A ideia de escrever a primeira parte desse conto surgiu da mente do senhor Mauro Alves, inspirada em um filme já citado no primeiro capítulo, entretanto de agora em diante o segundo capítulo não é mais baseado em nada a não ser que seja "baseado mesmo"...kkkk... boa leitura pessoal e Mauro, espero que goste! Esse é para você, irmão!

A cidade dos Vampiros - Capítulo Final - O filho do inferno

  Ele disse que a cidade estava de ponta cabeça, logo deduzi que realmente aquele jovem policial era muito otimista. Talvez tenha sido por isso que resolvera me soltar, talvez não.

  Eu havia saído daquela delegacia apavorado feito um rato inofensivo. Era estranho ver que todos do nada estavam amaldiçoados, ou melhor, quase todos. Reconheci seu Josias, que era o único padeiro daquela pacata cidade. Estava com uma expressão horrível no rosto. As veias altas e os dentes, meu Deus, ele parecia o demônio dom suas sobrancelhas altas e espessas.

  Seus olhos que antes daquele inferno me transmitiam tamanha serenidade, naquele momento me intimidavam. O estranho naquilo tudo era que eu e alguns poucos outros habitantes ainda éramos pessoas normais. Ao olhar ao meu redor, nem tão longe assim de mim, nem tão perto que eu pudesse apalpar, o sangue escorria pelas calçadas. Criava caminhos entre os obstáculos e descia pelo asfalto daquela rua íngreme.

  Vi uma criança ser tomada das mãos da mãe. A mesma mãe que corria com um dos seios destampados, confesso que a mulher era um tanto quanto bela, formosa, diga-se de passagem. Pude ver ainda que de longe, dois pequenos orifícios próximos a seu mamilo, onde o bebe havia a mordido.

  Ela gritava com o homem que tomara o bebê, ele parecia normal, mas ao mesmo tempo era ainda mais infernal que os próprios vampiros. Sacou uma cruz de madeira, segurou a criança pelo cabelo. Só aí vi que a criancinha estava com os dentes mais crescidos, caninos sedentos de sangue, e nos lábios um misto do leite materno heterogeneamente misturado ao rubro do sangue de sua mãe, mãe essa que assistira ao homem que até então eu não reconhecia, cravar a ponta inferior e ligeiramente afiada da cruz no coração do pequeno.

  O grito da mulher, a dor que ela sentira, de certo foi maior do que a dor da criança. Deduzi isso visto que a criança queimara tão rápido que mal poderia ter tempo de sofrer. Já a mãe caia de joelhos e se entregava aos outros que logo a atacaram. O homem continuou matando quantos podia. Usava uma roupa negra, estranha, longa, não sei como não havia deduzido isso antes. Talvez pelo nervosismo do momento, talvez por ainda não saber o que nós éramos.

  O padre, aquele homem que matara o bebe, saiu correndo em direção a um beco, entrou em meio a escuridão nada sigilosa que o cercava e subitamente o vi sendo perseguido por uma infame multidão.

  Eu, não sei por que, ainda estava vivo. Mas parecia que seria por pouco tempo, visto que um estranho inimigo voltara a aparecer na porta da delegacia.

 - Oi Fernando – Ele me disse enquanto o encarei com tremendo horror. No que eu podia pensar, o que eu poderia fazer. Um bando de vampiros enfim parecia ter farejado meu sangue, e também começaram a me cercar. Fizeram uma roda e pareciam zombar de mim. Olhei para Carlos Augusto, ele ainda descia as escadas de maneira imponente.

  Pude ver seu corpo ainda se refazendo, ele mexia o queixo estranhamente, recolocando-o no lugar, e sua pele que estava toda marcada, meio amassada voltava ao normal enquanto caminhava. Ele parecia estar mais forte em relação a nossa ultima briga, obviamente que se ele era um vampiro, segundo as estórias isso seria normal, mas havia algo mais nele, algo ainda mais perturbador.

  Os vampiros continuavam a minha espreita, não entendia o que eles esperavam nem o porquê de ainda não terem me matado. Eu realmente não entendia.

