Sem saída - Parte I - O alarme inicial

Sem saída

Parte I – O alarme inicial

Durante toda a semana ouvimos noticias estranhas na TV, nos rádios, na internet haviam diversos relatos, os vídeos na internet eram tão surreais que ninguém acreditava que poderia ser verdade, todos falavam sobre um surto, uma epidemia, doença, não sei... Chamavam como queriam, mas ninguém conseguia explicar, as pessoas não paravam de comentar, na vizinhança era o assunto do momento, não parecia mais uma fofoca, pois todos estavam assustados, apavorados o bastante para, quem sabe aumentar, mas não inventar. Não forneceram explicações, e olha que nos esperamos por elas, quem sabe o governo se pronunciasse, mas não... Nada. Enquanto acompanhávamos tudo pela internet e jornais, mais pela internet é claro, não sabíamos até onde podíamos acreditar pois nada havia acontecido aqui, não havia nos atingido, era sempre um relato de uma cidade vizinha ou em um lugar afastado o suficiente para causar um pânico maior ainda, pelo desconhecido.

Mas naquele dia tudo mudou aquilo tudo chegou até nós, e foi tão rápido. Eu estava na escola, era um dia normal, bom, normal até demais, aulas tediosas, e assuntos incompreensíveis, o que me consolava era que era sexta feira. Eu não era um dos alunos mais esforçados, nem o mais inteligente, mas naquele dia parece que estava ainda pior, no quadro não haviam letras e sim hieróglifos, enquanto a maioria acenava positivamente com a cabeça quando o professor perguntava se haviam entendido, eu olhava para fora, a janela estava mais interessante, era aula de matemática, tudo ali era estranho para mim, funções, figuras geométricas, multiplicação da divisão do quadrado da hipotenusa de um ponto reto que dava a curva em lugar nenhum, era isso que eu via. Tamanha foi minha alegria quando a professora foi chamada, o inspetor com cara de azedo cochichou no ouvido dela, ela pôs a mão na boca, e olhou para o chão, pediu licença para a turma e saiu... Algo não estava bem... Todos nos entreolhamos confusos, ela não conseguiu disfarçar a preocupação...

Sai da sala, fui até a porta e olhei para as outras salas, todas estavam iguais a nossa, cheias de alunos na porta e nenhum professor pra domar aquelas feras, não! Não era um dia normal onde muitos professores haviam faltado, todos os professores tinham sido chamados... Fui na sala ao lado, e conversei por alguns instantes com um amigo meu, e o convenci a ir até a diretoria tentar descobrir o que estava acontecendo...

- Arthur: E ai cara?

- Iago: chamaram na sua sala também?

- Arthur: parece que foi em todas as salas! Disseram alguma coisa aqui?

- Iago: não! Ta todo mundo preocupado, o professor saiu um pouco assustado!

- Arthur: (surpreso) da minha sala também! Vamos lá em baixo? Tentar saber o que ta acontecendo?!

- Iago: vamos!

Descemos as escadas correndo, mas, outros mil alunos tiveram a mesma ideias e logo fomos barrados, nos disseram para voltar para as salas que logo tudo seria resolvido, não nos contentamos, mas não podíamos fazer nada, voltamos para a sala com a mesma duvida. Entrei na minha sala, me sentei e meu amigo Renan sentou ao meu lado, conversamos por um tempo, para tentar distrair, mas não adiantou... Algum tempo depois o alarme tocou, aquele geralmente era o sinal do intervalo, mas não era hora ainda, e o alarme tocou um pouco mais rápido que o normal, todos entraram nas salas e os professores voltaram... A nossa professora, entrou na sala, e passou alguns segundos na porta, fechou a mesma e se virou para a turma que a observava impacientemente, até que alguém ao fundo perguntou o que estava acontecendo...

- Aluno (a) 1: o que aconteceu professora?

- Professora: (sem jeito e ainda mais assustada, coçando a cabeça) bom... Não haverá mais aula hoje, o diretor pediu que nos liberássemos vocês...

- Aluno (a) 2: ta mas porque isso?

- Professora: não souberam informar muito bem, mas... está acontecendo uma coisa estranha na cidade, todos devem ter ouvido as noticias...

- Aluno (a) 3: aquilo é verdade? Está acontecendo aqui? (apavorado (a))

- Professora: não... se acalmem! É só uma precaução, já estão investigando isso e só querem que todos estejam em casa, em segurança, para que não hajam acidentes, pessoas sendo confundidas... Por isso vocês devem ir para casa! Não precisa se preocupar, é só para segurança de todos!

