam linhas de ônibus que faziam o seu itinerário àquela hora, eram quinze para as cinco da manhã, madrugada de domingo e muito pouco movimento nas ruas. Ainda estava bem escuro, e as ruas com pouca iluminação, por causa de má conservação e também pelas árvores ao longo das vias, sua sombra misturava-se com as da vegetação.

O homem sentiu uma presença, assim como que estava sendo seguido, olhou para trás ainda sem parar de andar e nada viu, ninguém na rua, seguiu em frente, mas ao olhar para o chão viu mais uma sombra junto à dele, um arrepio fez os pelos de seus braços ficarem em pé.

— Assuuustooou?! He! He! He!

Jorge tornou pra trás e foi pendurado pelo pescoço, nas mãos de uma criatura horrenda, sem olhos, pele pútrida, coberto de lama, que continuou a dizer sorrindo, mostrando seus dentes negros.

— Prazer, eu sou Lauro. Bem-vindo criança, a agora, nossa desgraça! Ha! Ha! Ha! Ha!