  Senti que tudo ia acabar em breve, óbvio, os olhos de Carlos indicavam a morte, e muito provavelmente a minha morte. Encarou-me com um olhar tão amaldiçoado que podia ver as chamas queimando sua íris.

  Lembrei-me de minha amada, e em como ela poderia estar agora, lembrei-me de que Carlos iria matá-la. Tudo acabaria naquele dia. A cidade, Salem’s Lot estava sentenciada a morte e o que eu era? Mal sabia que eu era o principal culpado.

 - Imagine uma cidade só dos vampiros – ele me disse ao passar por dois de sua raça – imagine Fernando... Imagine um mestre maior do que seu próprio Deus, maior e mais vivo. Ele não se esconderia através de sua falta de humildade, invisível? Creia nele e ele cuidará de você? – Carlos agora queria discursar, ou ele estaria dando um sermão em Deus? Não sei, mas ele continuou enquanto gesticulava e caminhava, seus pés quase arrastando-se no chão. Os outros o espiavam, ele parecia um possível líder, mas ele? – essa será uma nova era, seu merdinha, e o nosso mestre está pronto para voltar, posso sentir a fúria, a revolta de todas as almas que um dia ele ceifou, sinta isso Fernando – Ele disse – sinta – ele repetiu.

  Confesso que não estava dando a mínima para aquele discurso. Queria apenas que tudo aquilo acabasse logo e que Deus impedisse Susana de sofrer. Baixei os olhos e o desafiei, interrompendo-o.

  - Vá se foder seu cretino! – Cuspi na cara dele – Foda-se esse discurso medíocre e satânico, dane-se o próprio Drácula, se é dele que está falando, acabe logo com isso! – esbravejei.

E ele? Ele sorriu desgraçadamente.

 - Foda-se! – me imitou, porém afeminando minha voz. Todos os outros dentuços riram, como um bando de marionetes – acabe logo com isso – ele continuava com seu tom sarcástico – quem você pensa que é? – ele perguntou limpando o cuspi que jazia em seu rosto.

  Não respondi.

  Não interessava, a cidade estava morta. Suzana de certo era um cadáver a uma hora dessas. Tive vontade de chorar, mas não na frente dele. Segurei-me como bom orgulhoso que era, porém meu interior estava dilacerado e um turbilhão de emoções adentrava meu ser causando reviravoltas em meu âmago.

 - Acha que só porque transou com Susana é melhor que eu? Ela adorava apanhar, seu otário – ele disse, e aquilo foi o fim para mim.

  Não pensei duas vezes, aliás, tenho certeza que sequer pensei, pois se tivesse pensado não teria avançado contra um vampiro no mano a mano.

  Cerrei meu punho e acreditei que quando minha mão o acertasse, meu soco teria a mesma intensidade quando da ultima briga, mas talvez até tenha tido, portanto aquele desgraçado estava incrivelmente forte. Eu é que senti uma imensa dor em meus dedos. Ele? Ele mal moveu o rosto. Minto, moveu sim, moveu os lábios para rir na minha cara.

  - Ofendi você? Ah, não se preocupe, eu vou cuidar bem dela.

  - Onde ela está,Carlos? Onde ela está?? – perguntei sentindo uma fúria enorme tomar conta de mim. Podia perceber a aceleração de meu sangue, o meu coração se decidindo se parava ou batia mais rápido querendo saltar para fora de meu corpo. Aquele cretino era a pior pessoa que eu conhecia no mundo até aquela hora, até aquela hora...

 - Ah, sabe quando é que o sexo era mais gostoso com ela? Sabe? Fernando, era quanto ela apanhava muito, ela ficava muito sexy. Ela sempre foi uma gostosa, uma sadomasoquista. Ela pedia para que eu batesse nela seu imbecil.

 Nunca havia ouvido algo tão tolo, bateria nele novamente, mas de que adiantaria. Eu estava possesso, porém tentava raciocinar ao máximo.

 - Vou te perguntar de novo, imbecil, quem vc pensa que é? – Ele perguntou.

  Eu não tinha nada a perder, estava querendo morrer logo mesmo. Como poderia eu matar aquele desgraçado? Não podia. Explodi.