Depois daquele discurso memorável e patético, fomos liberados, que tipo de informação era aquela?... Ninguém acreditou naquilo de “está tudo bem, vão para casa é para segurança de vocês”... Se estava tudo bem, porque deveríamos ir para casa “por segurança”? Aquilo estava muito mal explicado.

Antes de sair, comentei com meu amigo sobre aquilo, apesar de toda aquela confusão, estávamos até gostando de sair mais cedo, que besteira, comemorar por não ter aula...

- Arthur: nossa cara... Que coisa mais estranha!

- Renan: é verdade, nunca vi a professora daquele jeito... (risos) ela tentando nos tranquilizar foi a coisa mais engraçada que já vi!

- Arthur: (risos) é verdade! Mas o pessoal tava bem aflito...

- Renan: eu sei...

- Arthur: será que foi algo muito serio? Eles não diriam, mas... (tentando amenizar) para liberarem agente da aula de matemática só um milagre mesmo (risos)

- Renan: é verdade... Bom eu vou aproveitar essa folga... Ir pra casa coisa nenhuma (risos)

- Arthur: eu também não vou pra casa... Ta cedo demais... Ficar sozinho sem nada para fazer não cola! Vou dar uma passada na casa da Cristina! Ver como ela ta... Ela tava tão assustada com isso ontem...

- Renan: é a Geovana também... Na verdade no fundo mesmo que não ta né Arthur?

- Arthur: (respirando fundo) é... Bom, vou indo...

- Renan: tchau!

Me despedi do Renan, e fui caminhando em direção ao portão da escola, ouvi uma garota chorando ao telefone, - que besteira- pensei... lá fora estava tudo muito agitado, como se todas as pessoas estivessem na rua... De que adiantava mandar os alunos para casa se todas as outras pessoas estavam na rua? Os ônibus estavam cheios, o transito estava como costumava ser durante a noite, aquilo era realmente incomum às dez horas da manhã, não me importei, continuei caminhando, eu não ia pegar ônibus mesmo... Estava longe da casa da Cristina, mas não me importava de andar, nunca me importei, no caminho havia um hospital publico, e estava cheio, não entrei, mas pelo que vi na porta do mesmo dava para ter uma ideia... Pensei que os assassinos, ladrões, bandidos no geral tinham se superado hoje, andei mais rápido... Ao chegar na casa da Cristina, não precisei bater muito, ela logo veio me receber, estava um tanto aflita...

(No portão)

- Cristina: o que você ta fazendo aqui essa hora? Por que não está na escola?

- Arthur: eles dispensaram agente... por causa daquelas noticias...

- Cristina: eles disseram isso?

- Arthur: bom, mais ou menos... Disseram que não era nada de mais... Era só por precaução!

- Cristina: precaução... Sei... Estou ouvindo isso o dia inteiro... Não consigo para de pensar nisso!

(na sala)

- Cristina: Arthur, eu to com medo! Muito medo!

- Arthur: não vai acontecer nada amor! Isso são só coincidências você sabe que os jornais aumentam tudo, logo vamos ver que não é tão grave quanto parece!

- Cristina: (angustiada) Coincidência? Eles terem te liberado só confirma isso!

- Arthur: (tentando transmitir calma) não confirma nada... Só mostra que eles querem ter certeza de que esta tudo bem e precisam que as pessoas fiquem em suas casas!

- Cristina: (angustiada) Arthur... Aquelas pessoas estavam... Você viu os vídeos na internet... Estavam atacando umas as outras, você viu!

- Arthur: é eu vi, mas... Sabe por que só vimos na internet não nos jornais? Porque não é verda... (é interrompido)

- Cristina: (quase chorando) e nenhum medico conseguiu dizer o que era aquilo...

- Arthur: Eu sei... Mas calma amor! Não vai acontecer nada aqui! É serio pensa comigo... Disseram que aconteceu aqui do lado... Se fosse pra acontecer aqui já teria acontecido!

- Cristina: e se estiver acontecendo agora?

- Arthur: não está... É apenas precaução!

- Cristina: (fingindo estar mais calma) é... Você pode ter razão;

Tentei acalmá-la, mas sei no fundo que não consegui... Ela estava assustada demais para uma conversa de minutos mudar a sua opinião, deitamos no sofá, e desligamos a TV, já era mais do que na hora de fazer isso. Enquanto ela acariciava meu cabelo, fui esquecendo aquela loucura e em pouco tempo dormi...

Acordei às 15h24min e tentei ligar para os meus pais, para ver como eles reagiram as noticias, mas eles não atenderam, imaginei que estavam ocupados, e decidi ligar mais tarde, voltei a dormir... Acordei de novo horas depois, foi como se eu não dormisse há dias... Não era normal uma pessoa que não fez nada estar tão cansada... Talvez eu estivesse bem, mas minha mente estivesse exausta...

