O Psicopata - A Festa de Santa Bárbara

Era festa de Santa Bárbara. A cidade estava de vermelho e branco. O mercado de Santa Bárbara estava repleto de pessoas, onde o vermelho nas vestes imperava. Longe dali, na Cruz do Pascoal, numa barraca da festa uma música dizia:

" Ei ei, ei, ei menina dos cabelos longos quero te levar para longe no primeiro bonde a gente pode partir..."

E seguia a música dizendo:

"É comer ,domir,é comer, beber domir, é comer, beber, dormir e não pagar..."

Uma música de um grande, excepcional sambista, Agepê, cujo barraqueiro tratava de resgatar naquele momento. O pelourinho estava repleto de pessoas bêbadas e em busca de diversão e devoção à santa. O caruru rolava no Mercado de Santa Bárbara regado a muita cerveja para os devotos. Um palco foi montado, onde sambistas se dividiam no palco, no Pelourinho. Magali preferiu estar mais distante na barraca Santa Bárbara, na rua direta do Santo Antônio, onde o proprietário era fã de Agepê. Dizia mais uma música:

" Deixe eu te amar...Quero te pegar no colo, te deitar no solo te fazer mulher...Deixe eu te amar, faz de conta que sou primeiro, na beleza desse olhar, eu quero estar o tempo inteiro..."

Magali dançava.

" Na beleza desse seu olhar eu quero estar o tempo inteiro.."

Uma figura a observa. Magali era linda, linda de morrer. Um shortinho branco tentava cobrir as suas formas tão sedutoras. Coxas grossas, longelíneas, um bumbum farto. A cinturinha de violão encaixando num quadril largo. Os seios medianos, durinhos. Balançavam com o seu gingado.Para cima e para baixo. Uma delícia.

" Não me molhe assim, esse fogo não pode apagar..."

Seguia Agepê homenageando o amor, as mulheres, as paixões.

" Não me molhe assim, esse fogo não pode apagar..."

O som da música se confundia com o zum-zum-zum das vozes masculinas e femininas. A devoção á santa era esplêndida. O largo do Pelourinho estava uma verdadeira festa de Baco. Gente, de todos os tipos, classes sociais. Os turistas estavam presentes com suas máquinas filmadoras, celulares de última geração. Vários jornais retratavam o momento sublime daquele momento de festa. Aqui é verão, iniciavam-se às festas populares. As festas de largo. Devoção,bebedeira,sexo e drogas num desfile complexo,pargmático. Na Bahia temos o profano e o religioso andando lado a lado.

Magali era sedutora, bela ao extremo. Era conhecida por ser a vendedora de pastéis mais gostosos da área do Pelô,Comércio, Praça da Sé, Praça Castro Alves.

Tinha um fã secreto, e não o sabia. Pouco se conhecia ao seu respeito. Era bela morena - "uma delícia de morena da Bahia", diria Leônidas Grego em seus escritos - escrito marginal,destestado pelo puritanos de plantão. Era comum vê´lo tomando uma cerveja na Cruz do Pascoal, num fim de tarde, após um dia estafante.

Apesar do calor infernal que fazia, o estranho que a observava dançando ao som do grande mestre Agepê, trajava um chapéu de aba larga e uma blusa grande,folgada. Uma calça vermelha.

Os policiais estavam de plantão, os da equipe responsáveis pela mais importante investigação da polícia civil do momento. Dr. Edgar tinha,talvez, aumentando o número de cabelos brancos na sua cabeça. E, talvez muitas noites de insônia.

-Eu acho que é um dia propício para que ele ataque.

Dizia um dos policiais. Enquanto comia um cachorro-quente regado a uma cerveja em lata. O delegado o olhava com reprovação.

- E, se vai atacar, com certeza será na área da festa ou nas proximidades. E, você poderá estar bêbado,sem poder agir.

Foram levantados alguns suspeitos.

