Escolhas
A vida de João Gostoso era a mesma monotonia de sempre. Acordava às 3 horas da manhã, descia o morro da Babilônia, cumprimentava os traficantes e pagava o dinheiro da proteção, a escolha certa para não morrer. Entretanto, se revoltava. Achava errado ser explorado daquela forma. Até que um dia tomou coragem. Foi até a delegacia e fez um boletim de ocorrências. Sentia-se mais leve. Tinha tirado um peso de suas costas, havia feito a coisa certa. Foi ao bar 15 de novembro. Bebeu... Cantou... Dançou... Percebeu uma movimentação estranha. Algo estava errado. Saiu rumo à sua casa. Estava sendo seguido. Lembrou: não pagou a proteção. O medo tomou conta de seu corpo. Depois do primeiro tiro correu... Sabia que não podia ir para a casa. Então, para onde ir? Delegacia, era a escolha certa. Desviou dos tiros, entrou em ruas escuras, becos estreitos. Contudo, continuava a ser seguido. Com muito esforço, chegou ao seu destino. Estava salvo! Relaxou. No entanto, algo o acertou. Desmaiou... Quando acordou, sentia-se flutuar, sentia-se leve. Mas suas costas estavam acorrentadas a algo muito grande para uma pessoa conseguir se livrar sozinha. Sua visão começou a escurecer. Chegara ao fundo da lagoa. Literalmente.
Pobre João Gostoso, não sabia ele que a escolha certa nem sempre é a melhor.
O conto foi produzido tendo como inspiração o seguinte poema de Manuel Bandeira:
Poema Tirado de uma Notícia de Jornal
Manuel Bandeira
João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.