O vendedor de iogurte

Toda vez que eu ouvia aquele barulho de sinos pequenos me dava uma sensação ruim, um certo medo totalmente sem sentido.

Chegava a me arrepiar. Era incontrlável aquilo. O som parecia vir de muito longe, quase do além mesmo, para depois se materializar como um simples vendedor de iogurte pela rua.

E parecia haver um batalhão deles. Em toda rua, em cada bairro. Era horrível.

Pareciam me perseguir. Nunca cheguei a olhar para o rosto de algum deles.

Nunca consegui fazer isso, comprar o tal iogurte então nem pensar.

Certa noite de verão, não conseguia dormir e me levantei, peguei um refrigerante e sai para fora.

Me sentei em uma cadeira de frente para a rua.

Lá fora o clima estava melhor. Bem mais refrescante.

Não sei quanto tempo se passou, mas o sono não vinha mesmo.

De repente para meu desespero eis que começo a ouvir bem suavemente aquele maldito som dos sinos dos vendedores de iogurte.

Tentei me levantar mas minhas pernas pareciam de chumbo. Eu estava grudado na cadeira.

Um vento forte fechou a porta da sala.

O som vinha aumentando de volume. Meu medo e desespero aumentava junto com ele.

Agora parecia ser vários e não apenas um. E junto ao som dos sininhos comecei a ouvir risadas, garagalhadas que pareciam vir de filmes de terror.

Fiquei ali paralisado e suando frio. Tremia. Tentei gritar mas nenhum som saiu.

As risadas e o som dos sinos se ampliando, estavam se aproximando cada vez mais.

Eu podia senti-los ali bem perto. No quarteirão antes do meu.

O silêncio tomou conta de tudo repentinamente. Até o ventos cessaram. Nenhum som.

Nada. Um silêncio sinistro. Assustador. Mórbido.

Agora só ouvia passos. Passos de apenas uma pessoa.

Continuei a olhar para a rua. Alguém se aproximava.

Um homem magro entrou no meu campo de visão. Me pareceu familiar, mas não o reconheci.

Anda cabisbaixo a passos lentos. Continuei olhando.

Quando estava bem em frente à minha casa, parou e e encarrou.

Levei um susto pois onde deveriam estar os olhos, havia apenas duas bolas brancas.

Ele ficou a me olhar e deu um sorriso feio e dolorido.

Acenou e continuou a andar.

Mecanicamente acenei para ele. Mesmo sem saber o que eu estava fazendo.

Nunca senti tanto medo em minha vida.

Depois que o tal homem passou voltei a ouvir o barulhinho dos sinos, agora se afastando até desaparecer.

Acabei ficando ali mesmo na cadeira até amanhecer. Sem conseguir dormir.

Me levantei, tomei um banho e acabei dormindo no tapete da sala.

Acordei algumas horas depois e me levantei.

Não sabia exatamente se havia sonhado ou se tiverá uma alucinação ou se realmente teria visto aquela cena toda.

Por alguns dias fiquei com aquelas imagens e sons na cabeça.

E por um bom tempo não vi nenhum vendedor de iogurte.

Até que em uma tarde, eu estava sentando em um banco de praça e de repente começo a ouvir aquele maldito som. Era um deles.

Foi se aproximando cada vez mais.

E mais ainda. E cada minuto se aproximando.

Até que quando percebi estava na minha frente.

Era um garoto bem jovem. me olhou e perguntou se eu queria compar iogurte.

Disse que não. Ele se virou e seguiu seu caminho.

Porém quando ele caminhava se afastando de onde eu estava, tive a impressão de que ele foi ficando maior e mais magro. Muito diferente daquele garoto.

A uma certa distância ele parou e se virou para me olhar.

E para meu espanto, era o homem do sonho. Com seus olhos brancos. De cego.

Assustado, me levantei e fui para minha casa.

Ainda hoje tenho medo daquele barulhinho de sinetas.

E até hoje nunca me aproximei deles.

Tenho medo ainda.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 07/01/2013
Reeditado em 14/04/2013
Código do texto: T4072331
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