- Creio que as vítimas foram em maior número na área do comércio devido a grande concentração de mulheres bonitas nas muitas empresas de telemarketing,e nas faculdades por ali, existentes.

- Principalmente, na empresa onde a pobre mulher da limpeza pereceu.

-Isso.

Encerrada a reunião, o delegado mandou que todos estivessem á postos e saissem da Deltur no horário combinado e ganhassem às ruas à paisana. Sem usarem os coletes de identificação. Deveriam monitorar todas as ruas do Pelourinho, Santo Antônio, e adjacências. Uma tarefa nada fácil, devido á extensão da localidade. A movimentação de pessoas da cidade era extensa, e de turistas.

A cidade estava de vermelho, o de Santa Bárbara - talvez, outro vermelho estivesse a surgir naquela noite.

Uma turista ja estava travada. Desgarrou-se dos amigos, e como não conhecia bem o lugar e estava distante do hotel onde era hóspede. Pediu mais uma cerveja, sentando á mesa de um dos bares da rua direta do Santo Antônio. Sorveu-a no gargalo. Saindo do bar trombou com Magali. Desculparam-se, mutuamente. Trocaram alguns palavras em inglês. Disse a bela turista:

- Excuse-me.

-Ok,I´m sorry.

- Speak English?

- No very well.

Respondeu Magali.

Longe dali, um dos policiais recebeu um telefonema.

- Alô...

- Diego, alerta. Sondei boa parte da festa. Acho que encontrei um fio condutor para a ação dele hoje, caso esteja na festa.

- Por que acha isso?

- Estou de olho numa das mulheres mais lindas que se encontra por aqui.

O telefone celular foi desligado. Combinaram o posicionamento à volta de onde se encontrava a beldade - que, porventura, seria a próxima vítima.

Os bares estavam cheios. A noite estava chegando. E, quando a noite vem, as ruas do Pelourinho, Santo Antônio se tornam mais perigosas. A turista estava de bobeira, trôpega. Ria sem motivo. Tentava acender um cigarro de canela. O isqueiro não a obedecia.

- Isqueiro?

Perguntou o estranho aproximando-se.

Ela deu uma risadinha, e lhe estendeu o rosto com o cigarro entre os lábios.

Ele acendeu o seu cigarro. Não ficaram muito tempo juntos. Ela se dirigia para as ruas escuras, parecia perdida. Não sabia do perigo que corria. Salvador está tomada de assalto pelos sacizeiros. Distribuem-se pelos bairros do centro comercial, principalmente, nas praças, e onde circulam os turistas.

Ela seguia pelas ruas escuras. Em dado momento, parou á frente de uma porta e chamou alguém. Quem a atendeu parecia inseguro. Estendeu o braço e lhe entregou um algo com a mão fechada. Ela tirou da bolsinha algumas cédulas de pequena monta. Pagou. Seguiu por uma rua, sentou-se na calçada. Fez o cigarro de maconha. Sacou do isqueiro. Tentava, tentava acendê-lo, sem sucesso.

- Fuck you...

- Isqueiro?

Disse ele saindo da penumbra. O braço estendido. Acendeu. Ela deu uma, duas tragadas. Parecia sentir enorme prazer naquilo. Ele olhou o seu estilo de ser. Um vestido florido, um par de sandálias de couro.

- Não sente medo? Poderia lhe fazer algo de mal. Roubar, matar, estuprar e...matar. Entende-me?

- Sim, falo um pouco das duas linguas. Venho muito ao Brasil. Nasci e cresci no Bronx, entre cafetões e prostitutas, traficantes. O Brasil é um pais de devassidão. Gosto daqui. estava cansada do modo de vida de minha família. Adorei todos os prazeres por aqui encontrados.

- Cigarros de maconha?

- E cigarrilhas de menta.

Ela respondeu-lhe, com um olhar lânguido. Não parecia amedrontada.

- Tenho um grande protetor.

- É? Quem? Ele pode te proteger agora de mim?