 - Quem eu sou? Eu sou o cara que Susana ama seu imbecil! – Eu rosnei como um cão.

 - E porque você tem tanta certeza disso? – A voz chegou até mim como uma marreta de dez quilos batendo contra minha cabeça.

Senti-me tonto.

 - Suh? – Eu disse atônito.

 Ela? Ela sorriu copiosamente e o beijou em minha frente. Mas o mais estranho era que eu a via de uma maneira absurda.

 - Deus do céu, o que – eu queria perguntar mas não podia acreditar no que meus olhos estavam me proporcionando.

 - Surpreso amor – ela disse com ar de alegria – em breve você será o pai mais feliz do mundo – notei que a barriga dela movia-se estranhamente, algo que certamente ultrapassava o grotesco. A pele de sua barriga estava formando algo estranho, como bolsas de ar, implodindo. Bem, é tão anormal que é dificil exlicar.

 - Deus que diabos é isso? – perguntei aturdido, não conseguia fixar o olhar naquela coisa.

 - Ah, e ta doendo tanto, compensou dormir com esse careta. O que ele não fez na cama, estou sentindo tudo em dobro – ela mordeu os lábios inferiores, ainda ali, daquela forma, e com aquela barriga horrenda, pude notar a sensualidade expressa na carinha que a maldita lançou para ele. Vagabunda – que delicia – ela terminou enquanto Carlos a abraçava.

 - Entendeu agora, babaca – ele me perguntou, mas eu estava ainda emudecido – não sei por que cargas d’água tinha que ser um santinho para colocar o mestre dentro dela. Malditas maldições e feitiços de reencarnação. Uma cadela e um anjinho para gerar algo pior que o próprio Diabo – foi aí que ele perguntou para ela se estava pronta.

  Senti a noite ranger, a lua foi coberta por uma nuvem tão negra que me lembrei de quando estudava a bíblia, o apocalipse de certo chegara.

  E foi quando ela sorriu.

 - Manda ver gostosão! – disse Susana. Eu estava lá, não precisava ser seguro, era um espantalho assistindo a tudo, um dos últimos vivos daquela cidade.

  Vi ele erguendo as mãos a frente do rosto dela e as unhas de Carlos cresceram de forma incomum. Mas o que era comum aquela altura? Senti um vento gélido tocar internamente minha carne e o vi segurando com a mão esquerda o pescoço de Susana.

  Com a mão direita forçou suas unhas contra a pele dela e começou a abri-la ali mesmo. Ela sorria e gritava, falava palavras de baixo calão e gemia feito uma cadela.

  Pude ver que a mão monstruosa fugia pelas fendas, uma mão em carne viva. Forçando a passagem, mas era muito maior do que a barriga, o astuto demônio parecia vir direto do inferno.

  - Venha mestre! – disse Carlos – tome o lugar que é seu por direito - Ele disse com um tom bajulador.

  E foi nesse momento que ele apareceu. Nem mesmo Carlos e a dezena de vampiros que me rodeavam poderia impedi-lo. Ouvi o barulho do motor vindo logo atrás de mim, e depois de todo aquele tempo eu me movi. Saltei enquanto a Kombi desafiava todos eles, e passava por cima de Susana e Carlos Augusto.

  De certo Tomas era um padre nada ortodoxo, mas o vi freando a mesma antes que o carro se chocasse com a parede do outro lado da rua. O homem santo de quase um metro e oitenta de altura arrancou a batina cheia de sangue. Parecia-me muito com Harrison Ford em Indiana Jones, algo tão imponente e engraçado.

  O homem estava armado até os dentes, atirando com uma pistola, as balas eram de madeira pelo que havia percebido. Imagine o corpo de uma pessoa após o impacto. Pow! A carcaça era jogada para trás e antes que tocasse o chão... Puft... Fogo e por fim, cinzas.

  Ele estava indo muito bem, mas havia algo mais preocupante. Susana estava caída ao chão. Eu tinha certeza que ela iria morrer. Suh não poderia ser tão ruim. Não podia simplesmente acreditar naquilo, ela deveria estar sobre algum tipo de hipnose, algum transe, sei lá.

