Sem saída - Parte II - Traçando um novo objetivo

Sem saída

Parte II – Traçando um novo objetivo

Grande foi minha surpresa quando cheguei em casa e vi as luzes apagadas, fiquei ainda mais preocupado, definitivamente havia algo errado, não tinha ideia do que poderia ter acontecido a meus pais... Bom, até tinha... Mas preferi ficar com a segunda opção, na certa ficaram no trabalho, ou na casa de alguém do escritório, decidi ligar mais uma vez, dessa vez daria certo, mas meu celular estava sem sinal... Isso não era raro, mas agora parecia parte da conspiração... Tudo estava dando errado.

-Só faltava essa- pensei... Onde eles poderiam estar, e o que eu deveria fazer? A cidade estava tomada por uma “loucura”, “doença” seja lá o que fosse não me permitia ficar indo de casa em casa perguntando por eles... Me desesperei.

O que eu podia fazer naquela situação... Só consegui pensar em ligar para a Cristina, afinal, eu disse que o faria, e precisava pedir ajuda, ou pelo menos conselho para alguém. O telefone fixo ainda estava normal, e por diversas vezes liguei para ela, para a casa dela, e ninguém atendia, aquilo só podia ser um pesadelo mesmo... Sem meus pais e agora sem saber dela. Eu disse para ela ficar em casa trancada, ela deveria estar no quarto e não ouviu o telefone tocar na sala... Mas por outro lado... E se tivesse acontecido alguma coisa? Se ela tivesse aberto o portão ou pior saído de casa? Nossa, por que ela faria isso... eram tantas suposições e mesmo que houvessem as positivas, as negativas predominavam e resolvi voltar para a casa dela, pois se acontecesse algo a ela eu nunca me perdoaria.

Olhei pela janela e percebi uma movimentação na minha rua... Não se comparava a que eu havia visto na rua do terminal, mas não pude ignorar o medo... Decidi ir por um atalho e não passar por aquela multidão novamente. Respirei fundo, como se buscasse coragem junto com o ar, segurei firmemente a maçaneta, minhas mãos tremiam e suavam, contei até três... depois mais três... abri a porta e corri. No caminho passei por três pessoas... Um rapaz ao chão se debatendo enquanto era dilacerado por duas pessoas, se é que posso chama-las de pessoas, aquela cena me impulsionou a ir mais rápido, corri discretamente, a rua por onde fui era mais tranquila, e não esbarrei com nenhuma multidão enfurecida, mas ainda podia ouvi-los ao longe e ver suas sombras de relance. Chegando a casa da Cristina, esperava abraçá-la e finalmente poder demonstrar meu desespero, mas não foi o que aconteceu... A porta estava aberta... Entrei correndo, desesperado, como ela deixara a porta aberta com essa situação? Fui até o quarto dela, estava vazio, cozinha, sala, tudo vazio... E tudo bagunçado também... Continuei chamando por ela, a esperança ainda estava viva, não consegui controlar as lagrimas, e o medo... Eu a perdera, e por uma idiotice, fui em busca dos meus pais e acabei não encontrando nada, sentei no sofá, senti que a casa girava, minha visão estava estranha, só havia a imagem no centro as bordas estavam pretas, e cada vez mais escureciam, pus as mãos no rosto, abaixei a cabeça e fechei os olhos, algum tempo depois me senti melhor... A raiva era tanta que comecei a me bater, como se isso fosse ajudar... Olhei para a mesinha e vi um porta-retratos, era uma foto nossa, nunca tinha visto essa foto antes, talvez não reparasse. Tirei a mesma, a abracei e enquanto milhões de lagrimas se suicidavam dos meus olhos, a sensação da vista escurecida voltou e em pouco tempo dormi... Ou desmaiei... Tanto faz... Por fim os gritos da noite deram lugar ao silêncio da manhã.

Ao amanhecer, abri meus olhos, e por um segundo imaginei que aquilo tudo era um sonho terrível, vi que estava na casa da Cristina e na certa meu sogro me pegaria lá e haveria uma bela confusão, como da ultima vez, mas olhei em volta e percebi que aquilo tudo era bem real, e eu estava ali sozinho naquela casa, olhando para um lugar vazio, com os pensamentos perdidos, e apesar de tudo que eu havia visto noite passada, só conseguia pensar em uma coisa, na minha família.

Me levantei do sofá, com passos lentos e cambaleantes, fui até a janela, meus olhos procuravam por alguma coisa, e acabaram encontrando um homem que vagava, aquilo não era um pesadelo, aquele homem estava cheio de sangue, e não parecia respirar... Ele estava morto, e andava... Por algum tempo senti tristeza em ver aquilo, e muito medo... Tentei classificar aquela sensação e só consegui classificar ele, o homem morto... Ele não tinha mais identidade, nem problemas, nem o casamento, nem as contas, nada mais o perturbava ele só vagava... Talvez devesse chamá-los de abaporu, um termo bem nacional para especificar um antropófago, um homem que come gente... Eu tinha que encontrar minha família... Eu não podia deixá-los ficarem assim, ou serem os próximos do menu, não havia tanta diferença... Eu não poderia viver com isso.

Ninguém viria oferecer ajuda, não sabia se existia alguém ainda para me ajudar, pelo silêncio das ruas supunha que as coisas estavam bem piores do que eu podia imagina, decidi agir... Peguei minha mochila, que na pressa de sair na noite anterior acabei deixando na casa da Cristina, procurei na geladeira água e comida na dispensa... Eu não sabia quando iria voltar ou se encontraria algo para comer no caminho. Coloquei duas garrafas d’água, dois biscoitos e duas latas de sardinha, o que havia de mais leve e durável, tomei coragem e saí, na frente da casa peguei um pedaço de pau, precisava de algo para me defender daquelas coisas, um pouco mais á frente da casa, havia um homem, talvez aquele mesmo, veio em minha direção para me atacar, e não tive coragem de matá-lo, apenas me esquivei e corri... Aquela rua estava tranquila, porem mais a frente ouvi seus grunhidos, eram muitos e em cada rua para onde eu ia ouvia mais alto, deviam estar comendo algo e estavam distraídos... Naquele dia encontrei umas pessoas que estavam alojadas em uma casa perto de um mercadinho, eles me ajudaram muito. Decidi que ficaria com eles até ter condições de sair... Se eu não tinha coragem de matá-los ia ser eu ao invés deles e isso não podia acontecer... Me ensinaram que eu devia bater na cabeça deles, e passei um bom tempo ouvindo seus planos de sair da cidade... Passaram-se então três semanas...

Sinclair
Enviado por Sinclair em 02/01/2013
Reeditado em 17/06/2013
Código do texto: T4064000
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