- Sim.

A lua e um gato que caçava pombos no telhado foram as testemunhas do que se seguiu:

Não soltou um grito, pois a garganta estava aberta num corte preciso, inundando-se de sangue. Se quer percebeu o fio da lâmina riscando a sua pele e músculos. Sentiu um beliscão rápido.

Os golpes foram vigorosos, sucessivos. O sangue jorrava de forma abundante. O primeiro golpe foi no pescoço - um corte preciso atingiu a jugular. A garganta foi aberta em mais de vinte centímetros. Depois outros golpes no rosto e na cabeça. Os olhos foram cortados.

- Infiel, infiel, infiel...

Gritava, enquanto golpeava. O corpo caiu inerte no piso de pedra. Ajoelhou-se e depois deu mais golpes. Respingos de sangue lhe banhavam o rosto.

Gritava:

- Infiel, cão infiel, infiel, cão infiel...

Gritava e golpeava.

Não foi surpresa, perceber as pessoas que surgiam da escuridão vindo na sua direção. Sabia que teria sucesso na sua fuga. Conhecia as ruas, os becos. Planejou com detalhes a sua rota de fuga, caso um dia precisasse,e aconteceu. Os disparos efetados não obtiveram o devido sucesso. Pipocavam nas paredes dos becos. A escuridão lhe era favorável.

- Porra, porra. O que aconteceu?

- Perdemos um colega.

Confabulavam de forma nervosa os policiais.

O corpo do policial estava esvaindo-se em sangue. A sua garganta parecia uma torneira aberta. O vermelho da festa de Santa Bárbara estava selada com o sangue de um inocente, mais um. O isqueiro dourado estava numa das mãos, sujo de sangue. Tinha uma latinha de cerveja próximo. Foi o seu último gole, o último cachorro-quente.

- O que vamos dizer para o delegado?

- E para a imprensa?

- Meu Deus perdemos um colega e estão preocupados com a imprensa e o delegado...Porra.

-Um psicopata é frio, inteligente. Desprovido de sentimentos. Raramente dá pistas do que é capaz - so as pessoas mais observadoras conseguem identificá-los na multidão. Existem um sem números deles na sociedade, cada qual com a sua particularidade. Alguns jamais cometerão um crime de morte, apesar de poder causar danos outros,como financeiros ou psicológicos às suas vítimas. Outros são motivados por uma válvula psicológica tal que os guia para uma matança sem sentido, porém, programada.

Observou a policial.

- Sabia que estava sendo seguida?

- Sim. fez o jogo programado pela sua mente doente, fingiu e matou. esta morte foi um deboche. Brincou conosco. Ela estava muito segura de si.

- Será que vamos ficar nessa? Tomando baratino desse assassino?

Observou um dos policiais.

- Não. Eu a pegarei, prometo, em nome do colega Diego e de todas as mulheres que ela matou.

Disse Larissa, a policial.

- Veja o que encontrei num beco.

exibia o policial um chapéu de aba longa, uma blusa folgada e uma calça vermelha.

- Por que não ligou para gente, ja que estava no encalço dela?

- A filha da puta roubou o meu celular quando tombou comigo na saída do bar. Acho que se escondia por baixo desta roupa, o tempo todo fingindo ser um homem - o nosso assassino deve ter um motivo justo para tal. Preciso ver isso.

Disse Larissa, enquanto chegava o delegado num dos carros da polícia e uma ambulância - não havia mais o que fazer. O policial estava morto, sem sangue. Morrera afogado no próprio sangue no fim da festa de Santa Bárbara - uma noite vermelha, noite policial,no tom da festa.

magali, alheia ao ocorrido,dançava mais uma música na barraca Santa Bárbara.Dizia a letra:

" Moro, onde não mora ninguém, é la onde moro, que eu me sinto bem..."

( Continua)

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 16/12/2012
Reeditado em 04/11/2016
Código do texto: T4038897
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