 Corri até ela enquanto o monstro vampiresco, agora se revelando um ser mais pálido, brotava de seu ser, sua barriga parecia ser a porta de uma funesta sepultura. Pude notar também que sua pele começava a se formar. Vi ela caída no chão. Tremia feito uma louca, enquanto a cabeça da criatura já se revelava a todos.

  Enquanto eu agora estava ao lado de Suh, o pobre padre acabara de ser pego por Carlos. Realmente aquele maldito parecia ser o mais forte deles. O padre olhou para mim, me viu tão próximo do demônio, senti que nada podia parar o surgimento daquela criatura, porém estava mais preocupado com minha amada.

  Acariciei a testa dela e vi que a mesma estava ardendo em uma febre gigantesca. Senti-me em meio as trevas, estávamos enfim todos mortos.

  A criatura tinha a aparência cada vez mais humana, porém seus traços eram malignos, olhos mortos, dentes enormes, orelhas pontiagudas e um nariz que mais parecia uma enorme berruga no meio da face.

 Metade do corpo da criatura saíra para fora, e logo ele estaria por completo entre nós. Senti o coração de Suh batendo, ainda viva. Foi quando olhei para trás e vi Carlos sugando o sangue do Padre Tomas. Ele me encarou, sorriu e lançou o objeto em minha direção.

  A cruz de madeira quicou a minha frente, caiu não mais que dois metros de mim. Apanhei-a, com a certeza que aquele não era meu filho, fechei os olhos e cravei-a em seu coração. O que aconteceu em seguida?

 Nada!

  A surpresa foi tanta que arranquei a estaca, pude ver o buraco se fechando com desdém, como se nada o tivesse atingido. O monstro sorriu para mim e falou com uma voz demoníaca.

 - Obrigado por me trazer de volta, seu verme – e sorriu de maneira sádica.

  Sabia que iria morrer, vi o padre ainda resistindo, Carlos o havia largado no chão, o cretino sorria vitorioso.

  - Bem vindo ao novo mundo! – Ele me disse.

  Nada podia matar aquele monstro, vi Susana sorrindo, e foi aí que percebi que tudo foi uma farsa. O que é pior que um homem traído? Acho que nem mesmo uma bomba relógio. Sorri para os desgraçados, apanhei a cruz, ergui até a altura de meu peito e olhei nos olhos daquela vadia. Eu só precisava fechar aquela maldita porta. Deduzi.

  Ao enfiar a estaca santa no peito de Susana, o vampiro caiu morto, a travessia ainda não estava concluída. Carlos caiu ao chão despedindo-se de suas forças. Não era mais um vampiro.

  Vi Susana dar seu ultimo suspiro e o maldito que saia de dentro dela regressou para as profundezas. Nada mais seria como antes. O padre veio até mim, estava bem, apenas perdera um pouco de sangue. Todo o poder maligno que cercara aquela cidade se fora.

  Caminhei até o maldito que começara tudo aquilo peguei a mesma cruz que havia usado em Susana e o encarei nos olhos.

 - O que foi, Carlos? Agora está com medo? – Perguntei enquanto passava a ponta da estaca próximo ao sexo dele. Acariciando arduamente seus testículos com aquele pedaço de madeira. Talvez nem quando ele fora um vampiro aquilo o causasse tanto medo.

 - Não peraí, calma... Eu – Ele dizia quando o interrompi.

 Sorri para ele e não tive pena nenhuma daquele maldito. Agora eu sabia quem nós éramos. Éramos dois malditos caçadores de vampiros. Então aquela iria ser a ultima vez que ele ouviria minha voz, vampiro ou homem, ele era um bastardo.

 - Sabe Carlos, agora estou vendo seus joelhos tremendo e você mijando nas calças – e o que se seguiu foi um grito de dor inigualável. Não o matei, não de imediato.

Fim! 

Sidney Muniz
Enviado por Sidney Muniz em 18/01/2013
Reeditado em 18/01/2013
Código do texto: T4092058
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.