- Arthur: (se levantando bruscamente) amor? Que horas são?

- Cristina: (se assustou com a reação, mas acordou e olhou no celular) são... 19h30min

- Arthur: me da aqui o celular, que eu vou ligar de novo pros meus pais... Não é possível que ninguém atenda no trabalho deles...

Me levantei, e enquanto discava os números caminhava pela sala, os olhos da Cristina me acompanhavam, eu estava muito preocupado, tanto que não consegui mais disfarçar para mantê-la calma...

- Arthur: (nervoso) nem no trabalho, nem nos celulares... Isso não é bom! Eu tenho que ir pra casa amor!

- Cristina: (assustada) e você vai me deixar aqui sozinha?

- Arthur: Cris, eu tenho que ir, eles devem ter ouvido as noticias e terem saído mais cedo do trabalho e tem que estar em casa! Seus pais vão chegar logo e eu tenho que saber como estão os meus! Você vai ficar bem!

- Cristina: (assustada) eles já deviam ter chegado também... E se acontecer alguma coisa? E eles não estiverem aqui?!

- Arthur: amor tranca o portão e fica no seu quarto.. Logo eles vão chegar! E mesmo assim logo vão explicar algo nos jornais, você vai ver que não tem nada a ver! Mas eu tenho que ir... To falando serio... To preocupado com eles!

- Cristina: me fala que está tudo bem e diz que está preocupado... Que belo paradoxo, hein...

- Arthur: (sem entender) belo o que? Bom, eu tenho que ir...

Não tinha entendido o que ela quis dizer com “paradoxo”, mas não consegui pensar em mais nada... fui ate a porta e quando tentei abrir ela segurou meu braço com força, tentou me impedir, me abraçou, mas não adiantou, eu precisava falar com meus pais... Só assim saberia que n]ao passava de uma coincidência, no fundo esse pensamento parecia bem idiota.

- Arthur: tchau amor... quando eu chegar em casa eu te ligo, ta bom? Ei... Eu te amo!

- Cristina: (assustada e chateada) se me amasse mesmo ficava aqui comigo! Mas isso não vai te fazer ficar então vai... Toma cuidado!

- Arthur: você também!

Eu a abracei de forma intensa, ela não queria me deixar ir... Pude sentir isso no abraço, na força que ela depositou nele... Ela continuou no portão me olhando enquanto eu saia correndo pela rua... Fui pelo primeiro caminho que veio a minha cabeça, realmente não foi a melhor escolha, a rua estava cheia de pessoas, algumas com mochilas e andando de um lado para o outro, tudo bem que ali perto havia um terminal, mas o que elas estavam fazendo ali era um mistério... Parei e tentei falar com um rapaz...

- Arthur: ei... O que ta acontecendo?

Rapaz: (apavorado) eles chegaram nas ruas... não eram muitos... nos fugimos...

- Arthur: quem? Quem chegou nas ruas?

- Rapaz: eles... fomos pra rodoviária tentar pegar um ônibus pra longe mas, não tinha mais ônibus...

- Arthur: por que vocês estão todos aqui?

- Rapaz: os policiais disseram para sairmos de lá... Por causa do tumulto... eles fecharam o outro caminho... Estamos esperando mais ônibus...

O rapaz saiu correndo, seu olhar estava fixo no outro lado da rua, ainda tentei chama-lo de volta, mas ele nem me ouviu... Fiquei no meio daquela multidão sem entender... foi quando eu vi... Olhei para a direção que ele olhava e uma mulher estava sendo... Como posso dizer? Devorada, é essa é a palavra certa, um homem estava mordendo ela... Aquilo me deixou sem reação... era como nos vídeos, exatamente... Naquele momento percebi que nada do que ouvidos nos últimos dias era brincadeira, quando a multidão viu aquilo também... Muitas pessoas começaram a empurrar o portão da rodoviária, para buscar refugio, a rua estava escura e aquela parecia a melhor saída... Eu percebi que não poderia ficar nem mais um segundo naquele lugar, então me esquivando das pessoas, corri como nunca...

As outras ruas menores estavam mais calmas, mas eu ainda conseguia ouvir gritos, que vinham de cantos escuros, corri cada vez mais rápido, não estava interessado em descobrir o motivo dos gritos... Algum tempo depois cheguei em casa...

Sinclair
Enviado por Sinclair em 02/01/2013
Reeditado em 17/06/2013
Código do texto: T4063348
Classificação de conteúdo: seguro
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